sexta-feira, 29 de outubro de 2021

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

O risco maior

Folha de S. Paulo

Descrédito do teto e alta dos juros geram temor de que dívida do governo volte a crescer sem freio

Ao elevar a taxa básica de juros de 6,25% para 7,75% ao ano, o Banco Central anunciou que a economia brasileira será abatida pela onda mais agressiva de aperto monetário em quase duas décadas.

Pelo que se depreende da leitura do comunicado divulgado pela instituição nesta quarta-feira (27), pode ser ainda pior. A taxa Selic deve ir a pelo menos 9,25% em dezembro, com outro aumento de 1,5 ponto percentual.

Até esta semana, o ritmo de incremento era de 1 ponto, já em marcha forçada para conter a inflação, que surpreende desde o segundo trimestre. O passo pode ser acelerado ainda outra vez em caso de descontrole das expectativas econômicas.

O risco maior é de descrédito das normas que estipulam um limite para a despesa federal e que em certa medida contêm o crescimento da dívida pública. Jair Bolsonaro, com a aprovação de seu ministro da Economia, Paulo Guedes, trabalha pela revisão do teto de gastos.

O Banco Central deu a entender que não tem como certa a aprovação da emenda constitucional que aumenta o teto. A aceleração do ritmo da Selic agora seria apenas para conter o estrago já feito pelos planos irresponsáveis de Bolsonaro e Guedes.

Disseminou-se ainda mais a impressão de que nem mesmo regras inscritas na Constituição, como a do teto, reprimem o descuido com as contas públicas. Renovou-se o temor de que a dívida do governo volte a crescer sem freio, como entre 2014 e 2017.

A dívida federal aumentou de modo expressivo, mas em tese passageiro, durante a epidemia. A inflação mais alta do que se esperava elevou o custo de financiá-la, pois provocou aumento das taxas de juros. Agora, todos esses problemas se realimentam.

O choque inflacionário mundial continua, agravado pela desvalorização do real, em parte devida aos desatinos de Bolsonaro. O aumento de gastos e o desmonte do teto contribuem para piorar as expectativas inflacionárias. Tal degradação pressiona os juros e leva o BC a acelerar a Selic. A dívida aumenta e os juros altos encarecem ainda mais seu financiamento.

O governo deficitário não consegue nem ao menos pagar suas despesas básicas com a receita disponível. A conta de juros, não paga e cada vez maior, se acumula na pilha de dívidas. O passivo aumenta também em relação ao tamanho da economia, que deve permanecer estagnada em 2022.

Em resumo, é esse processo que gera temores de descontrole da dívida. Um limite crível para o gasto público, qualquer que seja sua versão, contribuiria para desanuviar o ambiente. Sem tal controle, resta a espiral que realimenta a degradação.

Ao relento

Folha de S. Paulo

Em busca de refúgio no Brasil, venezuelanos viram objeto de exploração eleitoreira por Bolsonaro

Embora goste de propagandear o apoio prestado pelo Brasil aos venezuelanos que fogem da catastrófica ditadura chavista, Jair Bolsonaro não se mostra muito preocupado com a dramática situação que milhares desses refugiados e migrantes enfrentam em Roraima.

Como se viu na sua recente viagem ao estado, quando visitou um centro de acolhida em Boa Vista, as atenções do presidente estão todas voltadas para as eleições de 2022, quando buscará novo mandato.

Diante das famílias ali abrigadas, Bolsonaro retomou sua pregação sobre uma fantasiosa ameaça socialista ao Brasil. Conforme a litania presidencial, uma vitória da esquerda no pleito do ano que vem poderá levar o país a um caos social e econômico similar ao vivido hoje pela Venezuela.

"A gente não quer isso para o nosso país", afirmou. "As escolhas erradas levam a isso", acrescentou, em meio a menções ao Foro de São Paulo, fantasmagoria recorrente no discurso do mandatário.

O objetivo de Bolsonaro com sua retórica é, claro, açular o sentimento antipetista que impulsionou sua candidatura na campanha de 2018. A repetição do estratagema, contudo, apenas trai um governante que tem pouco ou nada para mostrar além do descalabro engendrado nos últimos três anos.

