sábado, 2 de março de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

PIB positivo não deve obscurecer desafios do governo

O Globo

Ano começou com otimismo, mas economia ainda depende do cenário externo e da agenda de reformas

O ano de 2024 começou com excelentes notícias no campo econômico. A inflação cumpriu a meta em 2023 e tem ficado abaixo da expectativa neste ano. O desemprego caiu ao menor nível na última década. A arrecadação do governo bateu recorde e contribuiu para as contas públicas fecharem janeiro com superávit. Até a meta fiscal de déficit zero, antes considerada inviável, entrou no radar dos analistas de mercado (embora dentro da margem de tolerância de meio ponto percentual do PIB). Para completar, o IBGE divulgou ontem o resultado oficial de crescimento da economia no ano passado: 2,9%. Há indiscutivelmente motivos para comemorar, e todas as projeções para este ano têm sido revisadas para melhor.

O clima positivo reflete o trabalho competente do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele conquistou a confiança do mercado financeiro ao encarar com seriedade o desequilíbrio nas contas do Estado brasileiro. Este será o primeiro ano de teste do novo arcabouço fiscal, e Haddad conta com dois fatores favoráveis. O primeiro é a disciplina férrea com que o Banco Central tem conduzido o controle inflacionário, a despeito de todos os ataques que sofreu do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A política monetária propiciou crescimento e queda no desemprego sem trazer risco para a inflação. O segundo é o cenário de desinflação global, com perspectiva de queda de juros nos Estados Unidos. Apesar de tudo isso, é preciso cautela na comemoração.

Um terço do resultado de 2023 se deve ao crescimento de 15,1% da agropecuária, impulsionado pela produção recorde de soja e milho. Embora a previsão para este ano seja positiva, nestes tempos de eventos climáticos extremos não é possível contar com segurança que as condições favoráveis de uma safra se repitam na seguinte. Na esteira da agropecuária, as exportações subiram 9,1%, também ajudadas pela recuperação da economia no exterior. A qualquer turbulência externa, porém, o resultado pode se deteriorar.

O crescimento de 3,1% no consumo das famílias reflete basicamente o controle da inflação, que permitiu à população gastar mais. Essa alta resultou também da expansão na política de transferência de renda, que abandonou o foco nos miseráveis, deteriorando a qualidade do gasto público.

O desafio fiscal persiste, e o governo depende, para dar continuidade à agenda de reformas econômicas, de um Congresso cuja voracidade não dá trégua. A percepção positiva diante do novo arcabouço fiscal e da reforma tributária pode facilmente ser revertida caso essa agenda fique emperrada. Isso traria dificuldades para o financiamento da dívida pública, com pressão sobre a taxa de juros e o crescimento.

Há, por fim, questões que demandam tempo e a consolidação dessa percepção positiva. A principal é a taxa de investimento em produção e infraestrutura. No ano passado, ela ficou em 16,5% do PIB, ante 18,8% em 2022. Há muito o que melhorar. Para qualquer economia obter crescimento sustentado de 5% ao ano, ela precisa investir no mínimo 25% do PIB. Nenhuma decisão voluntariosa de governo conseguirá isso. Os investimentos só voltarão a crescer com a persistência de uma política econômica equilibrada, que torne o país atraente para os empresários. Por tudo isso, não será uma surpresa se, apesar de todo o otimismo, o crescimento neste ano ficar aquém do registrado no ano passado.

STF consagra retrocesso ao definir critério para demissão em estatais

O Globo

Ao criar uma nova figura trabalhista — o “fundamento razoável” —, Corte cria incentivo à judicialização

Ao concluir o julgamento sobre a demissão de empregados concursados de estatais, o Supremo Tribunal Federal (STF) promoveu um recuo na legislação trabalhista. A Corte rejeitou o recurso de funcionários do Banco do Brasil demitidos em 1997 que tentavam ser readmitidos, mas determinou que os empregados concursados de empresa pública, mesmo que estejam subordinados à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) como os trabalhadores na iniciativa privada, só poderão ser demitidos com base em “fundamento razoável” apresentado em “ato formal”.

Na prática, o STF lançou no mercado uma nova figura nas relações trabalhistas, o “concursado de estatal”. E também instituiu um novo tipo de demissão, distinta daquela prevista por justa causa na CLT. O “concursado” é um híbrido. Não é estável como os funcionários públicos, mas não será simples afastá-lo.

