quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Teto expiatório: Editorial | Folha de S. Paulo

Ataca-se o limite fixado para o gasto federal como se fosse ele a principal ameaça

Da comunidade científica e acadêmica partem ataques furiosos ao tetofixado há dois anos para as despesas federais, diante dos temores de um corte no pagamento de bolsas de estudos em 2019.

Estudo recém-publicado pela Fundação Getulio Vargas estima que o limite imposto ao gasto tende a sufocar a administração pública já no próximo ano, tornando-se insustentável ao longo do próximo mandato presidencial.

Nesta quarta-feira (8), em debate entre assessores econômicos de candidatos ao Planalto, o único a defender o mecanismo foi o representante de Henrique Meirelles (MDB), ex-ministro da Fazenda.

Na mesma ocasião, auxiliares de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT), Alvaro Dias (Pode) e Guilherme Boulos (PSOL) declararam sua oposição à regra.

Convém não tomar ao pé da letra o que parece um quase consenso político, com respaldo técnico, contra o teto. Este apenas desempenha no momento o papel de bode expiatório —como se fosse ele, e não o enorme desajuste do Orçamento, a ameaça a pairar sobre o futuro dos programas de Estado.

O real limite para a expansão das despesas não é o inscrito na Constituição em 2016. Antes disso, já se esgotava a capacidade de recorrer a mais carga tributária ou endividamento para financiar o aumento contínuo dos desembolsos.

O Tesouro Nacional hoje não arrecada o suficiente para os compromissos cotidianos e as obras públicas —e nem se fala aqui dos encargos com juros devidos aos credores. Assim, uma hipotética ampliação dos gastos, com abandono ou flexibilização do teto, teria de ser bancada com alta brutal de impostos ou dinheiro emprestado.

Às duas alternativas improváveis, acrescente-se um Orçamento engessado, no qual cerca de 80% dos dispêndios têm caráter obrigatório, e os pagamentos de aposentadorias crescem a cada ano.

Fato é que, com o atraso na reforma crucial da Previdência, todas as demais áreas —incluídas educação, saúde e infraestrutura— correm risco de perder verbas. Isso aconteceria com ou sem o limite formal estabelecido na Carta.

Suprimi-lo ou alterá-lo tornará mais difícil, não mais simples, a tarefa do próximo presidente. Serão necessárias novas demonstrações de austeridade para que se mantenha o financiamento ao governo.

Cabe aos candidatos, pois, expor as escolhas a serem feitas. Negar a finitude inexorável dos recursos só vai gerar frustração posterior.

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