Folha de S. Paulo
Rebaixado a ferramenta de contenção de danos,
reforma do IR vem ao mundo num contexto amargo
O pacote de
contenção de gastos do governo tomou um banho de política antes
de ver a luz do dia. A decisão de anunciar em conjunto o ajuste fiscal e o
aumento da isenção do Imposto de
Renda mostrou que Lula não
estava disposto a absorver o desgaste que o plano provocaria em sua base social
sem, ao menos, preparar terreno para tentar amenizar esse impacto antes da
próxima eleição.
O formato do anúncio começou a ser discutido
há duas semanas, numa reunião entre Lula e seu marqueteiro. O presidente
convocou o publicitário Sidônio Palmeira para avaliar os efeitos políticos das
medidas que formariam a espinha dorsal do ajuste fiscal, como a limitação ao
aumento do salário mínimo e o aperto de certos benefícios sociais.
A avaliação de que o plano poderia ter efeitos desastrosos sobre a avaliação do governo fez com que Lula determinasse que o anúncio fosse compensado com a antecipação da reforma do Imposto de Renda. Quando o presidente consultou ministros que integram o núcleo de seu governo, Fernando Haddad foi o único a votar contra a proposta.
O projeto que amplia a faixa de isenção do IR
foi entregue ao presidente pelo ministro da Fazenda há cerca de três meses, com
o nome de Brasil Justo. Haddad queria que ele fosse lançado de forma separada.
Após a ordem de Lula, no entanto, o plano foi incorporado ao ajuste fiscal, e o
pacote recebeu um slogan único: governo eficiente, país justo.
Haddad perdeu em duas pontas. De um lado,
a contenção de
danos acabou ofuscando o plano de contenção de gastos que,
mesmo descontada a má vontade
crônica de investidores, poderia ser vendido como um compromisso
concreto de Lula. O anúncio conjunto torna bem mais custoso o esforço do
ministro para reduzir as muitas incertezas sobre o controle da dívida pública.
Além disso, Haddad foi obrigado a usar como
amortecedor um benefício que deveria servir como trampolim. A isenção do
Imposto de Renda é uma aposta eleitoral de Lula, mas vem ao mundo no contexto
amargo de um aperto de contas e, sem garantia de aprovação até o fim de 2024,
pode levar mais de um ano para chegar ao bolso do brasileiro.
Um comentário:
Eu não queria estar no lugar de Lula e Haddad.
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