segunda-feira, 7 de junho de 2021

Washington Olivetto - Socorro!

- O Globo

No dia 13 de maio de 2021, a urna eletrônica fez bodas de prata. Completou 25 anos de casada com as eleições brasileiras. Esse casamento, celebrado nas eleições municipais de 1996, rendeu bons frutos.

Com o passar do tempo, os componentes de software e hardware foram aprimorados, em nenhuma eleição aconteceu qualquer indício de fraude, a confiabilidade na coleta e apuração dos votos aumentou, e a agilidade no anúncio dos resultados cresceu. Provando assim que o sistema digital é superior ao sistema impresso.

Estranhamente, nos últimos tempos, o governo federal iniciou uma forte campanha pelo retorno do voto impresso.

Os especialistas em política dizem que essa campanha acontece porque os votos no papel, depositados nas primitivas urnas de madeira, permitem contestar os resultados, alegando fraudes, como fez nas últimas eleições americanas Donald Trump, ídolo do presidente Jair Bolsonaro.

Alguns presidentes de partidos, como Carlos Lupi, do PDT, e Carlos Siqueira, do PSB, aderiram a essa campanha. E a deputada federal governista Bia Kicis (PSL-DF) contratou duas empresas, pagas com dinheiro público, para a missão de provar imperfeições nas urnas digitais.

Tomara que essa postura retrô não se concretize, mas, se ela ocorrer, dá pra imaginar uma porção de outros retrocessos que os políticos brasileiros poderiam tentar promover nos próximos tempos.

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, poderia propor a proibição dos iPhones e a volta dos telefones pretos dentro das casas e nos estabelecimentos comerciais, assim como a instalação de alguns orelhões nas ruas.

A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, poderia propor a volta do vestido tubinho, coisa que a ex-bolsonarista e atual opositora Joice Hasselmann contestaria imediatamente por ser adepta do tomara que caia. E que caia já.

Ainda sobre a ministra Damares, que tempos atrás cogitou proibir o sexo entre os jovens, neste momento e aproveitando a possibilidade de volta ao passado, ela poderia proibir a pílula anticoncepcional, criada por John Rock e Gregory Pincus, em 1960.

O refrigerante Grapette, estrondoso fracasso de vendas, lançado no Brasil pela Anderson Clayton & Co, em 1961, poderia voltar ao mercado a partir de agora, mas obviamente não recomendado nas escolas pelo ministro da Educação, Milton Ribeiro, porque “quem bebe Grapette repete”.

O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes, poderia criar condições privilegiadas para a Ford Motor Company voltar ao Brasil, desde que a empresa se comprometesse a relançar o Corcel cor de mel, e esse mesmo ministro poderia sugerir também o relançamento da Vemaguet e ajudar na ressurreição da Fábrica Nacional de Motores, com seus caminhões Fenemê.

Enquanto isso, o ministro da Cidadania, João Roma, poderia mandar distribuir pelo país toneladas de vidros de coalhadas, substituindo os iogurtes de frutas que a Danone francesa introduziu no Brasil a partir dos anos 1970.

Finalizando com um assunto do momento, a Covid-19 e a possibilidade de outras pandemias, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, poderia incentivar a população a hostilizar qualquer incentivador da vacinação, como foi feito com Oswaldo Cruz, em 1904, quando ele criou o programa de vacinação contra a varíola. E poderia também fingir não estar vendo as “motociatas” e passeatas nas principais capitais do país, que ocorrem sem o uso de máscaras, promovendo aglomerações e novas contaminações.

Claro que, se tudo isso acontecesse, o que restaria para a maioria dos brasileiros de bom senso seria pedir a volta do programa de rádio “Telefone pedindo bis”, do consagrado Enzo de Almeida Passos, na Rádio Bandeirantes de São Paulo.

Telefonando para lá, esses brasileiros poderiam pedir que Enzo executasse mais uma vez aquela canção dos Beatles que foi um enorme sucesso em 1965 e acabou virando nome do novo LP e do segundo filme dos quatro rapazes de Liverpool.

Help!

 

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