- O Tempo (MG)
Entre o populismo de direita e a esquerda regressiva
“Alguma coisa está fora da ordem, da nova ordem mundial”, assim cantou o poeta baiano diante do conturbado mundo contemporâneo. Efetivamente, as duas grandes ideias vitoriosas no desfecho do século XX – a liberdade e a democracia – se encontram ameaçadas. Na Turquia, na Hungria, na Venezuela, nos Estados Unidos e até aqui mesmo nestas terras tropicais. Há claramente uma mudança de humor na sociedade. O cidadão médio, pelo padrão tradicional, não é muito afeito a radicalismos e pouco disposto a riscos elevados. Em geral, gosta de estabilidade.
Mas vivemos tempos cinzentos. As coisas parecem de perna para o ar. Diante de um mundo onde o avanço tecnológico não necessariamente incorpora as pessoas; onde mercadorias e capitais podem transitar livremente mundo afora, mas as pessoas não; onde a globalização não consegue produzir respostas suficientes à miséria; e a intolerância emerge como resposta à diversidade cultural, étnica, política e religiosa, o radicalismo abastece a insatisfação das multidões.
Hoje, no mundo inteiro, crescem o apoio a segmentos e líderes populistas, radicais e sectários, diante da incapacidade do sistema político tradicional de produzir soluções para as angústias e as demandas da maioria da população.
No Brasil, temos uma Constituição democrática e vivenciamos nos últimos 34 anos o maior ciclo de liberdade de nossa história. Mas as eleições de 2018 se deram num clima de radicalismo inédito. E essa chama não se apagou. Ao contrário, as pontes de diálogo se estreitam, e os monólogos nas bolhas das redes sociais substituem o exercício da boa política que deveria buscar sempre consensos progressivos.
As instituições republicanas e democráticas precisam ser preservadas. É necessário dar um basta na atual marcha de insensatez. O presidente deprecia o Congresso Nacional, o Congresso quer uma CPI Lava Toga, o STF censura a imprensa, o Ministério Público age às vezes como se não houvesse ordenamento jurídico vigente, e a sociedade começa a se decepcionar precocemente com a chamada “nova política”. Essa trajetória é nitroglicerina pura. Não há a menor chance de dar certo.
No mundo inteiro, os conceitos de direita, esquerda e centro estão problematizados. Os velhos paradigmas ideológicos não nos servem mais. O centro político brasileiro, que deve ser a tradução de equilíbrio, diálogo, espírito democrático, antirradicalismo, foi vigorosamente derrotado em 2018. Mas, mais dia, menos dia, será chamado a restabelecer o equilíbrio, o bom senso, o distencionamento e a boa política.
As forças do centro político têm que se reaglutinar. Qual seria a agenda que poderia nos unificar nas ideias e na ação, nos diferenciando do populismo de direita e da esquerda regressiva? Arrisco uma agenda de seis pontos:
1) radical compromisso com a liberdade e a democracia;
2) defesa da economia de mercado, sendo o papel do Estado o estrita e socialmente necessário;
3) forte posicionamento contra as desigualdades por meio de políticas públicas eficientes;
4) defesa da sustentabilidade;
5) compromisso com a administração pública profissionalizada e com foco em resultados; e,
6) defesa intransigente da ética na política e na gestão pública.
As ideias podem ser outras. Mas o que não podemos é assistir inertes ao crescimento da intolerância e do radicalismo e a marcha insensata rumo ao impasse.
*Marcus Pestana é secretário geral do PSDB
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