Encontro de Dodge e Dias Toffoli atende ao estado de direito, mas falta o STF engavetar o inquérito
Voltar atrás na censura inconstitucional à revista “Crusoé” e ao site “O Antagonista” foi um correto recuo do presidente do Supremo, Dias Toffoli, e do ministro Alexandre de Moraes, nomeado por Toffoli responsável pelo não menos controvertido inquérito, aberto de ofício, para apurar ameaças a ministros, seus familiares e a origem de fake news contra a Corte.
O inquérito cometeu grave erro na repressão à suposta notícia falsa de que Toffoli, ainda advogado-geral da União, nomeado por Lula, havia sido citado em delação do empreiteiro Marcelo Odebrecht por ser a pessoa que este, em e-mails internos da empresa, tratava em código como o “amigo do amigo do meu pai” —Lula e Emílio Odebrecht.
A censura, além de ilegal, foi um rotundo fracasso. Ela teve como base atestado da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que nenhuma referência ao “amigo do amigo...” havia chegado a ela. Porém, a informação existia nos autos, mas havia sido retirada do processo a pedido do Ministério Público, por não guardar relação com o objeto das investigações — falcatruas na obra da usina de Belo Monte.
Suspender a censura, além de voltar atrás em uma ilegalidade, serviu como providencial batida em retirada. Outro gesto correto do ministro Dias Toffoli foi reatar os contatos com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, de forma também incorreta colocada de lado na decisão de instauração do inquérito.
Não ajudam ao estado democrático de direito rusgas entre o STF e o Ministério Público. Justiça e MP dependem um do outro, conforme estabelece a Constituição. Dodge visitou segunda-feira Dias Toffoli no Supremo, um encontro fora de agenda. O presidente da Corte garantiu não haver problema no relacionamento entre as duas instituições e até garantiu que o inquérito, ao ser concluído, será enviado ao MP Federal. Sensata decisão, que, em parte, restabelece a legalidade.
O fato é que, para a Constituição ter sido obedecida, a Justiça não poderia estar investigando, no lugar do Ministério Público, organismo responsável pelo encaminhamento das denúncias. Melhor seria Toffoli encerrar logo o inquérito, este objeto estranho que chama cada vez mais a atenção na Praça dos Três Poderes.
Todo o desenrolar desta crise demonstra que este inquérito, que teria sido aberto também para satisfazer o desejo de um ou outro ministro da Corte de criminalizar procuradores, é um atentado ao equilíbrio e à cooperação entre os poderes da República.
Isso, além de incendiar o clima dentro do próprio Supremo, em que vários ministros já se declararam contrários à forma como o inquérito foi instaurado, com a aberração de o órgão de última instância da Justiça avocar poderes inquisitoriais, para investigar, denunciar, julgar e condenar.
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