O resultado vai contra a tendência de tornar as regras trabalhistas mais flexíveis na contratação e na demissão, dando mais peso ao entendimento entre patrões e empregados, como forma de incentivar a geração de empregos. Um avanço nessa direção foi a reforma trabalhista de 2017, em que acordos entre empregadores e funcionários passaram a valer mais que determinações anacrônicas da CLT, sem prejudicar direitos fundamentais como salário mínimo ou férias. A simplificação reduziu brutalmente o volume de ações trabalhistas, contribuindo para melhorar o ambiente de negócios no Brasil.

O voto vencedor, do presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, foi seguido pelos ministros Edson Fachin, Cristiano Zanin, André Mendonça, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Ficou também decidido que o julgamento tem “repercussão geral”. Todas as instâncias da Justiça precisam seguir agora a tese do “fundamento razoável”, que impõe mais uma obrigação burocrática a engessar as relações trabalhistas. “Não haverá uma demissão não judicializada. Todas serão, alegando desvio de finalidade, mesmo que não haja”, afirmou o relator, ministro Alexandre de Moraes, autor do voto vencido, seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques. Não importa que a decisão do STF só valha para o futuro. Sempre será possível contestar o “fundamento razoável” alegado como motivo para a demissão.

Moraes argumentou, com acerto, que a exigência de concurso em estatais tem o objetivo de garantir o amplo acesso à empresa e evitar favorecimentos. Não tem nenhuma relação com estabilidade no emprego, como acontece na máquina pública. Não se pode, disse ele, “confundir a porta da saída com a porta da entrada”. Estatais que demonstram alguma eficiência usam critérios técnicos na contratação de pessoal. Dificultar demissões, ainda que elas contratem pela CLT, é transpor para as empresas públicas algo da cultura de ineficiência que emperra as repartições públicas. Eis o resultado da decisão do Supremo.

Com queda do juro, PIB pode retomar expansão

Folha de S. Paulo

Economia ficou estagnada na segunda metade de 2023, mas tende a reagir; governo ajudará se reforçar controle dos gastos

Com estabilidade no quarto trimestre, a economia brasileira fechou o ano passado com crescimento de 2,9%, um resultado próximo das projeções mais recentes —e bem superior às iniciais.

A perspectiva para este 2024 é moderadamente positiva, com aceleração esperada nos próximos meses conforme avancem os cortes dos juros do Banco Central, mas há desafios pela frente.

Houve avanço de 1,28% na indústria, concentrado no setor extrativo e na construção civil, ambos com alta superior a 4% no trimestre. Em 2023, os dois setores subiram 8,7% e 6,5%, respectivamente, um bom desempenho.

Em contrapartida, a indústria de transformação teve queda de 0,2% no trimestre e de 1,3% no ano, num quadro de prostração que já vem de muitos anos e não será revertido no curto prazo. A conclusão da reforma dos impostos sobre bens e serviços é a ferramenta mais poderosa para restaurar a competitividade do setor no futuro próximo.

Os serviços continuaram em evolução paulatina, de 0,3% no último trimestre e 4,3% no ano. Aqui a ampliação da renda, em parte impulsionada pelos programas sociais, foi um esteio importante.

A agricultura, por fim, caiu 5,3% entre outubro e dezembro, mas teve expansão forte em 2023, de 15,1%, com o grande aumento da safra.

Na perspectiva da demanda, o sinal positivo foi o crescimento trimestral de 0,9% do investimento, o primeiro após três quedas sucessivas. Dado o incremento da construção, intui-se que aportes nesse setor e na infraestrutura foram determinantes, com o alto número de projetos em andamento.

Depois de muito tempo em expansão, houve pequena piora do consumo das famílias —que parece pontual, no entanto.

Tudo considerado, a expectativa da mediana dos analistas pesquisados pelo Banco Central de uma alta do Produto Interno Bruto de 1,75% neste ano é realista. Nela está embutida previsão de que a economia, estagnada na segunda metade de 2023, passará por recuperação ao longo deste 2024.

O menor crescimento projetado ante no ano passado pode não configurar piora, uma vez que boa parte das boas notícias em 2023 veio da agricultura, ao passo que agora se espera um desempenho positivo mais generalizado.

Esse deve ser o curso natural conforme caia a taxa básica de juros, que deve chegar a 9,5% anuais ou menos até meados do ano. Em tese, trata-se de um quadro favorável para consumo e investimentos.

