- O Estado de S.Paulo
Eleitor de comportamento menos previsível deverá decidir eleição tão apertada
A verdadeira largada para o primeiro turno das eleições começa com o que não se realizou. O derretimento da candidatura de Jair Bolsonaro não ocorreu, o fracasso da candidatura de Geraldo Alckmin não se registrou, a tão falada unidade de esquerda não surgiu e a tão aguardada candidatura mágica de algum completo outsider não se materializou.
De certa maneira, o que era bastante óbvio se cumpriu: sendo as máquinas partidárias o feudo de caciques, sendo caciques o que são (caciques, ora), o entendimento entre os principais deles deu-se exclusivamente pelas vantagens percebidas no uso de instrumentos tradicionais da política no curtíssimo prazo (eleição) com um olho na capacidade de barganha dentro do Legislativo no horizonte de 2019.
Porém, é possível identificar com razoável nitidez uma divisão entre as principais forças ao longo de postulados “ideológicos” (pelo menos para os padrões brasileiros de maçaroca ideológica). Há um campo que, grosso modo, me parece majoritariamente “conservador” em termos de valores e liberal em termos de postulados econômicos, disputado por várias candidaturas “de fora” (como Bolsonaro) assim como “do sistema” (como Alckmin, Alvaro Dias e Meirelles) e também por vários movimentos “de base” que pretendem renovar a política brasileira por meio da longa marcha da formação de partidos modernos (Amoêdo).
Do lado da “esquerda”, a tática do PT turvou consideravelmente qualquer tipo de unidade à espera de que o inelegível Lula coloque um poste no segundo turno – uma aposta de alto risco e contra o tempo.
Os dois principais contendores que se vendem como “de fora”, Marina Silva e Jair Bolsonaro, apresentam-se coesos em termos de chapas (um vice do Partido Verde ao lado de Marina, um general que há pouco ainda vestia farda ao lado de Bolsonaro) e excepcionalmente confiantes na capacidade de modernas tecnologias digitais romperem também o que foi até agora o primado dos instrumentos tradicionais de campanha eleitoral (sobretudo tempo de TV).
Essa aparência de “homogeneidade” na composição da chapa será suficiente para colocar qualquer um dos dois – especialmente Bolsonaro, que no momento parece ganhar estatura quanto mais é atacado em entrevistas – num segundo turno? Os vendedores de facilidades em campanhas eleitorais, os partidos do Centrão, acomodaram-se com Alckmin. Conduziram-se não apenas visando a recompensas num futuro governo mas, também, por considerarem Bolsonaro um risco muito alto.
Nessa “largada” são mais evidentes que em eleições recentes o empenho em conquistar o voto feminino e a clara determinação em disputar com Bolsonaro o voto do “agro”. A expressão confunde quando usada como sinônimo de representações ou entidades de classe de um setor da economia, mas faz todo sentido ao se considerar as imensas áreas de prosperidade relativa que abarcam importantes cidades médias com um contingente de eleitores que se consideram “órfãos” da política tradicional, além de vítimas de insegurança pública e jurídica.
Os profissionais da leitura de pesquisas – todas elas coincidindo em apontar ainda imenso número de indecisos e desanimados – nos dão um grave alerta. Não importa o que esta eleição possa demonstrar sobre o choque entre desejo de mudança versus predomínio da “velha” política – além da inédita presença de itens como corrupção e honestidade no topo da prioridade dos eleitores –, a decisão numa eleição tão apertada acabará a cargo da parcela de comportamento menos previsível entre aqueles que vão às urnas: os eleitores que formam opinião na derradeira hora. Especialmente mulheres, pobres e de meia-idade.
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