O Globo
O tema da semana para mim foi o relatório
do IPCC sobre aquecimento global. Desde 2005, quando houve a conferência de
Gleneagles, na Escócia, aprendi que o momento em que chegaríamos a uma situação
irreversível seria quando as grandes correntes marinhas fossem afetadas. Parece
que chegamos lá.
Como discutir isso num país em que
Bolsonaro é presidente? O tamanho do adversário nos entristece porque acaba
rebaixando nossas possibilidades.
No momento em que soava o alarme do IPCC
para a humanidade, e para o Brasil, uma vez que ainda somos parte dela, o país
estava galvanizado por um desfile de artefatos fumegantes na Esplanada dos
Ministérios.
Não há o que dizer numa república bananeira
quando o presidente decide promover um desfile de tanques de guerra para
pressionar o Congresso. Isso é Bolsonaro.
As Forças Armadas, no entanto, me
preocupam. Elas não são obtusas como muitos às vezes as descrevem. Há
tecnologia moderna no ITA, livros sobre guerra moderna são produzidos por
oficiais, e até reflexões sobre direitos humanos e a Convenção de Genebra.
É verdade que o Brasil não tem muita
experiência real de guerra, e isso tende, segundo alguns, a uma acomodação
burocrática. Vá lá, mas ainda assim a burocracia não pode escapar de uma certa
racionalidade.
Como explicar um desfile de tanques para entregar um convite ao presidente? É algo que poderia ser feito por e-mail, telegrama, ofício ou mesmo por uma pequena comissão.
Posso até admitir que usem um tanque para
chegar a uma cachoeira de difícil acesso. É contra o regulamento, mas não tão
absurdo.
E para que toda aquela fumaceira? Não
estaria dando uma falsa ideia da precariedade de nossos equipamentos? São
melhores do que pareceram naquela manhã do dia 10 de agosto.
Comecei até a duvidar da racionalidade
dessa Operação Formosa, que custou em torno de R$5 milhões. Em que cenário de
guerra a Marinha desembarcaria esses calhambeques? Na Normandia, na Baía dos
Porcos, ou seriam um reforço tardio na caça ao Lázaro Barbosa, que morreu numa
operação policial em Goiás?
No fundo, fico pensando, será que esses
almirantes, brigadeiros e generais têm realmente ideia do que é uma guerra
moderna?
Se tivessem, dariam mais valor à informação
e a seus aspectos psicológicos? Interessa mostrar ao mundo um deslocamento de tanques
para entregar convites, assim como o descaso de escolher essa fumaceira para
exibir às câmeras?
Suponhamos que Bolsonaro tenha transformado
as Forças Armadas num tipo de milícia que ignora o mundo e está unicamente
preocupada em impressionar os moradores desarmados. Ainda assim, a milícia,
composta de policiais aposentados e da ativa, embora não tenha as melhores
armas, sabe que o ridículo a enfraquece.
Vimos fotos de tanques na Segunda Guerra,
na ocupação da Praça da Praça Celestial, na invasão soviética da antiga
Tchecoslováquia. Pessoalmente, estive perigosamente perto dos tanques sérvios
cobrindo a independência da Croácia.
Tanques fumegantes, no entanto, sempre dão
a ideia de que foram atingidos por um projétil e estão saindo de combate. Os
nossos são de fabricação austríaca, e o projétil que os atingiu não é
propriamente físico, mas sim a indigência mental bolsonarista que capturou
parte do comando militar.
Amigos que foram ministros da Defesa e
alguns generais que respeito continuam dizendo que as Forças Armadas não
embarcam numa aventura golpista.
Duvidei quando resolveram não punir
Pazuello por participar de um comício político. Sei que vão explicar um dia,
daqui a cem anos. Temo não estar vivo para conhecer a história.
Temo mais ainda ter de prolongar essa
discussão numa prisão militar e ouvir o argumento de que as Forças Armadas são
democráticas e nos encarceram apenas para nos proteger de Bolsonaro.
Mais ou menos cadeia a esta altura da vida
é irrelevante. O que dói é acreditar que construímos um país vulnerável. Não há
defesa nacional com a estupidez no comando.
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