Melhor caminho para retomar a valorização do piso salarial é desvinculá-lo dos benefícios da Previdência
As diretrizes propostas para o Orçamento de 2020 consideram um salário mínimo de R$ 1.040 mensais, o que implica a mera correção inflacionária —sem ganho real. Ainda que esta não deva ser tomada como uma decisão definitiva, o governo Jair Bolsonaro (PSL) tem reduzida margem de manobra para uma política de valorização.
No Congresso, onde a articulação do Planalto se mostra frágil, lideranças partidárias já falam em assegurar um aumento de 1,1% acima do INPC, taxa correspondente à expansão da economia em 2017.
Nessa hipótese, seria seguida a sistemática estabelecida em lei a partir de 2011, que entretanto perdeu a validade neste ano.
Ocorre que a continuidade dessa fórmula se torna cada vez mais proibitiva para os cofres públicos, na medida em que o salário mínimo serve de referência para aposentadorias e pensões, benefícios trabalhistas e assistenciais. Cerca de dois terços dos segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recebem o piso.
O governo estima que cada R$ 1 adicional no valor custe quase R$ 300 milhões anuais ao Tesouro Nacional. Ou seja, um ganho real de apenas 1% impactaria as contas em cerca de R$ 3 bilhões.
Não resta dúvida de que a política de reajustes acima da inflação —seguida nos governos do tucano Fernando Henrique Cardoso e dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e, em menor proporção, Dilma Rousseff— teve impacto marcante na redução da pobreza.
Como apontam especialistas, contudo, doravante atingir com eficácia os que estão no piso da distribuição de renda depende de programas com foco mais específico, como o Bolsa Família e auxílios direcionados à infância.
Para que a política de valorização do salário mínimo possa continuar, cumpre enfrentar o tabu da vinculação dos benefícios. O que precisa ser garantido nas aposentadorias é o poder de compra do momento da passagem do trabalhador para a inatividade.
Tirar a Previdência da equação facilitaria a permanência de uma regra para o reajuste do mínimo acima da inflação —que poderia seguir a variação do Produto Interno Bruto (ajustado ou não pelo crescimento da população) ou algum indicador de produtividade.
Ainda assim seriam necessários cuidados. O piso atual, de R$ 998 mensais, já representa 43,7% do rendimento médio do trabalho (R$ 2.285) medido pelo IBGE.
O Brasil, ademais, não é um só: regiões ricas conseguem arcar com salários mais altos, enquanto em localidades mais pobres pode haver desemprego, informalidade e colapso de prefeituras sem recursos.
A vinculação de benefícios sociais ao mínimo até aqui tem sido sacrossanta, mas deve-se reconhecer que ela já não constitui hoje o melhor mecanismo para combater a pobreza —e atua como limitante inescapável de aumentos mais generosos para os que estão na ativa.
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