sexta-feira, 7 de junho de 2019

Ação desastrada prejudica governadores

Por Andrea Jubé, Marcelo Ribeiro, Raphael Di Cunto e Vandson Lima | Valor Econômico

BRASÍLIA - A divulgação de uma carta atribuída ao colégio de governadores manifestando "repúdio" à exclusão dos Estados e municípios da reforma da Previdência ampliou o desgaste do tema no Congresso e aumentou as chances da matéria ficar de fora do relatório final. Após a reação contrária de vários governadores, uma segunda versão foi divulgada, mas líderes partidários afirmam que dificilmente será possível reverter o desconforto político com o gesto. No início da noite, uma terceira carta foi divulgada, em nome dos governadores do Nordeste.

A primeira versão da carta dos governadores foi divulgada ontem de manhã pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), sem o aval dos demais mandatários. O texto afirmava que os governadores manifestavam "veemente repúdio à sugestão de retirada dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios" da reforma previdenciária.

Horas depois, após os protestos de vários governadores, uma segunda versão foi divulgada, afirmando que os mandatários estaduais "manifestam apoio à manutenção dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios" na proposta.

Com a divisão interna no Fórum de Governadores, os gestores do Nordeste divulgaram à noite uma terceira carta. "A retirada dos Estados da reforma e tratamentos diferenciados para outras categorias profissionais representam o abandono da questão previdenciária à própria sorte, como se o problema não fosse de todo o Brasil e de todos os brasileiros", diz a "carta do Nordeste". "Estamos dispostos a cooperar, a trabalhar pelo bem e pelo progresso do nosso país", comprometem-se.

Apesar do esforço de retificação do primeiro texto, e dos governadores do Nordeste, lideranças das maiores bancadas afirmam que os deputados não estão dispostos a arcar com o desgaste eleitoral para atender aos governadores.

"A posição dos governadores desgastou violentamente a questão dos Estados e municípios na proposta", disse o líder do PL, deputado Wellington Roberto (PB), sobre a primeira versão da carta divulgada por Ibaneis. "Sou radicalmente contra a manutenção dos Estados e municípios no texto", enfatizou.

O líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), afirmou que não apoiará nem mesmo a proposta para que os governadores possam, por lei ordinária, aprovar a reforma nos seus Estados. "Só apoio se os governadores do Piauí, Ceará, Pernambuco, Bahia e outros trouxerem os votinhos deles junto. Os deputados da base deles precisam votar a favor", cobrou.

Para Lira, não faz sentido aumentar a pressão sobre o Congresso com a manutenção dos servidores estaduais e municipais na reforma, se isso não muda em nada a economia projetada para o governo federal e ainda aumenta o risco de derrota de todo o projeto. "Com isso perdemos o apoio de 10% a 20% dos deputados que poderiam votar a favor", completou.

O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), disse ao Valor que o colégio de governadores havia rejeitado o termo "repúdio", mas ainda assim o documento se tornou público. "Houve uma forte reação a essa carta", afirmou. "Estamos pedindo à Câmara que os deputados incluam os Estados e municípios na reforma, quem pede não repudia", ressaltou.

Na mesma linha, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), disse que jamais assinaria um "texto que vem como nota de repúdio a uma Casa em que vivi 20 anos". Ele observou que tem "total respeito pelos deputados e senadores", e que caberia aos governadores "pedir, mostrar a realidade dos Estados e sensibilizá-los a incluí-los na reforma", e não interferir na decisão da Câmara.

Helder explicou que a primeira versão da carta foi redigida pela secretaria do Fórum dos Governadores e divulgada para consulta no grupo de mensagens dos gestores estaduais no dia 4. Mas segundo o emedebista, houve uma "reação geral" dos integrantes do grupo contra o teor do documento. Mesmo assim, Ibaneis teve a iniciativa de levar a carta a público, sem a assinatura dos governadores.

O governador do Distrito Federal não comentou a confusão criada pela carta. No momento em que a divulgou, disse que tinha certeza que Câmara e Senado iriam compreender a necessidade de manter os Estados na reforma. Diante do mal estar gerado, ele mesmo divulgou a segunda versão do documento.

Para um importante aliado do governo no Congresso, os governadores "erraram a mão" na primeira versão da carta, e desgastaram o que vinha figurando entre os pontos mais polêmicos da reforma. "Mesmo sem a adesão da maioria dos governadores, a versão da carta que falava em repúdio teve potencial para ampliar as divergências entre parlamentares e governadores", avaliou. Segundo este aliado, a trapalhada pode prolongar o debate sobre o tema e atrasar o calendário de votação.

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