quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Bernardo Mello Franco - Amor à primeira vista

- O Globo

Augusto Aras começou como Bolsonaro queria. No dia da estreia, o novo PGR defendeu a reabertura do caso Adélio. O presidente definiu a relação dos dois como “amor à primeira vista”

Augusto Aras começou como Jair Bolsonaro queria. O novo procurador-geral da República tomou posse ontem. No dia da estreia, defendeu a reabertura do caso Adélio Bispo.

O homem que esfaqueou o presidente está num presídio de segurança máxima. Em julho, a Justiça concluiu que ele é incapaz de responder por seus atos. Laudos de três psiquiatras, indicados pela defesa e pela acusação, apontaram um quadro de transtorno delirante.

Os advogados de Bolsonaro não quiseram recorrer, e o processo foi encerrado. Mesmo assim, o presidente continua a alimentar teorias conspiratórias sobre o atentado. Ele se refere a Adélio como “militante de esquerda”, insinuando uma trama política para matá-lo.

Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, o novo chefe da Procuradoria deu corda ao discurso presidencial. Na contramão da Polícia Federal, Aras disse não acreditar que Adélio tenha agido sozinho. Ele acrescentou que ainda é tempo de “buscar a verdade real” sobre o caso. Não foi a única piscadela a quem o nomeou.

Na posse, Aras disse que a PGR não atuará contra a “nossa cultura judaico-cristã”. Ele já nomeou militantes bolsonaristas para postos-chave. Seu secretário-geral, Eitel Santiago, é da turma que chama golpe de “revolução”. O secretário de Direitos Humanos, Ailton Benedito, defendeu a apreensão de livros com conteúdo LGBT.

Aras também agradeceu o apoio de Meyer Nigri, a quem chamou de “amigo de todas as horas”. Dono da construtora Tecnisa, o empresário foi um dos principais articuladores da campanha do presidente. Ontem soube-se que ele também influenciou a sucessão na PGR.

À vontade, Bolsonaro chamou o procurador de “querido” e definiu a relação dos dois como um “amor à primeira vista”. “Só faltou ele me saudar com o grito de ‘Selva!’”, gracejou, referindo-se à saudação dos quartéis.

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Do ministro Marco Aurélio Mello, no plenário do Supremo, depois de um longo discurso de Gilmar Mendes sobre Lava-Jato, vazamentos do Intercept, direito de defesa, gangsterismo, fetiches sexuais e outros assuntos:

“Presidente, o que estamos a julgar?”

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