A mais tensa e importante eleição das últimas décadas se aproxima. E o cenário é turvo e carregado de incertezas. Um caminhão de dúvidas nos assalta. São desafios ciclópicos à nossa frente. E uma nuvem cinzenta faz parecer que o problema está nas urnas eletrônicas, na tornozeleira do irrelevante deputado ou na presença de algum ministro no STF.
Estamos banalizando informações como as que
batemos os tristes recordes com 33 milhões brasileiros passando fome e 23
milhões deles vivendo abaixo da linha da pobreza, com sete reais por dia. Perdemos
mais de 670 mil vidas para a COVID, numa desproporção incômoda, já que temos
2,7% da população mundial e 10,6% das mortes. Assistimos perplexos e tristes o
brutal assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips
pelas mãos das milícias da selva do garimpo ilegal. Aparentemente, a cidadania
brasileira se encontra exausta e inerte, deixando obscurecida sua capacidade de
se indignar, ver, julgar e agir.
A Eletrobrás é privatizada - nada contra -
mas dentro de modelo equivocado que onerará a conta de luz dos brasileiros nos
próximos anos. E o fruto da venda da maior empresa elétrica da América Latina
será enterrado numa equivocada, provisória e questionável política eleitoreira
de subsídios aos combustíveis, ao invés de gerar soluções permanentes para o
endividamento público ou a previdência, o que equivale a vender fogão e
geladeira para comprar comida, vender o carro para comprar gasolina.
A estabilidade política, constitucional,
legal e regulatória é elemento central para a retomada dos investimentos, do
crescimento e do emprego. No entanto, o Congresso Nacional não demonstra
sensibilidade para este princípio basilar. A absurda proposta de emenda à
Constituição, estabelecendo que o Poder Legislativo poderá revogar decisões do
Supremo Tribunal Federal nos casos em não houver unanimidade, é trágica por sua
“originalidade”, espírito antirrepublicano e afronta às instituições.
Todo esse conturbado e preocupante enredo
povoa o ambiente da pré-campanha e revela a precariedade do diagnóstico do
sistema político sobre a gravidade da crise. Há anos estamos olhando para o
Brasil e vendo um copo meio cheio meio vazio. Avançamos na consolidação da
democracia, na superação da inflação, na construção do SUS e no ataque inicial
à pobreza, mas ainda temos metade da população sem coleta de esgoto,
comunidades inteiras sequestradas pelo tráfico e pelas milicias, desempenho
sofrível nas avaliações do aprendizado de crianças e jovens, fome e miséria a
olhos vistos.
Tomara que a campanha aprofunde o debate que
interessa à população. A mediocridade atual não nos levará ao futuro que
sonhamos.
*Marcus Pestana, economista, Presidente do
Conselho Curador ITV – Instituto Teotônio Vilela (PSDB)
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