- Folha de S. Paulo
O Brasil no espelho da The Economist
O Brasil gosta de se ver no espelho
internacional; se no passado eram as narrativas dos viajantes que atraiam a
atenção, agora é a mídia. As semelhanças entre o novo dossiê da The Economist e
o editorial
do New York Times publicado quando o Brasil promulgou sua nova
Constituição são espantosas. O editorial apontava para o desafio de “como pôr a
Constituição em operação em um país com corrupção desenfreada, inflação sem
controle e vastas desigualdades sociais”.
Substitua inflação por desequilíbrio fiscal
(que é causa do primeiro) e mantenha corrupção e desigualdade, e a conclusão é
que há mais de três décadas lidamos com os mesmos problemas.
A crise atual é, para a revista, produto de
três falhas: a ausência e/ou protelação de reformas e “curto-prazismo” (e “aqui
a culpa é fundamentalmente do PT, partido no poder de 2002 a 2016”); a brutal
reversão da luta anticorrupção; e a frustração coletiva frente a um sistema
ancorado em patronagem e que garante à “classe política” recursos e imunidade
em relação a seus desmandos.
O desafio agora, segundo a revista, é livrar-se de um presidente autoritário e da frustração coletiva que levou à sua ascensão, enfrentando o baixo crescimento crônico do país e a desigualdade, o que exigirá reformas dramáticas. Ela alerta que a saída pode ser para o passado, e não o futuro, citando declarações de Lula como: “os procuradores dos EUA colaboraram com a Lava Jato porque tinham interesse em nossa Petrobras” e “nossos erros não foram éticos, mas econômicos”.
Destaco uma passagem instigante do dossiê:
“A própria resiliência que tem protegido as instituições brasileiras da
predação de um populista também as torna resistentes à mudança benéfica.”
Sim, o Brasil tem uma estrutura
institucional com pontos de veto que geram proteção mas também imobilismo. O
multipartidarismo hiperfragmentado, o bicameralismo, o federalismo robusto e um
Legislativo cada vez protagonista potencializam problemas de formação de
maiorias. A extensa constitucionalização, por sua vez, requer quóruns
supermajoritários. As cortes superiores são outro ponto crucial de veto; cabe
ao STF a arbitragem de extensos conflitos no sistema —seu hiperprotagonismo é
potencializado pelos rampantes iliberais do Executivo e seu papel como corte
criminal, em contexto de vasta corrupção (o que também ocorre com às
instituições de controle).
Assim, pontos de veto mitigam abusos potenciais, mas comprometem a capacidade de mudança institucional virtuosa para evitar a estagnação e a permanente e perigosa frustração coletiva. O risco é ainda maior quando os atores institucionais voltam-se para seus interesses corporativos.
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