Republicano lançou tentativa de golpe mais incompetente desde 'Bananas', de Woody Allen
O
presidente Donald Trump deixou uma coisa dolorosamente clara: depois de deixar a Casa
Branca a contragosto, ele vai seguir fazendo tudo o que puder para
continuar a ser notícia. Vai postar insultos e teorias conspiratórias no
Twitter. Talvez abra seu canal de televisão próprio. E, segundo membros de seu
círculo interno, é possível que se candidate a presidente em 2024.
Após
meia década sob sua influência, muitos observadores políticos imaginam que
Trump vai conseguir conservar a atenção da nação voltada para ele. Entendo por
quê. Uma minoria considerável dos americanos acredita
que a eleição foi fraudada e permanece profundamente devota ao
presidente que está de saída.
Mesmo
agora que a derrota de Trump libertou
o Partido Republicano de seu captor, os políticos republicanos parecem
estar sofrendo de um caso grave de síndrome de Estocolmo. E a única área na
qual o 45º presidente já comprovou reiteradamente possuir talento real é sua
capacidade de se manter no centro da atenção pública.
Mas,
embora Trump ainda possa acabar se mostrando uma influência tão dominante sobre
a política na década de 2020 quanto foi na década de 2010, esse resultado é
menos provável do que muitos supõem.
Sobram teorias para tentar explicar a ascensão de Trump ao poder em 2016. De acordo com algumas, ele falou em nome dos economicamente despossuídos. Segundo outras, suas mensagens racistas disfarçadas atraíram eleitores preconceituosos.
Entretanto,
embora as duas hipóteses ajudem a explicar parte de sua atração, a verdade é
muito mais simples: milhões de americanos que não pensam muito em política
encaravam Trump como um vencedor, um realizador.
Desde
seus primeiros momentos de fama local em Nova York, ele vem moldando sua imagem
pública cuidadosamente para dar ênfase a seu poder e seu sucesso.
Os
insiders de Manhattan sabem que a verdadeira elite da cidade sempre o
desprezou. Mas os leitores de seu livro “A Arte da Negociação” o encaram como
exemplo rematado de um negociador dominante que sabe como usar seu poderio
financeiro.
Jornalistas
de negócios sabem que muitos dos empreendimentos de Trump foram à falência em
pouco tempo e que ele poderia estar muito mais rico agora se tivesse
simplesmente aplicado sua herança no mercado acionário. Mas, para a maioria dos
americanos, o apresentador de “O Aprendiz” é a personificação de um
empreendedor que construiu um grande império graças a seu incrível tino para os
negócios.
Agora,
porém, o verniz de invencibilidade de Trump está se desfazendo. Ele perdeu sua
tentativa de reeleição e lançou a tentativa
de golpe mais incompetente desde “Bananas”, de Woody Allen. Ele
pode se enfurecer e falar loucuras sobre o que aconteceu em novembro, mas não
poderá impedir seus seguidores de verem Joe Biden tomar posse em janeiro. O
medo de qual pode ser seu próximo passo está dando lugar às gargalhadas. Trump
está parecendo mais fraco e assustado a cada dia que passa.
Tampouco
está claro se o presidente em final de mandato vai conseguir construir uma
“Rede Trump de Jornalismo”. Se ele tiver um programa diário de uma hora na
televisão, seus fãs mais devotos com certeza vão assistir. Mas, para ser
comercialmente viável, seu canal teria que ampliar aquele público fundamental,
atrair outros apresentadores que fossem capazes de conservar a atenção do
público, contratar jornalistas que pudessem cobrir de fato o que acontece no
mundo e atrair publicidade de empresas comuns.
Competir
com a Rede Fox não seria fácil para ninguém que estivesse lançando uma nova
rede de jornalismo conservador. Dado o histórico de incompetência de Trump
tanto nos negócios quanto em seu cargo público, parece improvável que ele
tivesse êxito nessa empreitada.
Tampouco
é evidente que Trump pudesse realisticamente se candidatar à Presidência outra
vez. Em 2024 ele pode estar falido, na prisão ou com a saúde muito fragilizada.
E, mesmo que esteja em condições de disputar a candidatura presidencial
republicana, ele não necessariamente a conquistaria.
O
Partido Republicano teve uma composição ideológica relativamente estável no último
meio século. O chamado “banquinho de três pés” unia conservadores sociais,
defensores do livre mercado e figuras de linha dura na política externa,
formando uma aliança intranquila, mas durável. Mas, precisamente pelo fato de a
composição política do partido ser tão heterogênea, seus líderes mais
influentes —de Richard Nixon a George W. Bush e de John McCain a Donald Trump—
não guardam muita semelhança uns com os outros.
Que
ninguém se engane: ainda é muito cedo para encarar Trump como carta fora do baralho.
Pode ser que os americanos continuem a acompanhar seu feed no Twitter com
horror ou fascínio pelos próximos quatro anos. Talvez os eleitores das
primárias escolham Trump como candidato republicano em 2024. Pode até ser que
Trump faça um retorno triunfal à Casa Branca.
Mas
o que é possível não precisa ser provável. E as chances são muito boas que os
americanos se entediem com as palhaçadas cada vez mais risíveis do mau perdedor
que acabam de expulsar do cargo.
*O cientista social Yascha Mounk é professor associado na Universidade Johns Hopkins e autor de "O Povo contra a Democracia".
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