O que o governo pode fazer é não atrapalhar a redução dos juros e, idealmente, viabilizar quedas maiores. O melhor é reforçar a disciplina no Orçamento e conter a escalada da dívida pública.

Obstáculo à lei

Folha de S. Paulo

Pasta da Saúde recua em nota que só dizia o que Código Penal prevê sobre aborto

Bastou um dia para o Ministério da Saúde suspender uma nota técnica, emitida na quarta (28), que afirmava não haver limite temporal para a realização do aborto legal. A informação é correta, mas a histeria bolsonarista na seara dos costumes entrou em ação, e a pasta, infelizmente, cedeu à pressão.

Sabe-se que o tema da interrupção da gravidez no Brasil implica ônus político. Para 32% da população, o aborto não deve ser permitido em nenhuma situação, segundo pesquisa do Datafolha de 2022.

Contudo 39% defendem a legislação atual, que o autoriza em casos de risco para a vida da gestante, de estupro ou de feto anencefálico.

O documento do Ministério da Saúde somente respaldava o que consta na lei e ajudava a derrubar obstáculos à prestação do serviço, que são históricos e foram reforçados na gestão passada.

Em 2022, o governo Jair Bolsonaro (PL) lançou um guia que, entre outros aspectos obscurantistas, minimizava os riscos da gravidez na adolescência e recomendava que o aborto legal não fosse realizado apos a 21ª semana de gestação.

Os números revelam gargalos que dificultam o acesso ao direito.

Toda relação com menor de 14 anos é considerada estupro de vulnerável, mas levantamento da Folha com dados do SUS mostrou que, em 2021, das 1.556 internações relacionadas a abortos na faixa etária entre 10 e 14 anos, apenas 131 (8%) ocorreram por causas autorizadas, como estupro.

Ademais, os 290 estabelecimentos que realizavam aborto legal em 2021 estavam em apenas 3,6% dos municípios, de cordo com estudo da Universidade de Santa Catarina.

A OMS estima que entre 4,7% e 13,2% das mortes de grávidas no mundo sejam provocadas por abortos inseguros. Países de baixa renda concentram 97% dessas práticas —3 de cada 4 interrupções são inseguras na América Latina.

Saúde pública é uma área técnica e, como tal, não pode sofrer influências de ideologia ou religião. O governo precisa se basear em evidências científicas para proteger a vida das mulheres, principalmente as mais pobres, que constituem a maioria das vítimas dos obstáculos impostos ao aborto legal.

Gaza, um abismo moral para Israel

O Estado de S. Paulo

A calamidade no território ilustra a total falta de compromisso do governo de Netanyahu com o alívio do sofrimento dos civis palestinos e a construção de uma paz duradoura e sustentável

O incidente que deixou mais de cem palestinos mortos no norte de Gaza na quinta-feira foi imediatamente tomado de assalto pela guerra de narrativas. Testemunhas alegam que soldados israelenses dispararam contra civis, matando alguns e detonando um estampido sangrento. O Ministério da Saúde controlado pelo Hamas fala em 112 mortos e centenas de feridos. As forças israelenses alegam que o estampido começou inadvertidamente, e só após a multidão ameaçar um posto de checagem, deram tiros de advertência.

Sejam lá quais forem as responsabilidades diretas pelo incidente, Israel é indiretamente responsável. O norte de Gaza foi ocupado há meses. Mesmo que a tragédia não tivesse acontecido, os milhares de palestinos empilhando-se por um punhado de farinha em torno dos caminhões – fornecidos não por Israel ou agentes internacionais, mas por empresários palestinos – são por si sós uma ilustração da anarquia instalada na região.

Sem prejuízo de prováveis crimes de guerra, não se questiona a legitimidade da operação de Israel para neutralizar o

Hamas. Também não se questiona que o Hamas – após drenar os recursos de Gaza para seus propósitos insanos, provocar a guerra e utilizar táticas projetadas para sacrificar o máximo de seus conterrâneos – tem sua parcela de responsabilidade em cada uma das mortes que aconteceram e acontecerão. Ninguém pode ser pró-Palestina sem ser contra o Hamas.

Mas justamente porque Israel é um Estado Democrático de Direito integrado à ordem internacional, e não uma entidade terrorista, totalitária e genocida como o Hamas, sua responsabilidade é de outra ordem.

O que Israel está fazendo para abrigar os civis em campos de refugiados, garantir suprimentos ou reabilitar hospitais destruídos? O que Israel está fazendo para arquitetar um mínimo de ordem e resguardar direitos civis e humanos da população nos territórios ocupados? O que está fazendo para construir uma paz duradoura com seus vizinhos?

