Folha de S. Paulo
Não se pode dizer que ele não tem senso de
oportunidade política
Se há um defeito que não pode ser atribuído
a Luiz Inácio
Lula da Silva é o de não ter senso de oportunidade política. Ele,
afinal, sobreviveu ao mensalão e ao petrolão —escândalos que teriam encerrado
carreiras mais normais— e agora disputa como franco favorito a sucessão
de Jair
Bolsonaro. Lula decerto comete erros, mas não os muito elementares. Se
você, leitor, acha que o ex-presidente está metendo os pés pelas mãos, o mais
provável é que ele esteja raciocinado duas ou três casas à sua frente.
Num mundo ideal, candidatos a cargos públicos explicitariam sem reservas suas ideias sobre os grandes temas e anunciariam o mais cedo possível seus programas de governo, que teriam conteúdo empírico, não apenas palavras bonitas. Não vivemos nesse mundo ideal. Isso significa que Lula vai não apenas tentar prolongar por mais alguns meses o suspense em relação a suas propostas como também deverá ensaiar outros flertes com posições mais à esquerda.
É tudo uma questão de "timing". O
cenário ideal para o ex-presidente é enfrentar um Bolsonaro debilitado, pelas
múltiplas ruindades de seu governo e pelo fraco
desempenho da economia. Se Lula começa desde já a trabalhar para garantir a
governabilidade e tranquilizar os mercados, inflação e juros podem cair, o que
beneficiaria seu rival. Se, ao contrário, faz acenos a bandeiras de que a Faria
Lima não gosta, põe uma pressão que atrapalha o governo. É claro que, mais para
a frente, a partir de maio ou junho, digamos, será de seu interesse fazer
anúncios que evitem a piora de indicadores, já que são grandes as chances de
ele vencer, hipótese em que herdará as encrencas que possa criar.
Outras vantagens da ambiguidade incluem
ganhar tempo para negociar as alianças com as quais pretende governar e a
possibilidade distribuir um ou outro agrado para a base de eleitores mais à
esquerda. Em algum momento Lula irá decepcioná-los.
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