Preterida pela fala do presidente, a situação dos venezuelanos em Roraima constitui uma crise humanitária que não pode ser ignorada.

Em Boa Vista, além dos mais de 6.700 refugiados que vivem nos abrigos da Operação Acolhida, liderada pelo Exército, existem cerca de 1.800 venezuelanos desabrigados, parte deles dormindo nas ruas da cidade, segundo a Organização Internacional de Migrações.

Na fronteira com a Venezuela, em Pacaraima, cidade que foi excluída do roteiro presidencial na última hora, o quadro é ainda mais preocupante. Nesse município de 18 mil habitantes, vivem 4.225 venezuelanos desabrigados, dos quais 2.330 pernoitam em calçadas e embaixo de marquises.

Os números escancaram a necessidade urgente de aumento das equipes e melhoria da estrutura de atendimento nos locais de abrigo.

A exploração politiqueira do sofrimento dos refugiados venezuelanos pode até se ajustar bem ao figurino do candidato à reeleição. Como presidente, compete a Bolsonaro a tarefa de fortalecer o programa de acolhimento em Roraima para que cumpra adequadamente seus objetivos humanitários.

Banco Central joga duro para tentar levar inflação à meta

O Estado de S. Paulo

Contra a crescente desordem dos preços, o Banco Central impõe, em suas palavras, uma política ‘ainda mais contracionista’

Para derrubar a inflação, o Banco Central (BC) poderá abater também a economia, eliminando a pouca expansão estimada pelos mais otimistas ou aprofundando a recessão esperada por grandes instituições do mercado para 2022. Ao elevar os juros básicos para 7,75%, o Copom, Comitê de Política Monetária da instituição, determinou uma alta de 1,5 ponto porcentual, a maior desde dezembro de 2002, quando a taxa passou de 22% para 25%. A ideia de manter algum estímulo ao crescimento já havia sido abandonada em reuniões anteriores. O objetivo, agora, é tentar levar a inflação à meta mesmo com grande perda para a atividade econômica.

A decisão anunciada no começo da noite de quarta-feira foi uma evidente reação a dois fatos. O primeiro, mencionado no informe divulgado logo depois da reunião do Copom, foi a forte aceleração da alta de preços nos últimos meses. Essa alta, segundo o texto, foi mais forte do que se esperava. O segundo, embora evidente, ficou apenas implícito no comunicado.

O novo aperto da política monetária é, no entanto, uma clara resposta à destruição do teto de gastos determinada pelo presidente Jair Bolsonaro e apoiada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. No comunicado há apenas uma referência, já presente em outros informes, aos perigos associados a “políticas fiscais de resposta à pandemia”.

A mensagem mais forte e inequívoca aparece em outro parágrafo. Segundo o Copom, o aperto monetário avançará “ainda mais no território contracionista”. Na ata publicada em setembro, depois da reunião periódica do Comitê, a palavra “contracionista” apareceu várias vezes. Na referência mais dramática, o ritmo de ajuste foi descrito como suficiente para atingir um “patamar significativamente contracionista” e levar a inflação à meta em 2022. Essa meta está fixada em 3,25%, mas as projeções correntes apontam um resultado superior a 4%.

Diante da acelerada alta de preços e da devastação das condições fiscais, o Copom, formado por dirigentes do BC, mostra disposição de cumprir, mesmo com elevado custo econômico no curto prazo, o compromisso formulado em agosto pelo presidente da instituição, Roberto Campos Neto. Nessa ocasião ele apontou como prioridade voltar a alcançar a meta a partir do próximo ano. O BC, assegurou, tem instrumentos para isso.

Com ou sem instrumentos suficientes para essa tarefa, o BC, neste momento, é a única entidade federal empenhada em evitar o desarranjo total do sistema de preços. O presidente mostra-se disposto a gastar o necessário, segundo seu juízo, para garantir sua reeleição em 2022. Tem a cumplicidade do ministro da Economia e, para buscar seus objetivos, terá de usar muito dinheiro, no caminho, para manter a fidelidade do Centrão.

Ao promover o desgoverno, o presidente compromete os fundamentos da economia, cria insegurança entre os investidores, afeta as expectativas em relação aos preços, desajusta o câmbio e realimenta a inflação, além de ampliar os entraves ao crescimento e ao emprego.

Esse comportamento poderá neutralizar boa parte do esforço do Copom para conter a alta de preços e conduzila à meta. A cada novo desmando, a cada palavra errada, os financiadores do Tesouro poderão cobrar mais caro. Ao mesmo tempo, o desarranjo cambial aumentará a inflação.

Sem meios para enquadrar Bolsonaro, o BC terá dificuldades, também, para cuidar dos efeitos de outros fatores inflacionários, como o encarecimento da energia, turbinado pela imprevidência das autoridades, e os desarranjos da cadeia global de produção e suprimento.

O Copom já indicou como provável, em sua reunião de dezembro, o acréscimo de mais 1,5 ponto à taxa básica de juros. Se isso se confirmar, essa taxa alcançará 9,25% antes do réveillon. Isso afetará o sistema de crédito, impondo uma nova freada aos negócios. As micro e pequenas empresas serão as mais afetadas, assim como os consumidores pobres. De novo, o custo maior das decisões tomadas em Brasília – nesse caso, numa tentativa de superação de problemas – irá para os mais vulneráveis.

O custo da paralisação de obras

O Estado de S. Paulo

Obras paradas custam caro. Com a pandemia, a retomada se mostra especialmente importante para estimular a economia e gerar empregos

Obras paradas multiplicam custos. Além do ônus para a sociedade de não receber os benefícios previstos no tempo previsto, a retomada impõe custos adicionais para remediar os desgastes, e a outra opção, o abandono, lança por água abaixo os recursos investidos até então.

Até o primeiro trimestre de 2021, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo identificou 1.156 obras paralisadas ou atrasadas no Estado, representando um total de quase R$ 25,5 bilhões contratados. As obras paralisadas somam 646 e as atrasadas, 510.

Deste total, 252 (21,8%) são relativas a obras em universidades, escolas e outros institutos de educação; 172 (14,8%) são de equipamentos urbanos, como praças e quadras; 111 (9%) na área de saúde; e 69 (6%) em vias urbanas. Além disso, há diversos atrasos e paralisações em ferrovias e metrôs, esgotamento sanitário e abastecimento de água ou segurança pública. Quase 85% das obras são de responsabilidade dos municípios, mas mais de 90% dos recursos investidos são do Estado, via convênios.

Um levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) de 2019 estimou que, dos mais de 38 mil contratos de obras da União, cerca de 14 mil (38%), perfazendo um total de R$ 144 bilhões, estavam paralisados.

As causas das paralisações e atrasos tanto em âmbito federal quanto regional são similares: falhas de projeto, indisponibilidade de recursos e disparidades entre os requisitos e procedimentos das partes dos convênios. Em linhas gerais, o TCU enfatiza a necessidade de melhor planejamento por parte das concessionárias e melhor triagem por parte do poder público. Entre as linhas de ação propostas pelo Tribunal estão o envolvimento da sociedade e partes interessadas no acompanhamento das obras públicas; mais transparência nos dados; a divulgação e premiação de iniciativas de sucesso; e a promoção de debates sobre o enfrentamento de problemas crônicos.

A consolidação dos dados é essencial. Em junho, o TCU alertou que, dos cerca de 38 mil contratos da União, mais de 11 mil obras “desapareceram” dos bancos de dados do governo federal, em especial do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um apagão estatístico gravíssimo.

Boa parte dos atrasos e paralisações deriva da falta de capacidade técnica, sobretudo dos municípios menores, de executar os projetos. Uma das estratégias para suprir esse déficit é promover consórcios entre os municípios e parcerias com o setor privado.

Vale lembrar que, no caso da União, por exemplo, cerca de 10% dos óbices se referem a objeções dos próprios Tribunais de Contas ou problemas jurídicos. Frequentemente, a lentidão dos órgãos públicos em encontrar soluções jurídicas razoáveis gera procrastinações e prejuízos. Uma ação coordenada do Judiciário para racionalizar a jurisprudência e padronizar procedimentos poderia mitigar muitos desses problemas.