O governo de Benjamin Netanyahu nega a possibilidade de um Estado palestino e se recusa a apresentar uma estratégia política – qualquer uma, mesmo de curto prazo. Após quatro meses, Netanyahu se saiu com um documento de uma página com um plano genérico e irresponsável. Ele torna claro que Israel manterá o bloqueio de Gaza e pretende gerir sua vida civil. Mas a anomia do território contradiz essas intenções.

A janela de legitimidade da operação de Israel se fecha rapidamente. Senadores norte-americanos discutem propor uma legislação cortando o fluxo de recursos e armas a menos que ele apresente soluções para a crise humanitária. Os

EUA e os aliados de Israel deveriam impor pressão máxima para uma pausa e, se ela não for possível por causa do Hamas, é preciso ficar clara alguma boa-fé de Israel.

Um modo de prová-la seria cooperar com medidas emergenciais para fornecer suprimentos à população à beira da inanição. O objetivo é maximizar entregas, seja por via aérea, terrestre ou marítima. Isso aliviaria o desespero dos palestinos e dispersaria a entrega, evitando concentrações caóticas.

Um gesto de boa vontade seria encaminhar concertações para uma força de paz sob jurisdição da ONU. Ela ajudaria a separar os civis de Gaza, evitando atritos com as forças israelenses. Nações árabes, especialmente Jordânia e Egito, que têm boas relações com Israel e laços culturais com os palestinos, poderiam compô-la. Além de proteger os comboios de gangues e racionalizar a distribuição, essa concertação poderia ser o germe de uma arquitetura para prevenir o retorno do Hamas e estabelecer uma ordem civil sustentável. Mas, neste momento, o governo de Netanyahu é um entrave a essas e outras soluções. Ele conta com a guerra para se manter no poder.

Uma Palestina permanentemente ocupada destruirá a democracia de Israel. Sem um Estado palestino, os israelenses serão tragados por intermináveis ciclos de violência. Uma Palestina provisoriamente ocupada sem ordem civil deixará os palestinos à mercê de máfias e de terroristas, intensificando a instabilidade. Sem ajuda humanitária, Israel se afastará cada vez mais dos valores judaicos, caminhando a passos firmes para o abismo moral.

Trapalhada na Saúde eleva cobiça do Centrão

O Estado de S. Paulo

Avanço da PEC que amplia imunidade tributária para templos, inclusive com apoio do governo, mostra o crescente poder dos donos de igrejas, que fazem da fé um ativo para barganha política

Com apoio do governo federal, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 5/23, que amplia a imunidade tributária das igrejas, foi aprovada pela comissão especial da Câmara encarregada de analisar a matéria. A PEC 5/23, de autoria do deputado Marcelo Crivella (RepublicanosRJ), sobrinho do notório bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, seguiu para votação no plenário da Casa no dia 28 passado.

Se leram Eclesiastes 5:10, e é muito provável que tenham lido, os líderes da poderosa bancada evangélica na Câmara decerto não se comoveram com aquele versículo da Bíblia, que diz: “Quem ama o dinheiro jamais terá o suficiente. Quem ama as riquezas jamais ficará satisfeito”. Pois é assim, insaciáveis, que parecem se mover os deputados que abusam do mandato ao subverter a representação política em trampolim para o enriquecimento – e pior, por meio da exploração da religiosidade de milhões de brasileiros.

A Constituição já concede imunidade tributária aos templos de qualquer credo no País como forma de garantir aos cidadãos o direito fundamental à liberdade religiosa. Afinal, ninguém pode ser privado de exercer plenamente a sua fé por falta de recursos financeiros para manter de pé os seus locais de culto. Essa isenção tributária do livre exercício da fé é uma coisa. Outra, muito distinta, é o que se pretende com essa imoral, para dizer o mínimo, PEC 5/23.

O relatório do deputado Fernando Máximo (União-RO), ao final aprovado, retirou da PEC 5/23 os partidos políticos e os sindicatos como beneficiários da ampliação da imunidade tributária – o que seria o insulto adicionado à injúria. Manteve, contudo, a vedação da cobrança de impostos sobre “bens ou serviços necessários à formação do patrimônio, à geração de renda e à prestação de serviços” por instituições religiosas de qualquer credo. Como é público, são os representantes das igrejas de fé evangélica os que mais têm se mobilizado pela aprovação da PEC 5/23 no Congresso, a começar por seu autor.

