- Folha de S. Paulo
Prevalece a incapacidade de semear boa governança, num jogo em que ninguém larga o osso
As expectativas para os próximos anos no Brasil se ajustam ao ceticismo velho de guerra. Na economia, crescimento baixo. Na política, ciclotimia em torno da nota quatro, vermelha. Nem exuberância, nem desastre. Suave fracasso.
Governos provocam ódios e paixões, mas têm pouca valia no curto prazo. A vida segue mais ou menos a mesma a despeito deles. Incidem na trajetória da sociedade com o passar dos anos, muitas vezes quando o responsável pela melhoria ou pelo estrago já deixou o cargo.
A anarquia imbeciloide no Ministério da Educação não muda nada agora. Destrói uma parte do futuro. A outra, majoritária, se decide silenciosamente em milhares de secretarias estaduais e municipais. Temos dificuldade de identificar o que nos prejudica e o que nos beneficia.
A arquitetura política que bloqueia o autoritarismo atávico do governante de turno decantou-se ao longo de décadas. Nesse processo as Forças Armadas, pivôs de rupturas desde o final do século 19, transformaram-se em protetoras da ordem democrática.
Quem desconhece tal evolução surpreende-se com o contraste entre um presidente errático e adepto da ligação direta com o povo, de um lado, e autoridades de origem militar previsíveis e ciosas das vias institucionais, do outro.
Domar o Napoleão em que se pode converter até o mais liberal praticante da Presidência não assegura por si o bom governo. Outros vetores de lenta maturação, como a pulverização de partidos e a overdose de poder transferida a juízes e procuradores, atuam na contramão.
Não conseguimos, sobretudo, estabelecer regras do jogo simples e estáveis a estimular a circulação de vencedores nos tabuleiros da política e da economia. Ninguém larga o osso.
A beleza da democracia consiste em entregar aos cidadãos o destino da comunidade. Como ocorre nas epopeias e nas tragédias, o que uns plantam hoje outros colherão no futuro.
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