sexta-feira, 28 de abril de 2023

Claudia Safatle - Sucesso da política fiscal depende do crescimento

Valor Econômico

Execução, no dia a dia, que vai atestar eficiência do novo arcabouço

“O arcabouço fiscal só fica em pé com crescimento da economia”, diz Joaquim Levy, ex-ministro da Fazenda e diretor de Estratégia Econômica e Relações com Mercados do banco Safra. Essa avaliação é compartilhada pelo setor financeiro e foi reiterada ontem pelo presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Isaac Sidney, durante debate sobre taxa de juros no Congresso.

“Vamos ter que ter um plano [de investimento]. Temos que ter uma conversa de adulto. Acabou o ‘fiscalismo mágico’”, segundo Levy, que se dedica a rastrear setores que possam funcionar como motores do crescimento da economia. Os agentes econômicos vão ter que batalhar e a conta terá que ser dividida de forma mais equânime e não imputada sobre quem ganha salário mínimo.

Levy aponta alguns setores como possíveis motores do crescimento, em artigo publicado na edição desta quinta-feira, 27, do Valor.“A transição verde pode alavancar o investimento nas energias renováveis e os biocombustíveis, estes em parceria com a eletrificação da mobilidade e com derivados do dendê para a aviação mundial,” diz ele.

“O arcabouço fiscal poderá ter maior sucesso, portanto, se for acompanhado por outro ‘arcabouço’ que permita desenvolver de maneira coordenada e fiscalmente eficiente as possibilidades globais da economia de baixo carbono no Brasil, o que estimulará o investimento em inúmeras outras áreas, acelerando nosso PIB”, sugere.

Esse é um caminho para “robustecer o arcabouço fiscal e afastar o risco de que as demandas de gastos e a reticência à tributação venham a ser acomodadas via inflação”, conclui Levy.

Ao Estado caberá garantir condições para que o investidor tome o risco. Seja a estabilidade macroeconômica, com taxas de inflação sob controle e taxa de juros mais baixas, seja a segurança jurídica e previsibilidade, dentre outras. Caberá, ainda, segundo o ex-ministro, ter planejamento e definições políticas porque essa é uma área que “envolve investimentos vultosos, especialmente privados, para atender de forma competitiva mercados às vezes incipientes”.

O presidente da Febraban deixou claro que esperava mais do arcabouço fiscal, que veio muito concentrado em aumento das receitas e pouco controle do gasto público. Em encontro do Lide na semana passada, em Londres, Isaac disse que “não há política social que traga resultados efetivos se a economia não voltar a crescer”. Ele condicionou o crescimento ao equilíbrio das contas públicas e a uma maior inclusão social.

“Estamos aqui hoje porque sabemos que não há bala de prata.” É preciso diminuir as incertezas, zelar pelas regras do jogo e pela racionalidade econômica.

“A casa não vai cair”, garante Levy, para quem são bem-vindas algumas medidas de aumento das receitas tributárias. Ele defende a taxação de jogos e apostas virtuais, que representa algo como US$ 10 bilhões por ano.

Apesar de ter sido menos do que o mercado esperava, a reação tem disso de cautela: “vamos devagar com o andor que o santo é de barro”, disse uma fonte.

A questão do ajuste tem duas dimensões, É importante ter equilíbrio das contas públicas, mas também interessa ao mercado saber como o governo pretende obter o equilíbrio.

Estudos mostram que o ajuste da despesa é melhor para a economia, na medida em que não a asfixia com uma pesada carga de impostos.

O problema é que o PT considera apenas o primeiro momento, que é o impacto do corte de gastos sobre o nível de atividade. O ponto é que o primeiro impacto é deprimir a atividade, mas em seguida aumenta a confiança e a taxa de juros cai. Nesse novo ambiente os investimentos voltam e se estabelece um crescimento sustentável e de longo prazo, alegam os defensores de um ajuste mais firme.

Para agentes do mercado, o arcabouço tal como anunciado pelo governo “não é uma tragédia, mas também não resolve o dilema fiscal”.

O setor financeiro não tem uma avaliação negativa desse novo arcabouço, o que significa que o jogo está em aberto. É a execução, no dia a dia, que vai atestar o seu grau de eficiência.

Há investidores estrangeiros interessados em aplicar no Brasil. Mas, por enquanto, trata-se de recursos que estão em busca do diferencial de taxas de juros domésticas e externas. Ainda não são recursos para investimentos produtivos. Os investidores estrangeiros em setores produtivos preferem esperar um pouco mais. Provavelmente querem ver a reforma tributária antes de decidirem sobre novos negócios.

Há, no mercado financeiro, quem sonhe com a a possibilidade de o Congresso vir a reformar a proposta de arcabouço do governo, transformando-a em uma espécie de Plano Real das contas públicas. O seja, dar uma solução definitiva para o desequilíbrio fiscal, já que o teto do gasto público foi algo que não deu certo.

 

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