Ora, o que são bens ou serviços essenciais para a missão pastoral de cada igreja? Trata-se de algo tão impreciso que uma avenida será aberta para toda sorte de privilégios, quando não para o enriquecimento de um punhado de vendilhões. Podem significar desde a isenção de impostos para compra de cimento necessário para uma obra numa determinada igreja até a aquisição ou aluguel de automóveis de luxo ou jatinhos para os deslocamentos de pastores. O céu é o limite nesse vale-tudo absolutamente antirrepublicano.

Esse avanço sem sobressaltos da PEC 5/23 também é revelador da absoluta incompreensão do presidente Lula da Silva do que seria uma legítima e esperada aproximação entre o mandatário e o chamado segmento evangélico. Sendo esse segmento cada vez maior e mais articulado politicamente, é claro que a parcela da população que se declara evangélica – cerca de 30% dos brasileiros – deve merecer a atenção do presidente da República, como quaisquer outras. O busílis é que Lula entende que se aproximar dos evangélicos significa sacudir um saco de dinheiro diante dos que se dizem seus líderes. E, em defesa do petista, deve-se dizer que não são poucos os líderes evangélicos que se prestam a essa esperteza. Aproximação republicana seria Lula ouvir e assimilar os legítimos interesses e valores dessa parcela da população, não raro conflitantes com os apoiados pelos ditos progressistas.

É altamente improvável que os 308 votos necessários à aprovação da PEC 5/23 não sejam obtidos no plenário. Em primeiro lugar, porque, historicamente, os líderes da bancada evangélica não costumam ter dificuldade em arregimentar apoios a questões de seu interesse. Em segundo lugar, porque a PEC 5/23 avança no Congresso justamente no momento em que Lula da Silva move mundos e fundos – sobretudo fundos – para se aproximar dos evangélicos. E assim se perpetua esse mutualismo mundano, que só leva em conta os interesses eleitorais do presidente e os interesses financeiros dos que vivem de explorar a fé alheia.

Investimento pífio

O Estado de S. Paulo

Produto Interno Bruto cresce, mas taxa de investimento está muito aquém do necessário para sua sustentação

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmou oficialmente o que já se esperava para o crescimento econômico em 2023. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 2,9%, o que é um bom resultado, mas o investimento (identificado pela rubrica Formação Bruta de Capital Fixo) caiu 3%. Por fim, a taxa de investimento em relação ao PIB ficou ainda pior do que se esperava. O Monitor do PIB, da Fundação Getulio Vargas, havia calculado 18,1%, o que já seria um resultado pífio para o ano. Mas a medição do IBGE revelou uma relação ainda mais fraca, de 16,5%.

Há, de fato, o que ser comemorado no resultado, devido em grande parte, como é notório, a um ano de excelência da agropecuária, que chegou a superar 20% no primeiro trimestre e fechou 2023 com alta recorde de 15,1%. Já a indústria e os serviços, setores de maior peso no PIB, mantêm desempenhos raquíticos. Por isso, não basta comemorar o saldo “maior que o previsto”, como fez o presidente Lula da Silva em rede social. É preciso que a segunda parte de sua declaração, em que prometeu “trabalhar para crescer com qualidade”, seja real.

Por enquanto, não é. Crescer sem uma taxa de investimento qualificada – que, no caso brasileiro, corresponderia a 25% para equilibrar crescimentos anuais de 3% a 4% – é caminhar de lado, sujeito a retrocesso a qualquer sopro de dificuldade. É o que o Brasil tem experimentado sucessivamente com os chamados “voos de galinha”. O País precisa mais do que esses soluços. Precisa avançar de forma constante por, ao menos, duas décadas, para mudar de patamar.

Além do agro, o consumo das famílias também contribuiu de forma significativa para o saldo de 2023, com avanço de 3,1%. Seria uma notícia excelente se a roda da economia estivesse girando basicamente apoiada na engrenagem do rendimento do trabalho e da elevação da produtividade. No entanto, vem acompanhada da elevação expressiva no volume de transferências, como o Bolsa Família.

Obviamente, são programas sociais necessários na perseguição de metas de redução das desigualdades. Mas não podem ser o principal vetor de aumento do consumo, sob pena de levar à inflação. É uma conta simples: uma economia que cresce sem elevar de forma substancial sua produção gera inflação. Não é um crescimento com qualidade.

