O Estado de S. Paulo
O tipo de semipresidencialismo praticado no Brasil acirra conflitos e dificulta resultados
Salvo uma nova Constituição e um novo sistema
de governo, o atual semipresidencialismo é um caminho sem volta. Lula comete um
autoengano ao centrar o foco da questão política em indivíduos como o deputado
Arthur Lira, e sair a campo buscando um candidato próprio à sucessão do
presidente da Câmara, que ocorre daqui um ano.
Na prática, esse semipresidencialismo (ainda por cima com dois primeiros-ministros) está produzindo um semigoverno. Qualquer tipo de decisão, não importa a urgência dela, é submetido a um tortuoso processo de negociações que, por exemplo, acabam ignorando o mérito de políticas públicas (é o caso da oneração/desoneração de folhas de pagamento).
De saída já seria difícil um presidente que
representa “a esquerda” lidar com um Legislativo “de centro-direita” (é difícil
enquadrar as correntes políticas brasileiras nos padrões convencionais). Nessa
empreitada, Lula tem empregado as ferramentas que ele conhece e julga ter
utilizado bem uns 20 anos atrás, mas dá sinais de não ter entendido como hoje
não mais funcionam (da perspectiva do Executivo).
Isso ocorre por dois fatores, sendo o
primeiro a inédita acumulação de poderes do Legislativo, processo que se
acelera há dez anos. O segundo é um enorme grau de resistência social à figura
do presidente e a seu partido, outro longo processo que se consolida hoje em
fortes divisões regionais, atravessando classes sociais e até com colorações
religiosas. Fora a calcificação da polarização política, que reflete
antagonismo ideológico poucas vezes registrado na história do País.
Os setores organizados que lutam por seus
interesses específicos acabam dando grande força ao semipresidencialismo. Uma
das demonstrações mais evidentes disso é a atuação das diversas frentes
parlamentares, que hoje ocupam o lugar das antigas bancadas ou blocos
partidários, dos quais se ouve falar cada vez menos.
É difícil imaginar que essa “redistribuição”
de influência política, aumentada pela pulverização das emendas parlamentares,
se altere fundamentalmente com uma nova figura no comando da Câmara ou do
Senado. Sim, ambos têm um grande poder de pautar matérias, mas são obrigados
também a se mover num cenário difuso de lideranças que se articulam em torno de
questões específicas, e não tanto em função da sigla partidária (e seus
caciques).
Tudo isso ocorre quando Lula, segundo interlocutores, dá repetidos sinais de profunda impaciência e irritação com as minúcias de governar – algo que se tornou muito mais complicado. Mas a culpa não é de algum indivíduo.
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