O Globo
Já era previsível que Jair Bolsonaro fosse
experimentar uma melhora em seus índices de intenções de voto e de avaliação do
governo.
O leitor desta coluna há de lembrar que
escrevi, em 23 de fevereiro, que o presidente se beneficiaria da entrada dos
profissionais no comando de sua campanha e da entrada de dinheiro do Auxílio
Brasil nas contas dos mais necessitados para dar um salto. E que os riscos que corria
de ver estancada essa esperada melhora eram a inflação fora de controle e a
rejeição quase impeditiva de uma reeleição.
Os números do Datafolha mostram que
Bolsonaro ganhou pontos entre os mais pobres e no Nordeste, reduzindo sua
distância para Lula no segmento e na região em que o petista vai melhor. Num
país em que a desigualdade e a pobreza só cresceram, a injeção de recursos do
Orçamento ainda é um poderoso cabo eleitoral.
Além disso, o silenciamento das atrocidades ditas por Bolsonaro no curso da pandemia, operado pelos profissionais da política, fez com que a classe média que elegeu o capitão em 2018 perdesse a vergonha de sair do armário. E aqui entra um fenômeno de duas mãos importante de analisar: o salto alto que acometeu o entorno de Lula desde que suas condenações nos processos derivados da Lava-Jato foram anuladas.
O que se seguiu àquele momento foi uma
euforia narrativa que incluiu desde a exigência de retratação de todos aqueles
que apontaram casos de corrupção nos governos petistas até a difusão de uma
praticamente certa vitória de Lula no primeiro turno.
Os que diziam procurar por uma alternativa
à polarização Lula e Bolsonaro eram apontados praticamente como cúmplices dos
desmandos do bolsonarismo.
O PT e os aliados do ex-presidente se
perderam num duelo com o ex-juiz Sergio Moro, que nunca chegou a decolar, e
deixaram Bolsonaro correr meio sem combate em todo o período posterior à CPI da
Covid.
Tanto que iniciativas como o calote em
precatórios e a criação do Auxílio Brasil, que certamente reverteriam em
recuperação do presidente de seu pior momento nas pesquisas, contaram com o
aval da oposição, que ainda silenciou sobre o orçamento secreto, o mais
poderoso instrumento de injeção de recursos em bolsões de aliados políticos já
criado pelo Congresso.
Tanta certeza na vitória de Lula se
amparava na crença de que os desmandos de Bolsonaro em relação às instituições,
o engodo liberal que ele vendeu em 2018 e a condução criminosa do país na
emergência sanitária haviam afastado definitivamente a classe média do
presidente.
Isso, com a revisão das condenações da
Lava-Jato operada pelo STF, depois confirmada em cascata por outras instâncias
da Justiça, bastaria para que o conjunto da sociedade concluísse que Lula e o
PT foram vítimas de um golpe de 2016 em diante.
Acontece que a superação do pior momento da
pandemia parece ter apagado cedo demais da mente de uma parcela do eleitorado
de média e alta renda as atrocidades cometidas em três anos e três meses de uma
gestão marcada única e exclusivamente por retrocessos —mesmo nas áreas de
interesse dessa elite mais egoísta, como a imagem do país no exterior, a
previsibilidade fiscal e os demais indicadores econômicos.
O Datafolha agora mostra, em números, que
havia um antipetismo escondido no armário junto ao bolsonarismo renitente e que
ambos foram retirados de lá mais ou menos no momento em que esse eleitor foi
autorizado a guardar a máscara na gaveta. Mais de uma máscara foi arrancada,
portanto.
Para que a vantagem de Lula sobre Bolsonaro não se estreite ainda mais, o PT tem de engendrar um discurso econômico e político que funcione de antídoto ao antipetismo que Bolsonaro espertamente voltou a explorar — outra contribuição do Centrão à condução até então tresloucada de sua campanha por parte de seus filhos e de seus apoiadores mais fanatizados.
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