terça-feira, 29 de outubro de 2024

MDB, PSD e PL irão governar cidades com receitas de R$ 648 bi - Marta Watanabe

Valor Econômico

Em valores reais, orçamento é mais que o dobro dos R$ 299,7 bilhões que as urnas garantiram para esses partidos há quatro anos

Os resultados das urnas em outubro combinados a vários fatores que elevaram as receitas municipais nos últimos anos vão garantir um orçamento maior em termos reais às legendas vencedoras em comparação ao que foi direcionado a elas nas eleições de 2020. Juntos, os prefeitos pelo MDB, PSD e PL irão administrar cidades com receitas agregadas de R$ 648 bilhões, mais que o dobro dos R$ 299,7 bilhões que as urnas garantiram para esses partidos há quatro anos, em valores reais.

Dentre os três partidos, o PL de Jair Bolsonaro é o que mais terá crescimento na participação relativa no orçamento, o que contribuiu para quase quadruplicar as receitas sob sua gestão. O partido elegeu este ano prefeitos em 516 cidades, 165 a mais que em 2020. Na mesma comparação, o MDB garantiu prefeitos em cidades que aumentam em 85% as receitas sob sua gestão e o PSD, em 94%, sempre em termos reais.

O União Brasil elegeu prefeitos em um agregado de cidades com 10,6% a menos em receitas para administrar em relação há quatro anos, apesar de também ter aumentado o número de prefeitos eleitos. Em 2020, os antigos PSL e DEM - que se reuniram no atual União Brasil - saíram vitoriosos em 560 cidades. Este ano a legenda ficou com 584 prefeitos. Dentre as grandes legendas com perda tanto em número de prefeitos eleitos quanto em receitas destaca-se o PSDB. O número de prefeitos tucanos eleitos caiu de 533 em 2020 para 273 em 2024, o que contribuiu para destinar ao partido um conjunto de municípios com receitas 76,2% menores que as de 2020.

A comparação considera a receita bruta total realizada pelos municípios em 2020 e em 2023, conforme os dados de orçamento fechados enviados à Secretaria do Tesouro Nacional (STN). Os valores foram atualizados pelo IPCA até setembro. Foram considerados dados de 2023 de 5.474 municípios com relatórios disponíveis. A receita total dos municípios somou R$ 1,3 trilhão em 2023, com alta real de 24,2% frente a 2020. Dados também retirados dos relatórios fiscais mostram que os municípios do país mantiveram alta real de parte das receitas em 2024. As receitas correntes no primeiro semestre de um conjunto de 5.077 cidades cresceram 12% reais contra igual período de 2023.

O crescimento do orçamento sob gestão do MDB, PSD e PL reflete o ganho de participação das três legendas em relação ao quinhão conquistado nas urnas em 2020. A fatia do orçamento agregado do MDB cresceu de 13,1% em 2020 para 19,4% este ano enquanto a do PSD foi de 11,4% para 17,9%. O PL saiu de 4,1% para 12,5%. Juntos, os três partidos terão a partir de 2025 praticamente metade - 49,8% - do orçamento municipal agregado do país. O União Brasil terá a quarta maior fatia no próximo mandato, embora a legenda tenha perdido participação na receita agregada, de 13,2% em 2020 para 9,5% pelas urnas de 2024.

A menor participação do União Brasil é em parte explicada pela perda da Prefeitura do Rio de Janeiro. Segundo maior orçamento municipal do país, a capital fluminense tem 3,5% da receita bruta agregada das cidades. Quando foi eleito em 2020, Eduardo Paes candidatou-se pelo antigo DEM, que depois integrou o União Brasil, juntamente com o PSL. Este ano Paes foi reeleito, já em primeiro turno, mas por outra legenda, o PSD.

O PP ficou em 2024 com fatia de orçamento parecida com a do União Brasil, com 9,2% das receitas agregadas do total dos municípios, fatia 1,6 ponto percentual maior que a de 2020. A legenda elegeu 747 prefeitos este ano contra 698 em 2020. O Republicanos veio em sexto no ranking dos partidos com maiores orçamentos, com participação que aumentou de 3,6% em 2020 para 7,3% em 2024. O avanço ajudou o Republicanos a garantir prefeitos em um conjunto de municípios com receita 154% acima da de 2020.

O forte crescimento de receitas municipais no decorrer dos últimos anos também contribuiu para o aumento do valor do orçamento por partidos. Apesar da heterogeneidade entre as cidades, os municípios de forma geral se beneficiaram de arrecadação sobre serviços na retomada pós-pandemia, além de transferências importantes de recursos dos Estados e da União.

