O Estado de S. Paulo
O aumento do piso dificultará o acesso de mais famílias que poderiam ter direito ao Auxílio Brasil
A decisão do presidente Jair Bolsonaro de
subir o valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 não acaba com a demanda
reprimida de milhões de famílias que estão esperando na fila e “na fila da
fila” para terem acesso ao benefício social de transferência de renda do
governo federal.
Mapeamento feito pela Confederação Nacional
de Municípios (CNM), e publicado pelo Estadão no domingo passado com grande
repercussão nacional, mostrou que o contingente de famílias na fila estava em
2,8 milhões em abril.
No caminho contrário, a PEC “do desespero eleitoral”, como foi batizada por técnicos da área econômica, deve estimular ainda mais pessoas que moram juntas a se cadastrar individualmente para receber o piso do benefício.
Uma família “dividida” pode conseguir R$
800. Se o piso do benefício aumentar para R$ 600, o valor sobe para R$ 1,2 mil.
Além de exigir um reforço de R$ 21,6 bilhões de orçamento para o Auxílio
Brasil, o aumento do piso dificultará o acesso de mais famílias com perfil hoje
de renda para ter direito ao benefício.
O problema foi apontado, no início do mês,
por quatro experientes especialistas da área social.
Com a bagagem adquirida na gestão do
Cadastro Único de Programas Sociais (Cadúnico), Letícia Bartholo, Lúcia
Modesto, Ellen Sampaio e Joana Mostafa alertaram em artigo que a distorção
permite que um beneficiário morando sozinho receba o mesmo valor que uma mãe
solo com dois filhos pequenos.
Para as quatro especialistas, esse
“desmembramento” de famílias prejudica a qualidade dos dados do cadastro e, com
isso, sua capacidade de direcionar as políticas públicas à população mais
vulnerável.
Ao invés de melhorar o desenho do programa,
o governo vai acentuar os problemas num quadro em que nem todos os benefícios
complementares criados com o Auxílio Brasil saíram do papel.
Diretora da Rede Brasileira de Renda
Básica, Paola Carvalho destaca que, sem zerar a fila, o impacto será reduzido.
Fora a fila para entrar na fila. Muitas famílias relataram que aguardam cinco
meses para fazer o registro no Cadastro Único e, então, entrar na fila.
Bolsonaro e aliados bancaram os R$ 600
porque esperam ganhar apoio com o aumento do valor mínimo do benefício nas
eleições. Esse é o valor mágico da primeira rodada do auxílio emergencial
durante a pandemia, quando o presidente conseguiu melhorar a sua popularidade.
Ele quer repetir esse cenário faltando poucos meses para as eleições. Além da
inflação adicional contratada, mais difícil será corrigir essas distorções a
partir de 2023.
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