E segue o baile
Talvez o presidente Jair
Bolsonaro não chegue ao ponto de ter vontade de sacar do revólver quando ouve
falar em Cultura. Numa peça antinazista de Hanns Jost, encenada em Berlim em
1933, ano em que Hitler assumiu o poder, um personagem dizia: “Quando ouço
alguém falar em Cultura, saco o meu revólver”.
Mas Cultura não é lá do
agrado do ex-capitão, que já confessou que nunca leu um livro. “Tem muita
letra”, queixou-se. “Precisa ter mais figuras”. Por extensão, Educação também
não é. Em pouco mais de um ano e meio de governo, dois tristes nomes passaram
pelo Ministério da Educação. E o terceiro começou mal.
O pastor presbiteriano
Milton Ribeiro revelou-se um homofóbico logo em sua primeira entrevista desde
que assumiu o cargo. Disse que a homossexualidade é uma “opção”, que ele
atribui ao que chamou de “famílias desajustadas”. “Normalizar isso e achar que
está tudo certo é uma questão de opinião”, declarou. Não é.
Pediu para receber uma dura
resposta de qualquer dos seus antagonistas, e a recebeu do youtuber Felipe Neto
(33 milhões de seguidores nas redes sociais), recém-incluído na lista das 100
pessoas mais influentes do mundo em 2020, segundo a insuspeita revista
americana “Time”. Neto perguntou ao ministro:
“Se família
desajustada gera homossexuais… Que tipo de família gera envolvimento com
milicianos e desvio de verba de gabinete para compra de imóveis, além de
lavagem de dinheiro?”
Ribeiro pensa o que disse,
mas fez questão de dizer para reconciliar-se com Bolsonaro, irritado desde que
ele recebeu em audiência um grupo de deputados federais da oposição – entre os
quais, Tabata Amaral (PDT-SP). Foi na quarta-feira da semana passada, segundo
contou Igor Gadelha, repórter da CNN Brasil.
Bolsonaro orientou Ribeiro a
filtrar mais quem recebe no ministério. E, se tiver que receber opositores do
governo por obrigação, que não saia divulgando positivamente esses encontros.
Que não fosse ingênuo e não se auto sabote. Ribeiro explicou que os deputados
integravam uma comissão da Câmara. E daí?
Além de preconceituoso,
Ribeiro revelou-se ignorante ao sugerir na entrevista que seu ministério não
está interessado em aperfeiçoar a tecnologia nas escolas. Para ele, por
exemplo, a dificuldade do ensino a distância durante a pandemia do
coronavírus é problema dos outros, dele não:
– A sociedade brasileira é
desigual, e não é agora que a gente vai conseguir deixar todos iguais. Esse não
é um problema do MEC, é um problema do Brasil.
É possível que um problema
do país, tanto mais o do ensino à distância, não seja também problema do
Ministério da Educação? A verdade fugiu à boca de Ribeiro. Por muito menos, ao
falar sobre impostos em uma entrevista recente, o ministro Paulo Guedes, da
Economia, foi arrancado de cena por um dos seus colegas.
Este é um governo que fecha
os olhos ao que lhe compete e se envolve com o que nada tem a ver. A opção
sexual de cada um é assunto privativo de cada um – ao governo só cabe
respeitar. A destruição do meio ambiente é um problema de todos, mas incumbe ao
governo liderar os esforços para combatê-la.
Ribeiro não se auto sabota
quando aceita reunir-se com deputados da oposição – é dever do homem público
porque o governo foi eleito por uns, mas governa para todos. Bolsonaro se auto
sabota e, pior, sabota o país quando em meio a uma pandemia com mais de 140 mil
mortos é capaz de dizer, como disse ontem:
“Fico vendo
Brasília, não posso falar nomes aqui, mas a alta cúpula do poder, alguns do
Executivo, Judiciário, Legislativo também, com máscara 24 horas por dia.
Dormiam com máscara, cumprimentavam assim [com ombro], pegaram o vírus agora.
Não adianta isso aí”.
Aproveite o quanto possa
De janeiro do ano passado
quando tomou posse e até dezembro, a popularidade de Bolsonaro só fazia cair,
bem como a confiança dos brasileiros nele e a aprovação do seu governo, segundo
pesquisa Ibope encomendada pela Confederação Nacional da Indústria.
O que aconteceu de lá para
cá que justifique o crescimento exponencial de Bolsonaro conferido pela mais
recente pesquisa Ibope? Certamente não foi a alta da inflação, nem a saída de
Sérgio Moro do governo, nem o aumento do desemprego.
Tampouco o desempenho
desastroso do governo durante a pandemia que já matou quase 140 mil pessoas e
infectou mais de 4.650.000. Foi basicamente o pagamento do auxílio emergencial
de 600 reais para os brasileiros mais pobres.
Entre os eleitores com renda
familiar de até um salário mínimo, a popularidade de Bolsonaro subiu de de 19%
em dezembro para 35%. Entre os eleitores com menor grau de instrução, a
avaliação de ótimo ou bom saltou de 25% para 44%.
Aproveite Bolsonaro o tempo das vacas gordas. Em breve elas poderão emagrecer quando ao invés dos 600 reais, os contemplados com o auxílio passarem a receber só 300, e quando depois o auxílio cessar por falta de dinheiro.
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