O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse corretamente que não deve deixar os ruídos de curto prazo do mercado influenciarem a condução da política monetária. Os preços de ativos seguem a lógica da alta frequência e podem oscilar entre extremos em questão de horas. Já as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC devem ser calcadas nos fundamentos de médio e longo prazos que movem a economia.
Quinta passada, quando Campos concedeu entrevista de divulgação do Relatório de Inflação (RI), é um exemplo do alto grau de volatilidade dos mercados. Pela manhã, logo depois da divulgação desse importante documento de comunicação de política monetária, a cotação do dólar chegou a superar R$ 4. Foi o suficiente para surgirem questionamentos, no mercado, se o Banco Central deveria rever a sua sinalização de que os riscos para a inflação estão equilibrados, adotada poucos dias antes.
Enquanto Campos concedia sua entrevista, cotação do dólar já vinha recuando - não apenas pela mensagem tranquilizadora de que a política de juros não vai sofrer solavancos, mas também devido a notícias de reaproximação entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). No fechamento do mercado, a taxa de câmbio já havia recuado a R$ 3,91. No dia seguinte, caiu abaixo de R$ 3,90.
Não se sabe se o dólar vai se estabilizar nesse patamar e menos ainda se as principais preocupações do mercado - o ambiente externo conturbado pela desaceleração da economia global e as incertezas sobre a aprovação da reforma da Previdência - terão um bom desfecho. O Banco Central não deve, também, ignorar sinais emitidos pelos preços dos ativos. Mas é necessária serenidade para separar informações sobre a tendência da economia dos ruídos de curto prazo.
No ano passado, o Banco Central, então presidido por Ilan Goldfajn, sofreu pressão dos mercados para subir os juros, diante da escalada do dólar provocada por um moderado aperto nas condições monetárias internacionais e um quadro de muita incertezas nas eleições presidenciais. O BC, na época, manteve o foco no regime de metas de inflação, mostrando que as turbulências importavam apenas na medida em que significassem alguma ameaça ao cumprimento das metas de inflação.
Hoje, quando se vive um ambiente de muita incerteza, espera-se que o Banco Central siga operando dentro do esperado num regime de metas de inflação. O Relatório de Inflação mostra um ponto de partida bastante favorável. As projeções de inflação para 2019 encontram-se entre 3,9% e 4,1%, dependendo das premissas usadas para câmbio e juros, em todos os casos abaixo da meta, de 4,25%, fixada para o ano. Para 2020, as projeções estão entre 3,8% e 4%, ante uma meta de 4%.
Nos próximos meses, mostra o documento, a inflação tenderá a ficar mais pressionada, chegando a um pico de 4,65% entre abril e maio. Isso, porém, não deveria ser motivo de preocupação. O Banco Central segue uma meta para o ano-calendário, e é absolutamente natural que o índice de preços flutue em torno do objetivo central ao longo do tempo. A forte ancoragem das expectativas de inflação garante que essas oscilações sejam apenas temporárias, sem repercussões mais duradouras.
Deve-se ponderar, ainda, que o balanço de riscos para a inflação inclui também uma força baixista - o alto grau de ociosidade da economia - que poderá levar os índices de preços para percentuais bem inferiores à meta. O Banco Central reconheceu que o crescimento da economia está aquém do esperado, tanto que rebaixou de 2,4% para 2% sua estimativa para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019. Mas quer mais tempo para observar se esse fraco desempenho se deve aos choques que atingiram a economia no ano passado, que apertaram as condições de liquidez, ou se falta maior sustentação da política monetária para atividade.
Se os riscos negativos à inflação se concretizarem, sua repercussão deverá ser cuidadosamente ponderada. Um Banco Central com credibilidade, como é o caso do atual, será capaz de navegar nessas circunstâncias adversas. Mas não fará o impossível. É essencial a aprovação da reforma da Previdência para evitar uma situação de dominância fiscal, quando os instrumentos de política monetária são incapazes de evitar a volta do descontrole inflacionário.
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