O Estado de S. Paulo
Reeleição de parlamentares deve ser incentivada, mas sem perdas de representação
A probabilidade de vitória é maior para
parlamentares que tentam a reeleição que para os que concorrem a qualquer outro
cargo.
A profissionalização da atividade política
é vista por grande parte da população de uma forma muito negativa. Como se a
atividade política somente se legitimasse quando exercida por vocação.
Entretanto, legisladores, em qualquer sistema político, maximizam a
sobrevivência eleitoral; ou seja, buscam a reeleição.
Eles tentam, como em qualquer outra
profissão, aumentar a estabilidade de sua carreira profissional, sempre
buscando a diminuição de incertezas com relação à continuidade no jogo
político.
Tanto nos EUA como no Brasil, a maioria dos
deputados federais se reelege. No entanto, o sistema eleitoral majoritário
americano, que escolhe apenas um parlamentar por distrito, gera muito mais
estabilidade da carreira legislativa que o sistema proporcional de lista aberta
brasileiro, com magnitude distrital média de 19 cadeiras por Estado.
Enquanto a taxa de reeleição média nos EUA é de 94%, no Brasil é consideravelmente menor, sendo de apenas 59% no mesmo período analisado. Ou seja, embora em ambos os países exista uma clara vantagem do incumbente em relação aos novos concorrentes ao cargo legislativo, essa vantagem é muito maior para o legislador americano quando comparada ao brasileiro.
No artigo “Should I stay or should I go?”,
eu e Lúcio Rennó demonstramos que a maioria dos deputados federais, no Brasil,
concorre à reeleição por ser a opção de carreira política comparativamente mais
segura. A probabilidade de vitória é maior para os parlamentares que tentam a
reeleição do que para os que concorrem a qualquer outro cargo eletivo.
Diferentemente de muitas outras profissões,
legisladores têm que colocar o pescoço a prêmio a cada quatro anos em um jogo
de sobrevivência eleitoral extremamente competitivo. A taxa de renovação para a
Câmara dos Deputados, que vinha se estabilizando em torno de 37% desde as
eleições de 1994, pulou para 47% nas últimas eleições (em 2018), um número
muito similar ao padrão das primeiras eleições legislativas ocorridas após a
redemocratização (1986 e 1990).
A sobrevivência política e eleitoral de
parlamentares ficou ainda mais difícil a partir das reformas de 2017,
notadamente a cláusula de desempenho – para que o partido tenha acesso aos
fundos partidário e eleitoral – e o fim das coligações nas eleições
proporcionais.
É, portanto, perfeitamente racional que os
deputados da atual legislatura tentem aprovar uma nova regra que minore os
riscos de ficarem de fora do jogo; ou seja, que gere mais vantagens para o
incumbente em relação aos desafiantes ao cargo.
A saída que está sendo proposta pela
comissão da Câmara que analisa a reforma política é a mudança do sistema
proporcional para o majoritário, mantendo-se cada Estado como um distrito
eleitoral – o chamado “distritão”. Os nomes mais votados seriam eleitos, o que
favorecerá os candidatos que já têm mandato, conhecidos e com força eleitoral.
Entretanto, as perdas de representação
nesse sistema são enormes. Isso porque, ao desprezar os votos que excedem o
quociente eleitoral de um distrito, ele aliena a preferência de milhares
eleitores. Além do mais, o “distritão” corrompe a essência do sistema de
representação, que é a construção de responsabilidades coletivas em torno de um
partido político, pois apenas privilegia as conexões individuais entre
eleitores e candidato. Enfim, os efeitos colaterais do remédio podem não
compensar o tratamento.
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