sábado, 25 de junho de 2022

João Gabriel de Lima*: As leis avançam contra a mentira

O Estado de S. Paulo

Uma brigada jurídica para combater as fake news é essencial em ano eleitoral

Uma pesquisa mostrou que a média de QI vem caindo na França. O grupo extremista português O Bom Europeu usou essa notícia real para cunhar uma fake news racista, xenófoba e ultrajante: a média estaria sendo puxada para baixo por imigrantes africanos. Segundo o sociólogo político Gabriel Guimarães, estudioso do fenômeno, O Bom Europeu se inspira em Jared Taylor, guru da extrema direita americana. Banido do Facebook, o grupo foi parar no Telegram – que, no Velho Continente, tornou-se latrina de fake news e discursos de ódio.

Como lidar juridicamente com os que espalham mentiras nas redes sociais? A era digital criou desafios para o mundo do Direito, e alguns desses desafios serão discutidos no Fórum Jurídico de Lisboa, que começa na segunda-feira 27. “É preciso enfrentar essas questões e, ao mesmo tempo, manter a liberdade e a vitalidade da internet”, diz o ministro Gilmar Mendes, um dos participantes do fórum. Ele é o entrevistado no minipodcast da semana.

O debate sobre o direito digital vem avançando na Europa, puxado pela Alemanha, país onde as plataformas digitais já são responsabilizadas pelos conteúdos que publicam. Na área da desinformação, infelizmente, o Brasil ainda está bastante atrasado. O Marco Civil aprovado em 2014 ficou obsoleto diante da evolução tecnológica.

“No Brasil, a plataforma digital só é responsabilizada após descumprimento de decisão judicial – e a Justiça, como sabemos, é lenta”, diz Ricardo Campos, professor da Universidade Goethe, de Frankfurt, e um dos maiores especialistas brasileiros na área. “A lei alemã (Netzdg) e o novo regulamento europeu Digital Services Act (DSA) preveem mecanismos mais modernos e eficientes para o combate de discurso de ódio e fake news.”

Os desafios do Direito na era digital se estendem também à proteção de dados, de maneira, por exemplo, a evitar a discriminação dos cidadãos. Ricardo Campos cita um caso hipotético em que convênios médicos rejeitariam pacientes ao ter acesso indiscriminado a seus prontuários – que são informações privadas. Nesta área, felizmente, o Brasil está mais avançado. O regulamento europeu que entrou em vigor em 2018 inspirou fortemente a lei brasileira de 2019.

A programação do Fórum Jurídico de Lisboa terá vários brasileiros, incluindo cinco integrantes do Supremo Tribunal Federal. Além de Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, André Mendonça e Alexandre de Moraes. Que das discussões resulte uma brigada jurídica para combater as fake news – essencial para que, em ano eleitoral, os brasileiros decidam com base em informações e não em mentiras.

*Escritor, professor da Faap e doutorando em ciência política na Universidade de Lisboa

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

O telegram virou curral da extrema-direita.