Valor Econômico
Entre as raposas felpudas ainda em atuação na
política nacional, há quem afirme que falta no entorno do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva um mineiro com os predicados de Tancredo Neves para
dialogar com o Congresso. Se lhe cobravam uma postura mais incisiva, Tancredo
devolvia com suavidade: “Não há mineiro que não seja conciliador. Não há
mineiro que seja radical”.
Nos mandatos anteriores, Lula cercou-se deles no palácio: além do vice José Alencar (morto em 2011), teve José Dirceu na Casa Civil, Luiz Dulci, na Secretaria-Geral, Walfrido dos Mares Guia, na articulação política, Ricardo Berzoini, nas pastas do Trabalho e da Previdência.
Na gestão Lula 3, o presidente não tem
mineiros no seu núcleo político mais restrito. Orbitam o gabinete presidencial
quase diariamente: os paulistas Alexandre Padilha (articulação política) e
Fernando Haddad (Fazenda), o baiano Rui Costa, da Casa Civil, o gaúcho Paulo
Pimenta, da Comunicação Social, e o baiano de nascimento, radicado em Sergipe,
Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral. O único mineiro no primeiro escalão é
Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, que se notabilizou por
conquistar a confiança de Lula na velocidade de um raio.
A percepção de alguns decanos da política é
de que o time principal de Lula é eclético, mas desunido. Vestem a mesma
camisa, mas trocam caneladas nos bastidores, de modo que a quantidade de faltas
uns nos outros atravanca a relação com o Congresso. Para um governo que prega
menos ódio e mais amor, falta um conciliador.
Consciente da desarticulação do time, Lula
convocou uma reunião para sexta-feira (19) no Planalto a fim de colocar ordem
na Casa e afinar o diálogo interno. Participaram Padilha, Pimenta, Rui Costa, e
os líderes governistas José Guimarães (Câmara), Jaques Wagner (Senado) e
Randolfe Rodrigues (Congresso).
Nessa segunda-feira (22), o presidente tornou
públicas algumas das recomendações que fez aos auxiliares naquela reunião.
Sobrou até para o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio (Mdic), Geraldo Alckmin, e para o ministro do Desenvolvimento Social,
Wellington Dias: “O Alckmin tem que ser mais ágil, tem que conversar mais. O
Haddad tem que, em vez de ler um livro, perder algumas horas conversando no
senado e na Câmara. O Wellington [Dias], o Rui Costa, passar a maior parte do tempo
conversando com bancada A, bancada B”, exigiu.
Lula levou à luz as cobranças que havia feito
entre quatro paredes porque logo após a reunião daquela sexta-feira, em que fez
um apelo por harmonia e diálogo, surgiram novas fissuras na relação com o
Senado. Circularam vazamentos de que, no encontro, Rui Costa e Guimarães teriam
saído em defesa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e
criticado o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ante a aprovação da
emenda constitucional (PEC) que resgatou os “quinquênios”, com impacto fiscal
de R$ 42 bilhões.
Questionado, Rui Costa negou com veemência o
relato, e Pacheco reagiu em nota, alegando que Padilha e os líderes Wagner e
Randolfe podem avaliar sua postura com o governo. Sem citar Costa ou Guimarães,
emendou: “Com alguns outros, eu mal converso”.
Em verdade, Costa gostaria de não transitar
fora de seu quadrado, seja para não invadir o território de Padilha, seja
porque tem perfil de gestor. Mas a Casa Civil, por definição, é um ministério
político, e cada vez mais ele tem sido cobrado a desempenhar esse papel.
No ano passado, foi convocado por Lula a
estabelecer uma relação com Arthur Lira, que se indispôs com Padilha. Coube ao
líder do União Brasil, Elmar Nascimento, também baiano, aproximar Lira e Costa.
Adversários em 2022, Costa e Elmar trocaram farpas na campanha. Com Lula
vitorioso, Costa vetou Elmar para o ministério. Meses depois, com Elmar de olho
na presidência da Câmara em 2025, ambos estavam conciliados, e fazendo a ponte
entre Lira e o Planalto.
Desfiando elogios a Costa, Elmar disse a
interlocutores que, se falta ao ex-governador da Bahia traquejo político, ele
tem qualidades como pragmatismo e lealdade. Segundo o líder do União, se Costa
tem críticas a alguém, são feitas na presença do interlocutor, e não pelas
costas.
Para uma reunião convocada por Lula para
afinar a articulação política, a nova celeuma com Pacheco foi desnecessária e
atrapalhada. Num cenário em que Lira vai a público chamar Padilha de
“desafeto”, e Pacheco irrita-se com Rui Costa e Guimarães, o presidente
estabeleceu que todos os ministros têm o dever de manter diálogo permanente com
deputados e senadores.
Padilha é o articulador político por
definição e pelo cargo que ocupa, responsável pelo encaminhamento das posições
do governo nas votações, e na interface com os parlamentares sobre emendas e
cargos. Mas a percepção de Lula é de que uma relação sem sobressaltos com o
Legislativo é dever de todos os auxiliares. Para mostrar que jogam juntos, na
noite desta segunda-feira, Rui Costa e Padilha participariam de jantar com os
vice-líderes do governo na Câmara.
Por falar em Minas Gerais, Lula reencontra-se
com Walfrido nesta sexta-feira em Belo Horizonte, na inauguração de uma fábrica
de medicamentos. Lula reconhece o valor dos mineiros. Na campanha em 2022, em
um ato em Juiz de Fora, declarou que eles sempre querem dialogar. “De conversa
em conversa, o mineiro vai ganhando espaço", elogiou.
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