Desde 2019 a Câmara dos Deputados conta com uma comissão para acompanhar a execução de obras inacabadas. É um modelo a ser emulado pelas Assembleias estaduais. No caso de São Paulo, em especial, o Tribunal de Contas disponibiliza o Painel de Obras Atrasadas ou Paralisadas e um aplicativo pelo qual os cidadãos podem denunciar irregularidades no emprego de recursos públicos. O Ministério da Economia e as Secretarias da Fazenda estaduais também poderiam contar com fóruns permanentes para avaliar as principais causas de paralisações e identificar soluções.

Os incontáveis esqueletos de concreto espalhados pelo País são verdadeiros monumentos à ineficiência e à irresponsabilidade do poder público. A paralisação das obras não apenas implica a falta de atendimento às demandas da sociedade e o desperdício de investimentos públicos, mas também a perda de oportunidades de emprego. Toda obra retomada implica algum estímulo à atividade econômica, dados os seus efeitos sobre outros segmentos, como o comércio. Ante a crise econômica e os impactos sobre o mercado de trabalho precipitados pela pandemia, a necessidade de retomar as obras paralisadas se tornou ainda mais premente.

BC dá recado ao governo com a alta dos juros

O Globo

A alta de 1,5 ponto percentual na taxa básica de juros — de 6,25% para 7,75% — foi a maior desde 2002 e recolocou o Brasil na incômoda posição de país com os maiores juros reais do planeta. A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) traz recados essenciais aos universos das finanças e da política, em particular ao Congresso e ao presidente Jair Bolsonaro.

Para o mercado financeiro, a mensagem é direta: a autoridade monetária não abandonou o objetivo de levar a inflação para perto da meta em 2022. Quem achava que o BC passaria a mirar somente em 2023 se enganou. Talvez não tenha sido uma alta tão robusta quanto alguns gostariam, mas o sentido é claro. Com autonomia garantida na Constituição, o BC se tornou a principal — senão única — trincheira de defesa do poder de compra da moeda.

Para o Congresso, o aumento serve de aviso. Caso os parlamentares comandados pelo Centrão aprovem o estouro do teto de gastos, serão responsáveis não apenas pela recessão que esta e futuras altas dos juros possivelmente provocarão, mas por muito mais. A perspectiva de que os parlamentares deem ao governo uma “licença para matar” o arcabouço que ordena o aumento das despesas públicas, tendo o controle do endividamento como norte, tem feito economistas voltarem a falar de conceitos que andavam esquecidos — todos eles usados para descrever situações dramáticas para o país.

Voltou a preocupá-los a “dominância fiscal”, condição em que a desconfiança nas contas públicas é tanta que os preços não reagem mais aos movimentos nos juros. Outro é a “insolvência”, a incapacidade do Estado de arcar com seus compromissos de pagamento. Em evento na terça-feira, Cassiana Fernandez, economista-chefe do banco J.P. Morgan, comentou que investidores voltaram a perguntar sobre a solvência da dívida brasileira. Está implícito nesse questionamento o medo de uma nova crise da dívida. Economistas ainda temem a ressurreição da “estagflação”, imagem usada para descrever a triste mistura de estagnação econômica e inflação alta, algo improvável, mas que a atual administração parece perseguir com suas ações desastradas.

A chance de que algum desses cenários venha a se materializar não é consenso. Mas o mero fato de terem voltado a povoar as conversas é grave. A base parlamentar que dá sustentação ao governo no Congresso tem o dever de não implodir o teto de gastos para autorizar o governo a pendurar o pagamento de dívidas sobre as quais já não há possibilidade de contestação na Justiça, os precatórios. Seria uma traição ao povo brasileiro abrir a porteira da gastança pública a um ano de uma eleição presidencial. A conta não demorará a chegar.

