O Estado de S. Paulo
Agente ainda não sabe qual será a cara
definitiva desse pacote fiscal. As primeiras avaliações mostraram que tem mais
a ver com uma careta.
Não há analista que não tenha observado que
é, de longe, insuficiente para garantir a sustentabilidade da dívida pública.
Pode, em princípio, ajudar a conter as despesas em 2025 e em 2026, embora não
garanta a meta do arcabouço fiscal. Mas ninguém menos que o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, admitiu que será preciso alguma complementação, ainda
a ser negociada com o presidente Lula.
O que foi apresentado deve cortar despesas entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões em dois anos. Haddad fala em economia de R$ 71 bilhões, mas há muito ceticismo nesses números. Mesmo depois de esmerilhada pelas pressões dos políticos e dos interesses imediatos, a ideia era, pelo menos, criar condições para que as despesas não crescessem mais do que a inflação futura. Mas nem isso ficou claro.
O pacote ainda incluiu um contrabando: a
proposta de isentar de Imposto de Renda os contribuintes cuja renda se limite a
R$ 5 mil mensais. Ou seja, o pacote de corte de gastos cortou receitas. Para
apontar arrecadação nova que compense a perda de alguma coisa a partir de R$ 45
bilhões por ano, pelas avaliações de economistas do mercado, o governo aponta
para um aumento do Imposto de Renda dos mais ricos, que acusem renda de R$ 50
mil por mês, incluídos aí dividendos e resultados de aplicações financeiras.
Se vier a ser aprovada pelo Congresso, essa
compensação não leva em conta o que se viu nos países em que foi tentada a
sobretaxação dos mais ricos: a enorme capacidade dos endinheirados de executar
manobras de administração tributária ou, simplesmente, de transferir patrimônio
financeiro para o exterior – onde se paga menos imposto ou num paraíso fiscal
onde se garante isenção tributária.
Esse contrabando, que nada tem de providência
destinada a conter despesas, foi feito apenas para comemoração da plateia do PT
e daqueles que vinham cobrando mão tributária pesada também "no andar de
cima".
O resultado imediato foi o esticão da cotação
do dólar no câmbio interno, que ultrapassou os R$ 6 por dólar e fechou nesta
quinta-feira nos R$ 5,98.
Haddad revelou ao fim deste processo
problemas em sua coluna vertebral. Há pouco mais de 30 anos, o então ministro
da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, chegou a pedir demissão três vezes,
quando o presidente Itamar Franco insistiu em enxertar no Plano Real mecanismos
de controle de preços. E o ministro ganhou então a parada. Haddad, ao
contrário, não ganhou.
Esse dólar no patamar dos R$ 6 vai fazer a
inflação bombar. O que o presidente Lula ainda não entendeu é que falta de
firmeza na condução da economia, a disparada do dólar, a retração na disposição
do setor privado em investir, inflação, juros em alta, tudo isso junto é uma
mistura envenenada que debilita o interesse do trabalhador e corrói qualquer
política social.
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