Na semana em que o Ministério da Economia divulgou que os subsídios concedidos atingiram 4,6% do PIB, nível crítico especialmente em um ambiente de crescentes pressões fiscais, o Supremo Tribunal Federal (STF) ampliou essas despesas. Em placar relativamente apertado de seis votos a favor e quatro contra, o STF decidiu que empresas de fora da Zona Franca de Manaus terão direito a crédito do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) se comprarem no polo insumos já isentos do tributo. O impacto da decisão aos cofres públicos pode chegar a R$ 16 bilhões por ano e a R$ 49,7 bilhões se a União tiver que devolver o que foi pago pelos contribuintes nos últimos cinco anos.
Esse era um dos julgamentos de questão tributária mais esperados para o primeiro semestre e surgiu de demanda de um fabricante de arames. A decisão do STF significa que, na prática, a aquisição de um produto que não é tributado vai gerar crédito de imposto, beneficiando o comprador do insumo. Como o imposto não foi pago, todos os contribuintes do país vão pôr a mão no bolso para premiar a empresa cliente de Manaus.
Ministros que votaram a favor do crédito argumentaram a necessidade de estimular o desenvolvimento da Zona Franca, onde cerca de 600 empresas funcionam "graças aos incentivos fiscais", como disse a ministra Rosa Weber, e de diminuir as desigualdades regionais. Mas, como apontou o ministro Luiz Fux, o benefício aprovado favorece, na verdade, empresas de fora da Zona Franca, que receberão o crédito do IPI que não foi pago.
O regime especial de tributação da Zona Franca de Manaus foi instituído em 1967 e renovado pelo Congresso por mais 60 anos em 2014. Nesse período todo, a contribuição para a redução da desigualdade foi tímida, de apenas 0,2% (O Estado de S. Paulo, 26/4). Na região Norte, o Índice de Gini era de 0,544 em 2017, o que significa uma desigualdade inferior à média nacional de 0,549. As regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste tinham, porém, índices ainda menores.
Estudo apresentado no fim de 2018 pelo Tesouro avalia o efeito da ZFM na geração de empregos e permite a conclusão de que é bastante ineficiente também desse ponto de vista. Dados de 2015 mostraram que o estímulo dado à ZF custou R$ 27,8 bilhões ao governo naquele ano e mantinha 105 mil empregos - um gasto de R$ 265 mil por emprego. Já o Simples Nacional resultava em 10,8 milhões de empregos ao custo total de R$ 72,4 bilhões, ou apenas R$ 7 mil por emprego. Enquanto isso, com R$ 30 bilhões neste ano, menos do que o dobro do destinado ao novo crédito de IPI para a Zona Franca, o Bolsa Família beneficia 14,1 milhões de pessoas.
Os subsídios totais concedidos em 2018 custaram R$ 314,2 bilhões à União. Houve uma queda de 5,5% para 4,6% do PIB entre 2017 e 2018, causada pelo corte dos benefícios financeiros e creditícios, em consequência da mudança na política de linhas de financiamento do BNDES, Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), entre outros. No entanto, os benefícios tributários não dão sinais de recuo e ficaram em 4,3% do PIB. Como se esperava, a criação do teto de gastos aumentou a pressão por essa alternativa para contornar os limites às despesas orçamentárias. Diferentemente de outros subsídios, o benefício tributário não impacta as despesas, e sim as receitas da União.
Segundo o Ministério da Economia, houve redução de gastos com a desoneração da folha de pagamento, para bancar parte do preço do diesel depois da greve dos caminhoneiros no ano passado. Mas essa economia foi contrabalançada por aumentos nos subsídios para a Zona Franca de Manaus, para o Simples Nacional, para agricultura e a agroindústria.
Os números ressaltam a importância de o governo - e a sociedade, inclusive o STF - de rever os subsídios concedidos, do ponto de vista da eficiência e da relação entre o custo e o retorno obtido. Até agora, o maior ajuste ocorreu nos benefícios financeiros e creditícios. Já os tributários são alvo de toda sorte de pressão. Na negociação do subsídio para o diesel, no ano passado, a equipe econômica também tentou reduzir o benefício para a produção de xarope de refrigerantes na Zona Franca de Manaus. Após a ameaça da Coca-Cola de deixar o país, o governo Temer acabou acertando um meio-termo. Muitos foram criados sem data para acabar; outros são facilmente renovados no Congresso, com a conivência dos parlamentares, com pequenas mudanças.
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