- O Estado de S.Paulo
Balança a união do governo com seus apoiadores. Chave do reequilíbrio é a economia
Nem bem terminou a lua de mel, e o casamento já dá sinais de que não vai bem. Como se estivesse sofrendo o desgaste de anos a fio de convivência. Até a família e os amigos mais chegados, antes convencidos de que “um nasceu para o outro”, começam a desconfiar de que a união não dará certo. Ainda assim, torcem para que as tentativas de reconciliação funcionem e o casamento vá em frente.
Quem nunca foi testemunha de crises assim? Nesse quesito, pelo visto, a política imita a vida. Apenas três meses de mandato e a união entre apoiadores de Bolsonaro e o próprio presidente balança. E seu reequilíbrio depende – muito – do desempenho da economia.
Entre empresários, investidores, economistas, a expectativa era de uma atuação determinada e rápida em direção à pauta de ajuste fiscal, dentro dos moldes do liberalismo pregado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, prioritariamente via reforma da Previdência: o governo até que cumpriu a primeira parte e encaminhou a proposta da reforma ao Congresso, mas enredado em picuinhas, ciumeiras e destempero do próprio Bolsonaro, demorou a entrar na negociação e, pior, atacou justamente quem podia ajudar nessa tarefa.
Entre a população em geral, a ansiedade é por uma aceleração do crescimento, traduzida principalmente na recuperação do mercado de trabalho: destruindo as ilusões de que a melhora viria naturalmente com a troca de guarda no Planalto, a atividade econômica continua patinando, as projeções de crescimento do PIB para 2019 já caíram de 2,5% para 2% e o desemprego resiste, firme e forte, atingindo mais de 13 milhões de pessoas. A frustração, portanto, veio nos dois fronts. E o terremoto político nas bases do presidente só fez acentuar esse desalento.
Como em todo ensaio de reconciliação, durante algum tempo ainda permanecem desconfianças de ambas as partes. É preciso dar um tempo para se comprovar se há ou não chances de sucesso.
No caso da reforma da Previdência, a esperança é de que haja “química” entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro da Economia, a quem aparentemente cabe, agora, o comando da articulação. O setor produtivo e principalmente os mercados agarram-se com todas as forças às perspectivas de êxito dessa dupla.
O primeiro, até pelo seu histórico, já deu mostras de que está em condições para exercer esse papel. O segundo, apesar da clareza de propósitos e do discurso direto, na avaliação de alguns analistas ainda precisaria de um certo “treinamento” para exercitar mais a audição do que a própria fala e evitar os pecados cometidos na audiência da semana passada na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado – entre outros, a provocação aos tucanos, aliados de primeira hora na defesa da reforma da Previdência.
O novo teste será nesta quarta-feira, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, onde provavelmente o ministro vai enfrentar interlocutores mais duros. De toda forma, depois da guerra aberta entre Planalto e Congresso, já surgiu um primeiro sinal de acomodação nas bases de Bolsonaro: o PSL, partido do presidente, fechou questão em torno da Previdência e acabou escalando o relator da proposta na CCJ, o deputado mineiro Marcelo Freitas.
Já a reanimação da economia está em linha direta com a retomada da confiança de consumidores e empresários na capacidade do governo de desfazer seus nós internos e levar adiante seu programa econômico – um olhar sobre os indicadores setoriais medidos pela FGV mostra uma queda generalizada em fevereiro, depois do otimismo exacerbado no fim de 2018.
Mas confiança não é só uma questão de voluntarismo dos agentes econômicos. Para reconquistá-la, o governo terá de adotar medidas concretas para melhorar o ambiente a curto prazo.
Há quem recomende, por exemplo, algum ativismo pró-crescimento para acompanhar o ativismo reformista da equipe econômica. Aliás, nesse terreno, vêm mais iniciativas por aí. Maia e Guedes teriam acertado seguir em frente também com a reforma tributária e o próprio Bolsonaro, nas redes sociais, anunciou a redução do Imposto de Renda das empresas, em troca da tributação sobre dividendos.
Porém, mesmo que integrantes dos círculos do Planalto tomem a frente, o presidente é um personagem decisivo na reconciliação do governo com partes importantes do eleitorado. Uma nova recaída belicosa no seu relacionamento com o Congresso, por exemplo, poderia pôr a perder todo o esforço para restabelecer essa união.
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