Para o governo Bolsonaro, a trajetória de alta nos juros traz uma mensagem que nada tem de novo, mas nem por isso deixa de ser verdadeira. É a lembrança de que não há política monetária que resista ao descontrole fiscal. Se Bolsonaro seguir adiante com o plano de deixar o BC sozinho lutando contra a alta de preços, corre até o risco de não disputar o segundo turno das eleições do ano que vem. Que ele é um populista com zero conhecimento de economia, é fato sabido. Se persistir na gastança, provará novamente que não tem um pingo de juízo.

Atitudes homofóbicas e racistas precisam ser banidas do esporte

O Globo

Ainda que sob pressão dos patrocinadores, fez bem o Minas Tênis Clube em reagir às declarações homofóbicas do jogador de vôlei Maurício Souza, impedindo que o preconceito saísse vitorioso. Na quarta-feira, diante da repercussão do caso, foi anunciada a rescisão do contrato com o atleta, que integra a seleção brasileira e disputou a Olimpíada de Tóquio.

No dia 12 de outubro, Maurício publicou no Instagram comentário em tom preconceituoso sobre anúncio feito pela DC Comics de que o novo Super-Homem, filho de Clark Kent, se assumiria bissexual. A peça era ilustrada por um beijo gay. “É só um desenho, não é nada demais. Vai nessa que vai ver onde vamos parar”, escreveu.

A mensagem causou indignação entre seus próprios pares. Em entrevista ao GLOBO, o técnico da equipe brasileira de vôlei, Renan Dal Zotto, disse que as portas estavam fechadas para Maurício: “Em se tratando de seleção brasileira, não tem espaço para profissionais homofóbicos”. Douglas Souza, companheiro de seleção e homossexual assumido, elogiou o desligamento: “Homofobia é crime, não opinião”.

Um exemplo de como essas atitudes descabidas ainda são tratadas com leniência pelos clubes é a própria sequência dos fatos. De início, o Minas decidiu afastar Maurício, multá-lo e exigir retratação. Os patrocinadores, Fiat e Gerdau, jogaram duro, e o clube acabou por anunciar, duas semanas depois da postagem, o desligamento do atleta.

Ao tentar fazer uma retratação mambembe, que embutia o próprio preconceito, Maurício invocou a liberdade de opinião. Numa rede social, o senador Flávio Bolsonaro repetiu o mesmo argumento e convocou seguidores a boicotar os patrocinadores do Minas Tênis. Não se deve confundir liberdade de expressão com licença para violar a lei e cometer delitos. Em junho de 2019, o STF equiparou as atitudes homofóbicas e transfóbicas ao crime de racismo, previsto na Lei 7.716/1989, com pena de um a cinco anos de prisão.

É lamentável que comportamentos homofóbicos e racistas continuem presentes em estádios, ginásios e arenas. Em agosto de 2019, na partida entre Vasco e São Paulo, em São Januário, torcedores vascaínos atacaram jogadores adversários com xingamentos homofóbicos. Fato raro, o árbitro interrompeu a partida e pediu que a torcida parasse, como passou a recomendar o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Não se devem mesmo aceitar essas atitudes lamentáveis.

De positivo, fica a reação veemente da sociedade. As paixões que envolvem os esportes não podem encobrir comportamentos irracionais, inadmissíveis em pleno século XXI. Atitudes racistas e homofóbicas precisam ser banidas. Ao mesmo tempo, o esporte necessita de mais nomes como os americanos Carl Nassib (futebol americano) e Jason Collins (basquete), o australiano Josh Cavallo (futebol), a brasileira Marta e o próprio Douglas — que tiveram a coragem de assumir a homossexualidade e dar exemplo na luta contra o preconceito que, infelizmente, ainda macula esportistas como Maurício.

Dólar e juros sobem após Copom aumentar a Selic

Valor Econômico

Bolsonaro ganhou uma base de apoio perdulária

O Banco Central não hesitou em aumentar para 1,5 ponto percentual o ritmo de ajuste da taxa de juros básica diante da evidente “deterioração no balanço de riscos e do aumento de suas projeções”. A magnitude da alta procurou fugir das interpretações de que o BC estaria sendo complacente diante dos efeitos da maior investida contra o teto de gastos até agora, sem, entretanto, validar um choque inusualmente forte, de 2 a 3 pontos percentuais. Os riscos fiscais, ou a ausência da âncora fiscal, estão no comando das perspectivas da autoridade monetária. Para o tamanho da instabilidade criada pelo furo do teto, o Copom abusou do eufemismo: “Os recentes questionamentos em relação ao arcabouço fiscal elevaram o risco de desancoragem das expectativas de inflação”, diz seu comunicado.

