Valor Econômico
Outra aposta em semicondutores também
fracassou
Decreto assinado pelo presidente Lula e
publicado no “Diário Oficial da União”, no dia 8 de fevereiro, criou um grupo
de trabalho para estudar “a reversão do processo de desestatização e liquidação
do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A (Ceitec)”. Com sede em
Porto Alegre, a Ceitec foi criada em 2008, no segundo mandato de Lula, para ser
uma fábrica de semicondutores que colocasse o país na rota do desenvolvimento
tecnológico
Com orçamento dependente do Tesouro, que
nesse período repassou para a empresa mais de R$ 900 milhões, a Ceitec ficou
conhecida por ter produzido um chip de monitoramento de gado. Razão pela qual
ganhou notoriedade como a “estatal do chip boi”.
O governo passado tentou privatizar a companhia, mas não encontrou interessados e, então, decidiu liquidá-la. O Tribunal de Contas da União (TCU), porém, em 2021 interrompeu o processo de fechamento da empresa, iniciado no ano anterior, por considerar o setor em que ela atua estratégico. O TCU, no entanto, não concluiu o julgamento do caso.
“É inconcebível que a gente desmonte aquilo
que é a nata da inovação no mundo. Vamos definir claramente o papel e a missão
da Ceitec para recompormos a política nacional de semicondutores, que é
estratégica para a soberania nacional”, disse Luciana Santos, ministra da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), por ocasião da publicação do decreto nº
11.409. A criação do grupo de trabalho, segundo o ministério, marca o início do
processo de atualização da política nacional de semicondutores.
Sob a coordenação do MCTI, ao qual é
vinculada a Ceitec, o grupo de trabalho terá a participação de representantes
da Casa Civil e dos ministérios da Fazenda, Gestão e Inovação e Desenvolvimento,
Indústria Comércio e Serviços, além da Advocacia-Geral da União. O grupo terá
120 dias de prazo, prorrogável por tempo determinado, para apresentar os
resultados dos estudos e projetos sobre a empresa.
Afinal, trata-se da única empresa, na
América Latina, capaz de desenvolver um chip da concepção à sua aplicação
final.
Uma segunda tentativa de incursão pelo
mundo dos semicondutores ocorreu em 2012, quando foi anunciada a construção de
uma fábrica em Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte
(MG) que deveria estar pronta e em operação em três anos, conforme o cronograma
da época.
Idealizada, em 2005 por Wolfgang Sauer,
ex-presidente da Volkswagen do Brasil, que era um de seus acionistas. Eike
Batista entrou como sócio, junto com o BNDES, e a vendeu para o grupo argentino
Corporación América em 2014, logo depois do escândalo que o levou à falência.
Foi daí que surgiu o nome Unitec para a empresa de chips de Minas Gerais, o
mesmo da companhia da Corporación América na Argentina. Quando estava nas mãos
de Eike, o seu nome era SIX.
Com investimento de mais de R$ 1,2 bilhão,
os dois principais acionistas da Unitec, hoje, são o BNDES e a empresa
argentina, cada um com 33% de participação. Como minoritários têm o BDMG (Banco
de Desenvolvimento de Minas Gerais) e as empresas Intecs e Matec. Para o BNDES
o negócio transformou-se em uma tremenda dor de cabeça, pois, além de
acionista, ele financiou o empreendimento.
A situação piorou bastante quando, em 2019,
a IBM, dona de 18,8% das ações da Unitec e provedora de tecnologia, vendeu sua
operação global de semicondutores e abandonou o projeto daqui - o comprador não
se interessou pela fábrica de Ribeirão das Neves. A empresa local está em
recuperação judicial e acumula dívidas trabalhistas e tributárias de R$ 600
milhões.
Diante da crise que a pandemia produziu na
indústria de chips, cuja escassez provocou paralisação da produção em várias
fábricas no mundo, sobretudo de veículos, um grupo de empresários do setor
automobilístico do Brasil foi a Tóquio no segundo semestre do ano passado para
conversar com duas grandes empresas fabricantes de semicondutores e lhes
oferecer a Unitec.
O uso das instalações já prontas da
companhia de Minas Gerais anteciparia em dois anos o início da produção de
chips - enquanto que construir uma fábrica demora cerca de quatro anos -, além
de o Brasil ter um mercado de tamanho atrativo, argumentaram os brasileiros a
seus interlocutores japoneses. Só a indústria doméstica de veículos deve
demandar cerca de 4 bilhões de chips por ano. E o uso dos chips vai aumentar
substancialmente com o uso do 5G, da internet das coisas e com a chegada dos
carros elétricos. Os japoneses pediram mais informações e ficaram de continuar
a conversa.
No mundo há 29 fábricas em construção,
principalmente na Ásia. Se o Brasil não entrar nessa onda, vai ficar muito
atrasado. O que não é aconselhável é se habilitar com projetos que
representaram fracassos retumbantes.
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