sábado, 2 de março de 2024

Vinicius Torres Freire - Na festa surpresa da economia, país não investiu nada no futuro

Folha de S. Paulo

Investimento produtivo foi dos mais baixos do século e é risco maior para 2024

Já fizemos bastante festinha para o resultado bom e muitíssimo inesperado do crescimento da economia em 2023. Discutimos muito o que se passou no curto prazo (ainda não entendemos direito) e o que pode ser de 2024. Olhando um pouco além da próxima esquina, aparece um aviso de congestionamento econômico: a taxa de investimento caiu no ano passado; é de apenas 16,5% do PIB.

Taxa de investimento: é o quanto da renda (do PIB) de determinado ano foi gasto em aumento da capacidade de produção de bens e serviços. Isto é, em novas casas, em instalações produtivas e outras obras de construção civil, em novas fábricas, em máquinas, equipamentos, "softwares".

Pois bem, repetindo: a taxa de investimento foi de 16,5% do PIB. É a menor do século, fora os anos do final da Grande Recessão e da economia ainda deprimida de 2017-2019.

Sem investimento, é difícil que a economia cresça sem estresse mais adiante, se crescer. Estresse: mais inflação ou também mais déficit externo. Déficit externo: mais comprar do que vender bens e serviços ao exterior. O déficit pode crescer, mas até um limite.

Um país meio pobre como o Brasil precisa crescer rápido pelos motivos óbvios e, agora, ainda mais, para recuperar outra década perdida. O biênio 2022-2023 foi o de melhor crescimento acumulado desde 2011-2012. Ainda assim, tirou apenas uma poeira do prejuízo.

A renda (PIB) per capita de 2023 ainda é menor que a do começo de 2011. Se crescermos 2% neste 2023 e 3% em 2025, passaríamos apenas então do pico da renda per capita, que ocorreu em 2013. Uma dúzia de anos perdidos.

Em 2021, houve um crescimento forte do investimento (12,9%), provavelmente por causa de taxas de juros muito baixas, ajudas do governo e necessidade de remodelar negócios. Em 2022, a alta foi de 1,1%. Em 2023, um fiasco, queda de 3%.

Juros altos e as nossas incertezas sempre renovadas, por um motivo ou outro, como mudança atabalhoada de governo, podem ter colocado empresas na retranca.

Em 2024, as taxas de juros estarão algo menores, de modo mais notável no segundo semestre. Quem sabe o investimento aumente. Se não aumentar, será difícil que o PIB cresça a uma taxa decente também no curto prazo: neste ano de 2024 também.

 

Vai ser difícil que o setor externo (exportações menos importações) dê uma contribuição tão grande ao crescimento de 2024 quanto a de 2023: 2 pontos do crescimento de 2,9% do ano passado vieram do setor externo (o resto do mundo consumiu esse tanto da produção do país, em termos líquidos).

Não deve haver tanta produção agrícola para vender (a safra será menor), os preços caíram; a produção e a exportação de petróleo devem crescer, mas os preços não devem ajudar, embora o valor futuro do barril seja insondável. O Brasil será ainda mais um país petroleiro.

O emprego ainda vai bem, como vimos pelos dados de janeiro. O endividamento de empresas e famílias diminuiu. Dados ainda os juros mais baixos, há sinais de que a propensão a investir pode aumentar. Mas os humores empresariais também são meio insondáveis.

No mais, não haverá um impulso oficial para o PIB tão grande quanto o do aumento do gasto do governo em 2023, em especial o quase 0,7 ponto percentual de aumento de gasto do Bolsa Família.

Não quer dizer que 2024 será ruim, em comparação com o nosso histórico medíocre. É ainda possível que o PIB cresça perto de 2%, provavelmente com mais força no segundo semestre.

Recorde-se que o segundo semestre de 2023 foi de crescimento nenhum, foi de estagnação. Se continuarmos assim, crescimento zero de trimestre sobre trimestre anterior, o PIB de 2024 terá aumentado 0,2%.

Enfim, afora o investimento baixo, sempre é preciso lembrar dos nossos problemas crônicos, de solução incremental, sendo otimista: educação fraca, infraestrutura insuficiente, pouca pesquisa e desenvolvimento de inovação, instabilidade de regras econômicas. Ainda há muito a fazer por aí.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Vixe ou viche!