O início de 2024 já deixa claro que o agronegócio não será o ponto fora da curva que foi em 2023, embora mantenha resultados ainda robustos. Caberá à indústria, base produtiva e principal parâmetro da competitividade do País, e ao setor de serviços, maior empregador e também o maior componente de peso no PIB, a tarefa de buscar a sustentabilidade do crescimento. Levando em conta o resultado de ambos em 2023 (altas de 1,6% e 2,4%, respectivamente), a conclusão é que há muito a ser feito.

Investir é o meio mais eficiente de empurrar a economia – sobretudo em infraestrutura, o que exige participação prioritária do Estado, mas também em competitividade e inovação, para que a indústria saia do marasmo de décadas, e em planejamento e segurança jurídica e fiscal.

Dengue, uma luta de todos

Correio Braziliense

Até agora, em todo o país, foram registrados 1.017.278 casos prováveis de dengue e 214 mortes confirmadas pela doença. Outros 687 óbitos estão sendo investigados. É um cenário muito grave. Esses estados e o DF decretaram "estado de emergência", assim como 154 municípios

Em parceria com estados e municípios, o Ministério da Saúde promove hoje o Dia de Combate à Dengue. São ações de orientação para a população evitar a disseminação da doença, que está fora do controle no Distrito Federal e mais seis estados: Acre, Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio de Janeiro. Até agora, em todo o país, foram registrados 1.017.278 casos prováveis de dengue e 214 mortes confirmadas pela doença. Outros 687 óbitos estão sendo investigados. É um cenário muito grave. Esses estados e o DF decretaram "estado de emergência", assim como 154 municípios.

Ninguém está livre de contrair a doença, a não ser os vacinados. O vigor físico não protege contra a dengue, embora aumente a resistência e favoreça a recuperação. A faixa etária dos 30 aos 39 anos responde pelo maior número de ocorrências de dengue no país, seguida pelo grupo de 40 a 49 anos e de 50 a 59 anos. Dos casos notificados, 55,4% são de mulheres e 44,6% de homens. Enquanto Minas Gerais registra o maior número de casos, com 352.036 notificações, o Distrito Federal tem a maior incidência da doença: 3.612,7 casos por 100 mil habitantes. No momento, em nível nacional, o coeficiente é de 501 casos para cada grupo de 100 mil habitantes.

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, anunciou que o Brasil poderá ter, neste ano, o dobro de casos de dengue registrados em 2023, que chegou a 1.658.816 casos. Em Brasília, segundo o governador Ibaneis Rocha, as redes de saúde da capital, tanto a pública quanto a privada, entraram em colapso no atendimento. Os principais sintomas relacionados à dengue são febre alta de início repentino, dor atrás dos olhos, mal estar, prostração e dores no corpo. O vírus é transmitido ao homem pela picada de fêmeas de Aedes aegypti infectadas.

A dengue não é como uma gripe trivial, mata. É muito grave quando se apresenta na forma hemorrágica. O acompanhamento médico é indispensável, o que exerce forte pressão sobre o Sistema Único de Saúde. Controlada a covid -19 pelas vacinação em massa, passou a ser o principal e mais urgente problema de saúde pública do país. Não há vacinas em quantidade suficiente para todos. Nos países tropicais, as condições ambientais facilitam a proliferação do mosquito transmissor da doença.

O desenvolvimento e a proliferação do Aedes aegypti exigem atenção redobrada das autoridades, porém, não são uma responsabilidade apenas dos governos e seus órgãos de saúde pública. Sem colaboração e mobilização da sociedade é impossível conter a epidemia. Além de eliminar os focos dentro de casa e nos quintais, é preciso verificar se as caixas d'água estão completamente vedadas, porque o mosquito gosta de água limpa. Nosso sistema de distribuição de água por bombeamento é descontínuo e, por isso, exige armazenamento, o que seria desnecessário se o abastecimento fosse por gravidade e contínuo, como acontece na maioria dos países.

Além da mobilização das famílias, as comunidades devem se organizar para cuidar das áreas comuns; de igual maneira, as empresas devem cuidar de suas instalações e arredores, ajudar as comunidades com as quais convivem, porque seus funcionários também são afetados pela pandemia.

Também estamos empenhados no combate à dengue, por meio da realização de eventos e debates, como o seminário Dengue, uma luta de todos, realizado quinta-feira, no auditório de Correio. Além da intensa cobertura da epidemia, publicamos matérias educativas para auxiliar os esforços das autoridades e da sociedade.

 

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