Folha de S. Paulo
Políticas de proteção social precisam
considerar o espectro da crise ambiental
A tragédia
de Petrópolis veio repetir uma verdade para além de sabida: os mais
pobres serão sempre as primeiras e principais vítimas da natureza em transe,
com o notório dar de ombros das grandes empresas, como sucedeu em Mariana e
Brumadinho; a negligência dos governantes; ou o seu misto de desinteresse e
incapacidade de disciplinar a ocupação urbana.
Como secas calcinantes ou dilúvios bíblicos, incêndios ou inundações, desmoronamentos ruinosos ou marés gigantescas, pandemias, rompimentos de barragens ou vazamentos de petróleo, catástrofes ambientais —a maioria decorrente do aquecimento do planeta— passaram a fazer parte do novo normal.
Eis por que especialistas em mudanças climáticas chamam a atenção para duas estratégias igualmente cruciais: mitigação e adaptação. No primeiro caso, trata-se de estabelecer e cumprir compromissos com iniciativas para reduzir as emissões de carbono a fim de impedir o crescimento descontrolado da temperatura terrestre.
Na segunda frente, a meta é adaptar as
sociedades criando resiliência aos riscos que as mudanças já em curso tornaram
inevitáveis, mesmo que a mitigação tenha êxito e seja possível limitar o
aumento da temperatura a 1,5°C —definido no Acordo de Paris de 2013.
Graças à mobilização das forças organizadas
na sociedade brasileira e no sistema político e à vigorosa pressão
internacional, apesar da fronda da treva instalada no Planalto, o debate
público sobre a questão avançou. Salvo em face da adaptação aos riscos
climáticos, praticamente ausente do radar nacional.
Em países iníquos como este, iniciativas de
adaptação precisam andar de mãos dadas com políticas sociais para dar certo.
Tanto as destinadas a garantir rendimentos mínimos, prover seguro social ou
atendimento à saúde, quanto as relacionadas ao direito de moradia e acesso à
infraestrutura urbana.
Políticas de proteção social são formas de intervenção para reduzir os riscos
associados ao funcionamento falho dos mercados e às adversidades do ciclo da
vida. Nas condições atuais, precisam tomar em consideração o espectro da crise
ambiental.
Para fins eleitorais, é legítimo invocar um
passado recente em que os pobres se beneficiaram de políticas de forte
compromisso social. Sobretudo agora, quando o adversário é de uma indiferença
atroz às necessidades e aspirações dos mais frágeis. Mas a reconstrução
progressista do país devastado pelo atual desgoverno demandará políticas
sociais inovadoras —vertebradas pela ideia de justiça ambiental e atentas aos
desafios de uma adaptação equitativa às ameaças climáticas.
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