Correio Braziliense
É desanimador, e perigoso, assistir ao
festival macabro dessa eleição paulista e saber que qualquer que seja o eleito
vai cair sobre ele a mancha do desatino de que participou
Há quem diga, e são muitos, que eleições em
São Paulo, para qualquer cargo, equivale a uma eleição nacional, uma disputa da
maior importância. A maior e a mais importante cidade do país, e uma entre as
maiores da América do Sul, carece de um quadro melhor qualificado para
comandá-la, administrar seus passos e corrigir seus rumos. O gigantismo de São
Paulo não pode, ou pelos menos não deveria, ser entregue a aventureiros sem
propostas de trabalho, planos que beneficiem a comunidade ou lhes dê o mínimo
de ações que sinalizem providências voltadas para saúde, segurança e melhor
qualidade de vida.
Brasília não tem eleição municipal, o que, diga-se de passagem, é uma pena que assim seja. Não existe na constituição da capital um artigo que permita ao cidadão escolher seu prefeito, aquele que cuida dos interesses e direitos da comunidade. Geraldo Alckmin, hoje vice-presidente da República, em campanha para a Presidência do país em 2018, pregava que o que mais uma cidade precisa é de um prefeito. Aquele que conheça a comunidade, seus problemas, angústias e ideias que podem gerar soluções. Alckmin dizia que um prefeito já deve sair de casa de manhã anotando os problemas que vê pelo caminho que o leva à Prefeitura. Essa visão matinal dos problemas que afetam a cidade ajuda nos despachos burocráticos com assessores. Indica soluções.
Votar é importante, manifestar sua opinião
sobre qualquer coisa faz bem ao ego, é saudável. E com essa sensação de vazio
eleitoral, os moradores da capital do país ficam de olhos e ouvidos atentos,
observando com atenção o dia a dia das eleições municipais Brasil afora. Sem o
compromisso com o voto local, o cidadão e o mundo político do Distrito Federal
sinalizam espanto e decepção com o que acontece nas eleições de outras cidades.
Esse espanto ficou evidenciado na manifestação recente da ministra Cármen Lúcia,
que preside o TSE, revelando sua preocupação e advertência sobre a onda de
ataques pessoais e agressões físicas, onde candidatos e eleitores se atracam,
deixando claro que, para muitos, a democracia e o bom senso ficam em segundo
plano.
O que acontece na disputa pela Prefeitura de
São Paulo resvala na selvageria e um elevado grau de irresponsabilidade de
candidatos que buscam o voto a todo custo. Por ser São Paulo, pela grandeza que
a cidade representa para o resto do país, a mídia nacional cuida, com
profissionalismo e habilidade, de mostrar ao eleitor perfil, comportamento,
projetos e planos que esses candidatos representam. O resultado desse trabalho,
nos últimos dias, tem assustado o cidadão comum e as autoridades que cuidam
dessa pauta. E, infelizmente, os principais concorrentes ao cargo, em muitos
eventos, decepcionam até os mais experientes em campanhas passadas.
Ricardo Nunes, o atual prefeito que chegou ao
cargo sem ter sido indicado pelo povo, parece liderar uma corrida ainda longe
de se definir. Responde a acusações sérias e sem carisma algum que encante o
eleitor que esperava mais. Tem, ao que parece, o apoio do ex-presidente
Bolsonaro, que, para muitos, mais atrapalha do que ajuda. Guilherme Boulos,
apadrinhado de Lula, representa a esquerda e insiste no eterno discurso do tudo
pelo social. Mas, para muitos, tem telhado de vidro, e a antes oratória popular
parece perder a força.
O fator surpresa dessa eleição é o vendedor
de ilusões chamado Pablo Marçal, que mais parece uma mistura de Bolsonaro com
alguma coisa ainda mais ruim. Não cansa de dizer asneira e aposta na
ingenuidade daqueles eleitores que votam por curiosidade, veneram um ridículo
encantador de serpentes. Por fim, para nossa tristeza, a única cabeça jovem e
progressista que ilustra esse cenário, Tábata Amaral se esforça e se empenha
para mostrar que sabe que não tem chance, mas o que mais dói é ter a certeza de
que, pelo rumo das coisas, sabe que vai perder, além da eleição, talvez a
esperança.
Os mais experientes, aqueles calejados e
habituados a conviver com disputas eleitorais em todos os segmentos, até que
entendem, mas reprovam métodos fora de qualquer cartilha democrática. A eleição
municipal é o primeiro passo, a primeira e mais importante sinalização do que
poderá ser a eleição para governadores e Presidência da República.
Toda disputa, eleitoral ou não, exige
empenho, medidas muitas vezes severas e atitudes pouco convencionais entre os
concorrentes. Mas disputa alguma dá ao cidadão o direito e amparo da lei para
ofender, agredir fisicamente ou ainda insinuar calúnias e degradação moral.
Denunciar falcatruas e comprovar as denúncias
faz parte do jogo eleitoral, e tem amparo na Constituição e na lei eleitoral. É
desanimador, e perigoso, assistir ao festival macabro dessa eleição paulista e
saber que qualquer que seja o eleito vai cair sobre ele a mancha do desatino de
que participou, testemunhou ou foi conivente com tudo que a sociedade
consciente reprova e condena.
Em plena modernidade digital, com os avanços
e conscientização da sociedade que busca sempre aprimorar e zelar pelo bem
comum, tais candidatos injetam em todos uma ameaçadora dose de descrença e
desânimo nos próximos passos do mundo político. Pena que seja assim. Muitos
ainda conseguem mudar a embalagem, mas a farinha é a mesma de sempre.
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