O Federal Reserve americano fez um corte de 0,25 ponto percentual em sua taxa de juros - o primeiro em uma década -, mas os rumos do futuro da política monetária americana estão envoltos em incertezas, por falta de sinalização do futuro. Ao fim de uma entrevista confusa e evasiva, o presidente do banco, Jerome Powell, disse ao mesmo tempo que a redução dos fed funds anunciada ontem "não é o começo de uma longa série de corte de juros", que ela pode não ser "única" e que o Fed pode caminhar nas duas direções - tanto de alta como de baixa.
Powell não explicou com a segurança e os detalhes esperados os motivos pelos quais o banco central decidiu interromper o ciclo de alta dos juros e começou a fazer o caminho de volta. O comunicado do Fed, em si, não justifica a atitude tomada - nem seu contrário. Afirma que a economia americana cresce em ritmo moderado, com um mercado de trabalho forte e baixa taxa de desemprego. Há sinais de fraqueza no enfraquecimento da taxa de investimentos das empresas e das pressões inflacionárias.
A inflação e o ritmo declinante do crescimento da economia mundial são os motivos imediatos para a mudança de rumos do Fed. Pelo menos dois membros do comitê de política monetária, porém, votaram contra essa orientação, a favor da manutenção da taxa. Eles têm o apoio de analistas de alguns bancos, que veem ainda forte impulso no consumo, nos serviços e restringem os sinais de debilidade às indústrias, um dos resultados da guerra comercial de Trump contra a China.
Quando tentou explicar as razões do Fed para o corte de juros, Powell não foi claro e, quando foi claro, deu motivos que não costumam ser decisivos para a ação do banco central americano. Ele disse que os juros caíram por "ajustes necessários no meio do ciclo". E raramente o Fed deu tanta ênfase à desaceleração econômica mundial e às tensões comerciais para uma guinada na política doméstica de juros.
Segundo Powell, as perspectivas para a economia americana são boas, mas o maior risco "vem de fora", pelos efeitos da guerra comercial e do menor crescimento global, que afetam os EUA pelo "canal da confiança", pioram o desempenho da indústria americana e contêm os investimentos das empresas. A inflação abaixo da meta, de 1,6% em doze meses, praticamente não foi citada.
O gatilho para o movimento do Fed foi esse, mas Powell afirmou que "não há fortes motivos para se mover em uma direção ou outra", isto é, cortar mais ou até mesmo retomar a trajetória ascendente da taxa de juros. Mesmo sendo uma mudança e tanto em relação à "paciência" sinalizada até há pouco, Powell apontou o corte de juros como "a continuação do que estamos fazendo", um palavreado que não faz muito sentido em relação à comunicação anterior do Fed.
O fato é que os investidores americanos já contavam com mais ajustes para baixo nos juros - dois ou três cortes este ano - e as explicações de Powell para o corte de juros passaram muito longe dessa perspectiva. Os mercados acionários fecharam em baixa. As bolsas americanas caíram quase 2%, na pior performance desde maio. Os títulos do Tesouro de curto prazo subiram (o de 2 anos foi a 1,872%) e os de longo foram na direção contrária (2,014%). O presidente Donald Trump se frustrou pelo Fed não ter iniciado um "ciclo agressivo" de queda de juros.
As implicações da decisão do Fed são mais claras que as razões que a motivaram. Embora Powell indique que os próximos passos podem ser dados em qualquer direção, parece certo que a normalização monetária chegou a seu limite, até pelo menos que a inflação tenha alta consistente. A taxa de juros americana está agora um pouco abaixo da considerada neutra pelo Fed, nem estimulativa nem contracionista. Como o BCE está prestes a reduzir juros e a zona do euro apresenta crescimento bem inferior ao dos EUA, o dólar tem espaço para se fortalecer, ainda que sem grande ímpeto. A busca por rendimentos maiores, que traz capitais para os países emergentes, deve prosseguir. As incertezas sobre os próximos passos do Fed, de qualquer forma, se deslocaram para o terreno da acomodação das taxas de juros, mantendo um ambiente benigno para que o Brasil arrume a casa e dê passos em direção ao crescimento.
O BC brasileiro fez a coisa certa e cortou a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, para 6%. O comunicado do Copom sinalizou que a permanência do cenário favorável para a inflação "permitirá ajuste adicional no grau de estímulo", o que é bastante favorável à retomada do crescimento.
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