Por isso alguns partidos, mesmo com uma fatia menor do orçamento agregado, ainda podem ter algum ganho real no volume de recursos sob sua gestão. É o caso do PSB, cuja participação ficou praticamente estável, com 3,9% em 2020 e 3,8% este ano nas receitas totais dos municípios. Mesmo assim, com as urnas de 2024, a legenda ficou com prefeitos que reúnem orçamento 19,9% maior que o de 2020. O PT, avançou de 2,7% para 4,6% na sua fatia de receitas e ficou com um grupo de prefeituras que têm mais que o dobro - aumento de 111,7% - de orçamento em relação a 2020.

A reeleição na cidade de São Paulo de Ricardo Nunes, que saiu vitorioso na disputa com o candidato Guilherme Boulos (Psol), ajudou no avanço do MDB. A capital paulista tem o maior orçamento entre os municípios brasileiros, com 8,2% da receita bruta agregada. O quinhão da cidade ficou contabilizado para o PSDB em 2020, quando as urnas deram a vitória para o tucano Bruno Covas. Nunes foi eleito como vice-prefeito e assumiu a gestão da cidade após a morte de Covas. Além de Nunes, o MDB também elegeu outros 853 prefeitos neste ano, sendo um total de 51 mandatários a mais que os de 2020. Além de São Paulo, o MDB elegeu prefeitos em outras quatro capitais: Porto Alegre, Belém, Boa Vista e Macapá.

A política municipal não parece refletir a polarização dos extremismos” Paulo Paiva

O avanço do MDB e do PSD parece mostrar uma distribuição partidária dos prefeitos que reproduz a força de partidos considerados “não radicais”, diz Paulo Paiva, professor associado da Fundação Dom Cabral. “A administração municipal não parece refletir a polarização dos extremismos. A política municipal não reproduz, em geral, a política nacional.”

Para Paiva, a eleição em Belo Horizonte é um bom exemplo. As urnas reelegeram no domingo o atual prefeito da capital mineira, Fuad Noman, pelo PSD. No primeiro turno, lembra Paiva, o candidato apoiado por Bolsonaro, Bruno Engler (PL), ficou à frente da disputa, com 34,4% do votos válidos, ganhando nas 18 zonas eleitorais. Noman teve 26,5%. No segundo turno, porém, com discurso mais ameno que o adversário, Noman foi vitorioso com 53,7% dos votos válidos, convertendo votos obtidos por rivais na primeira etapa. Assim como o MDB, o PSD também elegeu prefeitos em cinco capitais. Além de Belo Horizonte e Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis e São Luís terão prefeitos pessedistas a partir de 2025.

No desempenho do MDB, ressalta Paiva, há a influência importante da cidade de São Paulo. Já no caso do PSD, diz, houve influência dos acordos “pelo Brasil todo” costurados por Gilberto Kassab, presidente do partido. “Kassab tem feito um discurso mais moderado e parece ter uma percepção de que eventualmente pode entrar no espaço deixado pelo PSDB.” Em 2024 o PSD de Kassab elegeu 887 prefeitos contra 663 em 2020.

Nas grandes cidades, observa Paiva, a vitória foi concentrada em poucos partidos. MDB, PSD, União Brasil e PL ficarão a partir de 2025 com 68,4% do orçamento dos 103 municípios aptos a terem dois turnos, com mais de 200 mil eleitores. Essa parcela do orçamento dos quatro partidos nesses grandes colégios eleitorais equivale a 27,2% da receita bruta do agregado de todos os municípios brasileiros. O conjunto dos 103 municípios com mais eleitores representa 39,9% do orçamento agregado das cidades do país.

Entre as capitais, PL e União Brasil elegeram este ano quatro prefeitos cada um. PL ficou com Rio Branco, Maceió, Aracaju e Cuiabá. União Brasil garantiu mandatários em Goiânia, Natal, Salvador e Teresina.

Além do avanço do PL entre as capitais e em grandes colégios eleitorais, o partido também ganhou espaço em cidades menores, diz Paiva, sob influência de emendas parlamentares, num movimento que pode ser determinante para a tentativa de reeleição de parte dos deputados federais em 2026.

Gabriel Leal de Barros, ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) e economista-chefe da ARX, lembra que o quadro geral de receitas das prefeituras nos últimos anos foi favorecido por um conjunto de fatores extraordinários que não deve se repetir. Os prefeitos que assumem a partir de 2025, diz ele, devem enfrentar receitas municipais em desaceleração, acompanhando o que se espera para a atividade econômica doméstica. Há também, lembra, algumas incertezas à frente, em razão da implementação do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) estabelecido pela reforma tributária, a partir de 2026. Para ele, os novos prefeitos têm oportunidade de encaminhar agendas importantes que ficaram de lado, como a da reforma administrativa, medida estrutural para redução de despesas.

 

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