- Valor Econômico
Queda da participação da indústria no PIB é uma explicação
Aqueles que acreditam que o ajuste fiscal pode ser obtido apenas com a retomada do crescimento econômico em ritmo mais acelerado, o que resultaria em maior arrecadação, devem ler um recente estudo elaborado pela Instituição Fiscal Independente (IFI). A principal conclusão da IFI é que a receita tributária está respondendo com menos força à expansão da atividade econômica.
Até 2008, quando o Produto Interno Bruto (PIB) crescia 1%, a receita tributária recorrente (aquela mais diretamente ligada à atividade econômica) apresentava uma expansão superior a 1%. Ou seja, o ritmo de crescimento da arrecadação era superior ao da economia. Quando o PIB caía, acontecia a mesma coisa: o ritmo de queda da receita era maior.
A partir de 2004, os resultados obtidos pelo estudo da IFI, de autoria dos economistas Gabriel Leal de Barros e Alessandro Ribeiro de Carvalho Casalecchi, apontam para uma tendência de diminuição da resposta da receita ao crescimento econômico. Na linguagem dos economistas, ocorreu uma tendência de queda da elasticidade da receita em relação ao PIB. A conclusão do estudo é que a elasticidade agora está abaixo de 1. Ou seja, para cada 1% de crescimento do PIB, a receita tributária recorrente aumenta menos de 1%.
O que provocou uma mudança tão significativa, que coloca novos desafios ao processo de ajuste fiscal? Os economistas da IFI apontam três explicações. A primeira é que, nos últimos anos, ocorreram alterações estruturais na composição do crescimento do país, com a indústria, que é relativamente mais tributada que os serviços, perdendo participação no PIB.
Outra explicação é que o governo promoveu forte desoneração tributária. "O governo abdicou de uma montanha de receitas e isso golpeou a dinâmica da arrecadação", observou Felipe Salto, diretor-executivo da IFI, em conversa com o Valor.
Uma terceira explicação para o viés de baixa da sensibilidade da receita/PIB foram os cinco Refis concedidos a partir de 2009. As condições vantajosas dos parcelamentos das dívidas tributárias, no âmbito dos Refis, podem ter estimulado empresários a reduzir os pagamentos de tributos.
No estudo, os dois economistas procuraram estimar a magnitude da sensibilidade das receitas ao crescimento econômico. O objetivo foi chegar a um coeficiente que expressasse o efeito que uma alteração no PIB pode provocar no volume das receitas do governo.
O primeiro passo dos economistas para estimar a elasticidade foi retirar do cálculo todos os fatores temporários ou extraordinários que impactam a arrecadação, mas que são alheios à trajetória do PIB. Não foi considerada a arrecadação obtida pelo Tesouro com concessões, dividendos de empresas estatais, royalties de petróleo e outras, que não resultam da tributação. E, por fim, foram retiradas do cálculo as chamadas receitas atípicas, ou seja, aquelas decorrentes do Refis, da "repatriação de capitais" (o RERCT), os depósitos judiciais e a receita do PIS/Cofins sobre combustíveis, que sofreram continuadas alterações de alíquotas nos últimos anos, entre outras.
Em resumo, o estudo excluiu as receitas com baixa ou nenhuma associação com a atividade econômica (receitas não recorrentes ou atípicas). O objetivo foi calcular o volume da receita recorrente, livre de fatores extraordinários e temporários. A partir daí, estimar de maneira mais pura a sensibilidade da arrecadação à atividade econômica.
Os economistas mostraram que houve um importante crescimento da participação relativa das receitas não recorrentes nos últimos dez anos. Enquanto o volume de receitas atípicas foi equivalente a apenas 1,8% da receita recorrente em 2007 (R$ 7,2 bilhões), em 2017 o impacto atingiu 8,7% (R$ 66,6 bilhões.
No tocante às receitas previdenciárias, a dinâmica foi semelhante, de acordo com o estudo. O volume de atípicas subiu de apenas 0,4% da arrecadação recorrente (R$ 0,7 bilhão) em 2009 para 9,2% (R$ 29,7 bilhões) em 2015. Os dados mostram que o governo ficou dependente, cada vez mais, de receitas atípicas para fechar suas contas, no momento em que a elasticidade da receita tributária recorrente em relação ao PIB estava em queda.
As estimativas para a elasticidade da receita calculadas pelo estudo são informações sobre o passado, advertiu o economista Alessandro Casalecchi, em conversa com o Valor. "Não se pode assegurar que a mesma elasticidade será mantida daqui para frente", explicou. "Mas os dados sugerem que é possível que ela continue baixa", acrescentou.
Como a redução da elasticidade da receita/PIB resultou, em grande medida, de mudanças estruturais na composição do crescimento, o economista Gabriel Leal de Barros considera que a elasticidade baixa deverá permanecer no médio prazo, pois não será possível alterar rapidamente essa realidade. Para os autores do estudo, a redução da elasticidade torna um pouco mais difícil o ajuste fiscal que o setor público brasileiro tanto necessita.
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