Folha de S. Paulo
Não é simples aceitar que metade do
empresariado veste-se mentalmente de papagaio
Difícil saber se mais impressionantes foram
as pesquisas Ipec e Datafolha,
duas bombas com intervalo de 48 horas, ou as explosões de excitação que
disseminaram entre a euforia e o aturdimento, o alívio e o susto. Dos próprios
pré-canditatos não pôde sair recepção diferente, com certeza. O que faz
esperáveis, para breve, modificações em várias campanhas e, daí, na
configuração da disputa de Bolsonaro para baixo.
Os dados mais eloquentes das
pesquisas cabem
ao ex-presidente Lula e os
mais críticos são de Moro, em inversão da adversidade que o perseguidor
impôs ao perseguido no frente-a-frente anterior. O dado mais forte, igual nas
duas pesquisas, está nas citações espontâneas, em que o eleitor menciona o
preferido sem consultar a lista oferecida. Moro tem aí a preferência de não
mais do que 2%. Situação pouco observada e, no entanto, acachapante para alguém
tão conhecido (por 88%, no Datafolha) e celebrado pela imprensa e a TV.
Se também nos seus domínios ideológicos, os
estados do Sul, o melhor índice de Moro foi o de 13% gaúchos, nisso Doria
encontrou esperanças e Bolsonaro achou mais uma ilusão. As duas pesquisas
pulverizaram a convicção generalizada de que o Sul seria absoluto pró-Moro.
Ainda poderá ser, mas à custa de empenhos que outros também poderão fazer,
Doria em particular.
A compaixão pelo país permite arriscar que, entre os 47% de empresários da ultradireita, não faltem abalados pelas pesquisas. Não é simples aceitar que metade do empresariado veste-se mentalmente de papagaio como Luciano Hang. É o sectarismo incapaz até da memória, ou da honestidade, de reconhecer os ganhos de todo o empresariado com a melhoria da vida em geral no governo Lula, razão dos extraordinários 82% de aprovação ao fim do mandato.
A própria queda de Bolsonaro lhe acarretará
mais queda ou, ao menos, ainda maior dificuldade de recuperação estável. Os
bilhões do "auxílio" e outros bilhões podem lhe dar ganhos
transitórios, a evaporarem na economia de Paulo Guedes. Como toda decepção tem
seu custo, e a causada por Moro foi grande, as pesquisas lhe trouxeram problema
duplo. Um, é obter programa e discurso que atraiam atenção, em vez de
repetições tediosas. O outro é subir com rapidez, antes que, desacreditado, seu
potencial se desloque. Doria espera, nos arranjos da campanha que promete
barulho.
Não só por precipitação é incabível a
ideia, originária do meio acadêmico, de que a eleição presidencial "é um
plebiscito entre Bolsonaro e Lula". Esse confronto já está resolvido, em
todos os planos. De tudo, neste momento de preliminares e não de conclusões,
ficam a atenção lúcida do povão sobre Bolsonaro e mais uma demonstração da
vitalidade política de Lula, em seu quarto reerguimento depois de alvejado por
cercos destinados a eliminá-lo.
Inauguração
Foi de seis horas o tempo decorrido da
entrevista de Ciro Gomes a Roberto D’Ávila, forte e farta, até
a entrada da Polícia Federal na casa do pré-candidato. E de oito anos o
intervalo do episódio alegado pela PF até a busca na casa.
Ciro Gomes e sua longa reputação de
probidade estão submetidos a uma situação em que tudo está fora dos padrões.
Ainda mais por se tratar de pré-candidato à Presidência, a conduta da PF foi
agressiva também com a opinião pública, faltando-lhe com a explicação
necessária. Ou não podia dá-la, o que é pior e provável.
À parte a razão alegada pela PF e pelo juiz
Danilo de Almeida, foi o primeiro ato de anormalidade (também) eleitoral.
Nenhum comentário:
Postar um comentário