O Estado de S. Paulo
Oscilações na interpretação das regras
aumenta a desconfiança no Poder Judiciário
Ao longo dos últimos anos o Brasil tem
vivido uma verdadeira montanha russa com idas e vindas em decisões judiciais
controversas, especialmente relacionadas a casos de corrupção.
O começo do cumprimento da pena,
inicialmente admissível apenas após o trânsito em julgado, tornou-se possível
depois de uma condenação em segunda instância, mas, recentemente, retornou ao
trânsito em julgado; as condenações de Lula, Eduardo Cunha e Henrique
Eduardo Alves foram anuladas; os crimes de corrupção associados a
caixa dois, antes de competência da justiça criminal, são agora da justiça
eleitoral; o compartilhamento de dados bancários e fiscais do Coaf e da Receita
com a PF e MP passou a depender de prévia autorização judicial, etc.
Como confiar na Justiça diante de tamanha oscilação das suas próprias decisões? O ambiente de polarização política tem piorado ainda mais essa situação, pois a confiança das pessoas nas decisões judiciais não é livre de viés. Ou seja, a aparente racionalidade das pessoas para confiar ou não na Justiça pode ser motivada pela congruência da sua ideologia com a do acusado.
Será que a Justiça só seria justa e
confiável quando punisse um desafeto, mas injusta e não confiável quando
punisse o líder que ama?
Junto com os colegas da FGV André
Klevenhusen e Lúcia Barros, fiz uma pesquisa de opinião experimental para
investigar o papel da ideologia na confiança na Justiça em casos de corrupção.
Os resultados mostram que eleitores que
possuem ideologia divergente da do candidato condenado apresentam níveis
inalterados de confiança nas decisões judiciais. Este padrão se verificou em cenários
de congruência (o candidato rejeitado é condenado) e indiferença (nem o
candidato preferido nem o rejeitado são condenados) em relação aos veredictos
da Justiça. No entanto, quando o candidato congruente com a ideologia do
eleitor é condenado, a confiança no sistema de justiça diminuiu.
Os eleitores consideram os tribunais uma
instituição imparcial para punir corruptos apenas quando seu candidato
preferido não é o réu. Independentemente da volatilidade das decisões da
Justiça, o eleitor já tem uma tendência de desconfiar dela quando ela causa
dano ao objeto do seu afeto. Essa percepção tenderia a se potencializar se as
decisões judiciais continuarem a apresentar esse perfil errático em curtos
intervalos de tempo. Afinal de contas, a Justiça não pode ser um árbitro
confiável, como é esperado em democracias, se as instâncias uniformizadoras
superiores não forem vistas como consistentes e estáveis.
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