Por Camila Zarur / Valor Econômico
Cientista político acredita que pleito
municipal deste ano servirá para partidos se reorganizarem para disputa
presidencial e parlamentar de 2026
Quem espera que as eleições municipais sejam
uma prévia da disputa presidencial de 2026 poderá se frustrar ao ver que a
polarização entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente
Jair Bolsonaro (PL) não deve se refletir nas urnas deste ano. O pleito de
agora, diz o cientista político Jairo Nicolau, professor e pesquisador da FGV
CPDOC, é um referendo das questões locais, e os dois líderes políticos não
estão sob avaliação.
No entanto, pondera o especialista, a corrida eleitoral deste ano pode deixar antever as eleições parlamentares de daqui a dois anos. O motivo é a reorganização e reestruturação pelas quais os partidos passam na votação municipal, sobretudo pela proximidade que o pleito gera entre o político e a sigla com o eleitor.
“A análise corrente tende a olhar a eleição
municipal como uma prévia da presidencial. E ela não é”, diz Nicolau, em
entrevista ao Valor.
“É uma eleição importante na perspectiva do quadro partidário e da recomposição
das forças”.
Essa característica, contudo, não afugenta a
polarização - ela já está presente e pode, ainda mais, se solidificar conforme
o movimento dos partidos dos dois líderes. Nicolau projeta que tanto PL quanto
PT se sairão como as forças partidárias da eleição, junto com o PSD, que deve
se consolidar como uma sigla de centro-direita, “âncora num sistema
polarizado”.
Os outros partidos podem sair pior ou melhor
de acordo com o desempenho agregado nacional. Mas nessas três forças [PL, PT e
PSD] é que a política nacional vai se organizando em torno”, explica.
Pelo lado bolsonarista, Nicolau descreve o PL
como o “partido de direita mais organizado depois da redemocratização”. “Pelo
menos está se desenhando como tal”, diz.
Desde 2021, quando passou a abrigar Bolsonaro
entre seus quadros, a legenda clássica do Centrão passou a se portar de forma
mais ideológica, mais alinhada aos ideais conservadores e reacionários do
ex-presidente. Isso somado à estruturação do partido, o PL elegeu 99 deputados
em 2022; um feito, na avaliação do especialista, que há muito não ocorria.
Em relação ao partido do atual ocupante do
Palácio do Planalto, Nicolau acredita que o PT continuará como a principal
força da esquerda, ampliando a hegemonia conquistada pela sigla na eleição de
2022 ante o enfraquecimento das demais legendas do mesmo polo que tentavam se
colocar como opção a Lula.
“Em 2022, na Câmara, a esquerda ficou mais ou
menos do mesmo tamanho de quando entrou no pleito. Mas houve um fenômeno
relevante, o enfraquecimento dos partidos rivais ao PT que estavam ali como uma
tentativa de crescer e virar alternativa ao Partido dos Trabalhadores. É o caso
do PSB, que foi mal [na eleição], e o PDT, que vive um processo de declínio”,
diz.
Os demais partidos, como PCdoB e Rede,
acabaram ficando à sombra de Lula e do PT, seja por terem formado federação com
a sigla do presidente, seja por terem seus líderes dentro da base do governo -
como é o caso de Marina Silva, que tentou por anos se firmar como oposição ao
petista, após os dois romperem em 2008, mas hoje é sua ministra do Meio
Ambiente.
Nicolau, porém, pondera que ainda é preciso
ver se a força de Lula vai ser suficiente para recuperar o tamanho que o PT
tinha antes da derrocada que sofreu na operação Lava-Jato. O partido, que já
chegou a terceira sigla com o maior número de prefeitos, teve seu pior
desempenho em eleições municipais em 2020, tendo eleito apenas 183 prefeituras
no país - nenhuma nas capitais.
“O partido estava vivendo um esvaziamento. No
último pleito municipal, ele foi muito mal, mas dois anos depois, na eleição
federal, ele foi bem”, diz o cientista político, que ressalta a capacidade do
partido em formar bancadas:
“Quando conta votos para vereança, que é um
bom preditor do que vai acontecer nas eleições para deputado, o PT vai bem, ele
tem capilaridade e está bem estruturado pelo país. Ninguém duvida que ele
continuará nas eleições de 2026, seja com Lula ou sem Lula, como a maior
bancada de esquerda.”
Sobre o PSD, o pesquisador credita o
crescimento da sigla de Gilberto Kassab ao vácuo deixado por PSDB e MDB: “À
medida que esses partidos saem de cena, deixa-se espaço para um político de
centro-direita, com fortes ambições políticas, que cria organização um pouco
mais eficiente. O PSD cresceu em todas as eleições que disputa, ele elege mais
deputados, mais vereadores, mais prefeitos.”
“Quem está conseguindo se impor como
alternativa [e meio à polarização] é o PSD, por conta das dificuldades de
reconstrução do PSDB e de renovação do MDB.”
A força da sigla também se dá, diz Nicolau, pela gestão de Kassab: “Como o PSD da República de 1946, os estados têm muita autonomia no partido. Ele dá autonomia para as lideranças estaduais operarem. Na eleição presidencial, o partido não fechou questão. O Kassab apoiou o Lula, mas não foi a bancada inteira”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário