- Valor Econômico
Modalidade já é adotada por 13 Estados, o DF e mais 9 capitais
Até o fim de 2018, 13 Estados brasileiros, o Distrito Federal e nove capitais adotavam algum tipo de Orçamento impositivo, de acordo com pesquisa realizada pelo professor Rodrigo Luís Kanayama, chefe do Departamento de Direito Público da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Em conversa com o Valor, Kanayama alertou para o fato de que os números podem ter aumentado neste ano e que a sua pesquisa não abrangeu os municípios do interior.
No caso dos Estados, cinco deles adotam em suas constituições a obrigatoriedade para a execução de todas as programações orçamentárias. Outros sete e o Distrito Federal tornaram obrigatória a execução apenas das emendas parlamentares, e um deles, das emendas e das decisões tomadas em audiências públicas sobre o Orçamento.
Seis Estados inscreveram o princípio em suas legislações antes de o Congresso Nacional incluir na Constituição da República, por meio da Emenda Constitucional 86/2015, a obrigatoriedade de execução das emendas individuais dos parlamentares ao Orçamento. De 2015 a 2018, outros seis Estados foram pelo mesmo caminho.
A aprovação das emendas constitucionais 100 e 102 à Constituição da República, neste ano, poderá abrir uma verdadeira avenida para que outros Estados e municípios avancem em direção ao Orçamento impositivo. A emenda 100 tornou obrigatória a execução das emendas de bancada estadual e determinou que “a administração tem o dever de executar as programações orçamentárias, adotando os meios e as medidas necessários, com o propósito de garantir a efetiva entrega de bens e serviços à sociedade".
A emenda 102 estabeleceu que a obrigatoriedade de execução “aplica-se exclusivamente às despesas primárias discricionárias”, que são os investimentos e o custeio da máquina pública. Como as demais despesas são de execução obrigatória por algum dispositivo constitucional ou legal, todo o Orçamento passou a ser impositivo.
A tradição brasileira é de Orçamento apenas autorizativo, como lembrou o professor Kanayama. No fim da década de 1990, alguns parlamentares deram início a um movimento a favor do Orçamento impositivo. A PEC 77/1999, de iniciativa do então senador Iris Rezende, do PMDB goiano, propôs a obrigatoriedade da execução orçamentária. A bandeira foi, então, empunhada pelo então poderoso senador Antônio Carlos Magalhães, do PFL da Bahia, que, em 2000, apresentou uma proposta no mesmo sentido. Naquela época não se falava em emenda impositiva, mas na obrigatoriedade de execução de todas as programações orçamentárias.
O movimento foi uma reação ao uso excessivo, por parte do Executivo, da barganha na execução das emendas que os parlamentares faziam ao Orçamento, para que eles aprovassem as propostas de interesse do governo. A crítica principal era que o Executivo executava o que queria e que o Orçamento tinha virado uma peça de ficção.
Em 2015, os parlamentares impuseram uma derrota à ex-presidente Dilma Rousseff e aprovaram a Emenda Constitucional 86, que tornou obrigatória a execução das emendas parlamentares individuais ao Orçamento, até o limite de 1,2% da receita corrente líquida da União.
O máximo que o então governo conseguiu foi que 50% dos recursos seriam destinados obrigatoriamente à área da saúde. Depois vieram as emendas 100, 102 e agora a emenda 105, que permite ao parlamentar doar ao município ou governo que desejar, sem destinação específica e sem fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU), até a metade do valor de suas emendas individuais.
Para o professor Kanayama, a mudança que está ocorrendo no Orçamento é de fundamental importância, pois altera a relação entre o Executivo e o Legislativo. “A força que o Parlamento ganha é muito grande”, avaliou. Ele acredita que, se a prática se espalhar para os municípios do interior, é alto o risco de que ocorra um aumento da ineficiência na alocação dos recursos públicos.
A procuradora Élida Graziane Pinto, do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, acha que o país caminha para uma espécie de “parlamentarismo fiscal”. Para ela, está ocorrendo uma paulatina reversão do poder que o Executivo tinha de capturar lealdades parlamentares por meio das emendas ao Orçamento. “Assim, tem sido expandido o nicho de deliberação autônoma do Congresso em caráter obrigatório para o Executivo”, observou. “Como o presidente Bolsonaro cedeu espaço para o Congresso, foi mais fácil para este acelerar o processo da impositividade orçamentária que diminui a discricionariedade do Executivo em favor da ampliação de poder do Legislativo”.
Ainda é difícil prever as consequências para o sistema político brasileiro da mudança que está em curso.
Inconstitucional
Especialistas consultados pelo Valor garantem que um aspecto da proposta orçamentária aprovada pelo Congresso Nacional, na noite de terça-feira, poderá ser considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em seu parecer, o relator-geral da proposta, deputado Domingos Neto (PSD-CE), promoveu uma redução da ordem de R$ 6 bilhões nos gastos de pessoal em 2020, condicionada à aprovação da proposta de Emenda Constitucional 186/2019, que permite que o governo diminua a jornada de trabalho e o salário dos servidores em até 25%. A economia com pessoal foi usada para programar outros gastos.
O problema é que o parágrafo terceiro do artigo 166 da Constituição proíbe, expressamente, a redução da dotação para o pagamento de pessoal e encargos sociais por meio de emenda parlamentar. Em conversa com o Valor, o deputado Domingos Neto observou que a lei orçamentária aprovada determina que, no caso da não implementação dos dispositivos da PEC 186, poderão ser recompostos os valores das despesas de pessoal com o cancelamento dos gastos que ficaram condicionados. “Avaliamos pela constitucionalidade exatamente por entender que fica preservado o Orçamento em todas as circunstâncias”, disse.
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