No dia seguinte ao aumento dos juros, que deverá empurrar a taxa Selic a dois dígitos logo no início de 2022, o dólar subiu bastante (1,25%), fechou a R$ 5,62, enquanto que as taxas de juros de médio prazo, entre 2023 e 2027, subiram até 0,8 ponto, algo diferente do que se seria de se esperar. O motivo, mais uma vez, estava nas pressões fiscais adicionais, que dirige as expectativas.

A PEC dos Precatórios (23/2021), que estabelece o calote de dívidas reconhecidas pela Justiça transitadas em julgado e o inscreve na Constituição, e que modifica o prazo de aplicação do indexador do teto de gastos, está enfrentando dificuldades na Câmara. Após passar pela Comissão Especial, sua votação foi adiada para 3 de novembro.

A resistência à PEC é uma boa nova, já que a proposta não tem nenhuma virtude. Abre R$ 94 bilhões de gastos fora do teto - com pagamento de R$ 400 para o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, R$ 15 bilhões para gastos variados, que poderão cobrir o auxílio aos caminhoneiros - e ainda deixa espaço para demanda de R$ 16 bilhões de emendas do relator e elevação de R$ 2 bilhões para R$ 5 bilhões do fundo eleitoral. Há mais: Refis previdenciário para os municípios e maior facilidade para fugir da regra de ouro mudando ritual de aprovação de créditos suplementares.

Isto tudo compõe os “questionamentos em relação ao arcabouço fiscal” mencionados pelo Copom. Ontem surgiu uma alternativa à PEC. Segundo o líder do Centrão e ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), se a emenda constitucional dos precatórios não for aprovada, o governo estenderá o auxílio emergencial, que não se limita aos atendidos pelo Bolsa Família e que expira no domingo. Ele seria feito por crédito extraordinário ou a decretação do estado de calamidade, ambas justificativas inadequadas para o caso, mas embaladas como resposta urgente a um drama social evidente nas ruas das grandes cidades.

A conta da extensão poderia chegar aos R$ 80 bilhões fora do teto, mas há diferença de fundo importantes, entre as duas propostas. A segunda evita que o calote seja inscrito na Constituição. Mas, como disse o presidente Jair Bolsonaro, “nada é tão ruim que não possa piorar”, os deputados ainda buscam uma saída para o fim do auxílio emergencial, com caminho parecido ao indicado por Nogueira. Se a PEC dos precatórios não passar, o teto é remendado e segue em frente. Mas é possível que o Centrão jogue nas duas medidas, pois precisa das emendas do relator e do grande esticão nos recursos do fundo eleitoral.

As pressões sobre os juros decorrentes das incertezas fiscais e o aumento da Selic elevam o custo do endividamento público, embora sejam armas contra a inflação. Mas desde as primeiras badernas autoritárias de Bolsonaro é o avanço do dólar um dos principais impulsos à inflação e é provável que o câmbio continue muito instável agora e mais à frente, diante do futuro imprevisível de uma eleição presidencial de início polarizada. A coincidência do calendário eleitoral com o início do aperto da política monetária nos EUA é desfavorável ao trabalho do BC.

Alguma estabilidade no câmbio e nos preços das commodities podem ajudar a inflação a ceder, mas não são muito prováveis no curto prazo. Sobra o aumento de juros, que retirará ritmo de uma economia já com baixo fôlego. Com todos seus condicionantes, o BC deixou claro que irá até onde for preciso para reduzir a inflação, mas com cautela para evitar ‘overshootings’. O custo da aliança eleitoral de Bolsonaro para o país será alto. Ficou para trás, como mais uma das tolices da análise política, a tese de que, com o Centrão ao lado do presidente, seria mais fácil aprovar as reformas. Bolsonaro ganhou uma base de apoio perdulária.

 

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