Folha de S. Paulo
Projeções de mercado em geral são otimistas e
estiveram muito erradas em 15 de 22 anos
Os erros
de previsão de crescimento do Brasil foram um assunto do Ano Velho.
Neste 2024, conviria fazer uma rabanada desse pão dormido. A ideia aqui não é
promover um seminário a fim de incrementar a precisão
das estimativas, o que é válido, claro. Mas de refazer a pergunta de 2023:
algo mudou na economia? O tamanho da mudança é relevante? Altera diagnósticos
do que é preciso fazer no país?
Antes de prosseguir, segue um lembrete dos
erros deste século, baseado nas estimativas recolhidas semanalmente pelo Banco
Central, a profecia de "o mercado" —no caso, a previsão feita no
final de um ano para o seguinte, comparada aos dados do PIB "da
época" (sem revisões).
Desde 2000, a média aritmética do crescimento do Brasil foi de mísero 1,84% ao ano (2,3%, depois das revisões); a média do tamanho do erro foi de 1,91 ponto percentual (o valor absoluto de previsões menos o PIB divulgado à época). Enorme. É como tentar passar por uma porta e bater de cara na parede. Mesmo quando se eliminam anos de epidemia (2020-21), a média do crescimento fica em 1,98% ao ano; o erro, em 1,74 ponto.
Os erros não são um conluio da finança e seus
economistas contra governos do PT. O crescimento foi superestimado em todos os
anos de Dilma Rousseff, por exemplo. As previsões são historicamente otimistas.
Se as estimativas do Focus estivessem certas, o Brasil teria crescido 82% desde
2000; cresceu 53% (pelos dados sem revisão, "de época").
Os erros são recorrentes. Nos 22 anos para os
quais há dados de extremos de previsões, o crescimento ficou fora do intervalo
entre mínima e máxima em 15 deles. Isto é, foi maior do que a previsão mais
otimista ou menor do que a mais pessimista.
O crescimento previsto para 2023 foi de 0,8%.
Deve ter sido de 3%. Para 2022, previsão de 0,4%. O PIB cresceu 2,9% (depois
revisado para 3%).
Projeções erradas são da natureza do métier,
não é de hoje nem apenas aqui. Os erros recentes são mais incômodos porque
parece haver um imprevisto desconhecido, talvez alguma força ignorada ou mal
medida.
Ressalva: ainda assim, a
melhora não será grande coisa. Não nos transformamos nem mesmo em uma China de
crescimento agora reduzido a 4,5% ao ano, claro.
"Imprevisto desconhecido"? Sim, há
imprevistos que estão no catálogo sabido de choques e alterações.
Por exemplo, podem sobrevir guerra, epidemia,
secas ou chuvas exorbitantes, uma alta
de preços do petróleo. Governos podem anabolizar brevemente a economia.
Pode haver tumulto político (massa nas ruas, impeachments e afins) ou crises
financeiras no mundo. Dados esses choques, é possível compreender o tamanho do
erro. Em 2023, talvez tenha havido um imprevisto desconhecido.
Parte do povo que faz previsões alega que a
agricultura cresceu muito (mas a grande safra estava prevista e, mesmo assim, o
peso da agropecuária é pequeno para explicar o desvio). Diz que o aumento
do gasto do governo foi grande, mas já sabíamos disso em dezembro de 2022.
Sim, houve progresso extra nas exportações. Houve o trabalho: mais gente
empregada, ganhando mais; desemprego
baixo com inflação caindo. Há uma incógnita aí.
A economia teria se tornado mais produtiva,
com "reformas de mercado" ou, sei lá, por mudanças de organização da
produção pós-pandemia? Há controvérsia e os números disponíveis ainda não
confessam a mudança. Houve alteração de comportamento dos agentes econômicos?
A economia brasileira é volátil, dependente
de preços e consumo de commodities (voláteis), sujeita a muita virada de
política e de política econômica. Os modelos de previsão sempre têm problemas,
que pioram com dados insuficientes e recentes, como é o nosso caso. Haverá
erros a perder de vista. Importante é saber o motivo deles, se por mais não
fosse para nos ajudar a pensar o que é economia brasileira.
A previsão para 2024 é de alta de 1,5% do
PIB, com estimativa máxima de 2,5% e mínima de zero.
Um comentário:
Sei.
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