Bolsonaro erra ao descartar de pronto um exame nacional que certifique a qualidade dos formados na área
Em mais um desencontro entre o presidente eleito e sua equipe ministerial, Jair Bolsonaro (PSL) rebateu a defesa que seu indicado para comandar a pasta da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, fizera da criação de um exame nacional de certificação profissional para os formados em medicina.
De acordo com Bolsonaro, que na campanha prometeu submeter ao Revalida todos os cubanos que atuavam no Mais Médicos, não há necessidade de testar a qualificação dos que estudaram no Brasil.
Fazê-lo, disse o futuro presidente, seria tão inconveniente quanto a aplicação do exame da OAB (obrigatório para todos os bacharéis em direito que querem advogar), ao qual ele também se opõe —aparentemente, por impedir que muitos graduados exerçam o ofício.
Tal diagnóstico está longe de ser unânime. A maioria dos especialistas concorda que o nível de preparo dos egressos se mostra ruim, tanto na medicina como no direito.
A taxa de reprovação no teste da ordem dos advogados transita entre 80% e 85%. Na área da saúde, a inexistência de uma avaliação nacional torna mais difícil estimar uma cifra, mas há evidências de que a situação não é confortável.
Em São Paulo, o Cremesp aplica uma prova a alunos do sexto ano e recém-formados. Hoje facultativa (algumas instituições a exigem ao contratar), esta apresenta uma taxa média de aprovação de 55% para os últimos quatro anos.
No entanto entre 2012 e 2014, período em que o procedimento foi obrigatório para todos (embora não houvesse nenhum requisito de desempenho para obter o registro profissional), o índice de sucesso não passou de 45%.
Isso, vale lembrar, em São Paulo, o estado mais rico da Federação e onde se encontram alguns dos melhores cursos do país.
Bolsonaro tem um argumento a seu favor —num momento em que se enfrentam dificuldades para levar médicos às áreas mais remotas e periféricas, criar mais restrições à oferta desses profissionais pode ser contraproducente. Estamos, porém, no que pode ser considerado um período de transição.
Em seus últimos anos, a administração petista autorizou inúmeras faculdades de medicina a entrar em funcionamento ou ampliar suas turmas. Isso significa que o contingente de formados aumentará rápida e significativamente.
Assim, ao mesmo tempo em que ficará mais fácil recrutar interessados em atuar nas regiões mais distantes, o problema da má formação ganhará um peso maior. Deve-se pensar desde já, pois, em modelo de avaliação de qualidade dos cursos e dos estudantes.
Quanto a Bolsonaro, convém que ouça mais os estudiosos e refreie os posicionamentos baseados em sua intuição, por mais que ela tenha sido bem-sucedida na campanha.
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