Nossos negociadores deram vexame na COP-25
Em 1992, o Rio de Janeiro hospedou a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento —também chamada Cúpula da Terra. Nome adequado, pois alçou a mudança climática ao devido lugar na agenda internacional. Ao longo desses 26 anos terminados em 2018, o tema passou integrar a política externa brasileira, contribuindo para compor a imagem positiva de país emergente que demandava mais voz e reconhecimento nos foros multilaterais.
Neles, o Brasil podia apresentar como trunfos a sua matriz energética diversificada e menos dependente de combustíveis fósseis; a posse de quinhão considerável do grande repositório de biodiversidade da floresta amazônica; um marco regulatório avançado; instrumentos sofisticados de monitoramento e políticas governamentais que tratavam de pôr freio —embora muitas vezes sem êxito— à degradação ambiental.
A notável queda dos índices de desmatamento, na primeira década e meia do novo século, testemunha o avanço obtido a duras penas. No âmbito internacional, atento às assimetrias de poder, o Itamaraty atuou para que tivéssemos voz ativa. E buscou para Brasil o papel de intermediário confiável, empenhado em construir pontes entre as nações mais poderosas e aquelas em desenvolvimento, quando estava em jogo distribuir custos e responsabilidades na contenção da crise ambiental. Foi assim nas negociações que levaram ao Acordo de Paris, em 2015.
Nada parecido com isso ocorreu na frustrante Conferência das Partes —a COP-25— encerrada domingo passado, em Madri. Por decisão pessoal de Bolsonaro, abrimos mão de sediar o encontro. Fomos à Espanha "con mala reputación" por tudo o que o presidente e seu ministro do Meio Ambiente aprontaram no setor: a liquidação da capacidade de monitoramento e de intervenção do Ibama, perseguição a organizações ambientalistas, deboche da crise ecológica e incentivo aos predadores, desaforos dirigidos a personalidades comprometidas com a causa, aumento do desmate, extinção do Fundo Amazônia.
Com uma agenda apequenada, cujo foco era obter recursos —que não vieram—, nossos negociadores deram vexame: opuseram-se ao uso do termo emergência climática para descrever a crise presente, à menção aos direitos dos povos indígenas e à inclusão na pauta do impacto da mudança climática em terra e nos mares. Afastaram-se da União Europeia e somaram-se aos Estados Unidos e à Austrália para bloquear uma solução positiva a fim de regular o mercado de créditos de carbono. Segundo a ministra espanhola da Transição Ecológica, o Brasil ficou "esmagadoramente isolado".
*Maria Hermínia Tavares, professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
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