O Estado de S. Paulo
A economia de bairrismo é frágil e desprestigia uma força do Estado: sua vocação cosmopolita
O governador Rodrigo Garcia deu vazão no
último mês a um mito popular em São Paulo e no Sul. Garcia passou a incluir nas
suas falas o argumento de que São Paulo paga impostos demais para sustentar
Estados pobres – como Maranhão, Piauí e Acre –, recebendo de Brasília pouco em
troca: “15 vezes menos do que a gente manda. SP está virando burro de carga do
Brasil”. É um mito.
Precisamos entender o que é contabilizado
na conta do argumento como recebimento dos Estados. Normalmente, apenas
transferências diretas como as do Fundo de Participação
dos Estados, que de fato prioriza regiões mais pobres. Mas a conta ignora dois valores importantes que a União gasta mais com Estados mais ricos.
Um é o quanto a União deixa em pagamento de
benefícios previdenciários e trabalhistas – que são mais escassos em áreas
pobres onde há pouco emprego formal. Essa omissão no argumento é importante
principalmente para os Estados do Sul, que pagam menos do que levam desse
arranjo.
O segundo valor ignorado é o das renúncias fiscais, o quanto a União abre mão de arrecadar em tributos federais. São “gastos indiretos” em que São Paulo é líder no País, mesmo quando considerada a sua participação no PIB ou no número de habitantes. Também chamados de “gastos tributários”, este montante nem sequer considera a isenção no IR para lucros e dividendos, que também beneficia mais a elite de SP.
Há ainda outras questões, fora das contas
públicas, para se considerar. Para que serve a Federação para São Paulo, ou
para os Estados do Sul? Estados do Norte e do Nordeste fornecem aos mais ricos
um mercado consumidor protegido (não podem impor tarifas de importação nem
fechar acordos de livre comércio com outras áreas), serviços ambientais (como
as chuvas geradas na Amazônia) e proteção territorial – além de mão de obra.
Um exemplo anedótico do potencial de
“exportação” de capital humano das regiões pobres é o caso do ITA – instituição
que teve quase metade das vagas nos últimos anos preenchidas por cearenses. Boa
parte se torna profissional de alta produtividade que contribui para o PIB das
áreas mais ricas, apesar de o custo da formação inicial desse capital humano
ter sido suportado por uma sociedade pobre.
Na verdade, nem sequer é exclusiva do Brasil a concentração da atividade econômica no território (pense em Argentina e Portugal, ou Coreia do Sul e Inglaterra). A economia de bairrismo é uma construção intelectualmente frágil, que desprestigia uma das forças do Estado: sua vocação cosmopolita.
Um comentário:
Pensei que o artigo fosse sobre Bolsonaro,li o título rapidamente,rs.
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