Valor Econômico
Especialistas entendem que “juros por
educação” é positivo, mas medida requer mais ação dos governos regionais
A renegociação da dívida dos Estados com a
União, iniciativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, foi aprovada no dia
17 de dezembro pelos senadores. Muitos governos regionais que herdaram ou
cavaram seus buracos fiscais começam a se beneficiar das bondades do programa,
chamado Propag, ao aderirem a ele. O prazo de adesão vai até o fim de 2025. São
cerca de R$ 765 bilhões renegociados por 30 anos com juro de 4% ao ano mais a
variação do IPCA.
Distorcida desde o início, devido ao
tratamento generoso dado ao descaso de muitos governos regionais com suas
contas, a medida pode ser a ferramenta que vai corrigir distorções do gasto
público com educação no país. A lei traz a possibilidade de investimento em
ensino por meio do mecanismo conhecido como “juros por educação”.
Estados e Distrito Federal poderão reverter parte dos juros de suas dívidas com a União em áreas como educação profissional e técnica de nível médio, universidades estaduais, infraestrutura para a universalização do ensino infantil e educação em tempo integral, além de ações voltadas para outras áreas.
O governo regional que investir em projetos
de educação previstos na lei de renegociação reduz o juro em até 2 pontos
percentuais, pagando IPCA + 2%. Ainda pode haver corte adicional de juro se
cumpridos requisitos de investimento em infraestrutura e segurança pública,
além de aportes a um fundo de equalização que favoreça todos os Estados, em
especial aqueles que pagaram suas contas em dia e demonstraram bastante
desconforto, no início das conversas, quando a proposta inicial de renegociação
indicava favorecimento apenas aos Estados com problemas para pagar suas
dívidas.
A menina dos olhos do ministro da Educação,
Camilo Santana, é o ensino técnico profissionalizante, área em que o Brasil
padece com meros 13% do total de matriculados no ensino médio - segundo o
Anuário Brasileiro da Educação Básica 2024 -, pouco mais de um terço da média
de 35% os países da OCDE, espécie de clube de boa governança pública e padrões
econômicos e sociais no qual, pelo menos em tese, o Brasil deseja ingressar.
Não só o ministro vê necessidade de ampliar
as oportunidades de formação técnica qualificada para os estudantes
brasileiros. Estudiosos do tema também insistem nessa tecla, como deixou clara
a série de reportagens que o Valor publicou
sobre o tema no primeiro semestre de 2023.
Para Diogo Jamra, gerente de articulação do
Itaú Educação e Trabalho, a sanção do Propag será fundamental para fortalecer
investimentos em ensino profissionalizante.
A aprovação da proposta, diz, “representa um
momento histórico e essencial para fortalecer a Educação Profissional e
Tecnológica (EPT) no Brasil”. Ele aguarda a sanção da nova lei, que considera
“uma medida valiosa para transformar a vida das juventudes brasileiras, com
direcionamento de bilhões de reais para a expansão com qualidade de formação
profissional digna, resultando em desenvolvimento socioeconômico para todo o
país”.
O impacto positivo na produtividade e no
crescimento da economia brasileira e seu potencial para aumento da renda média
dos novos profissionais é apontado como o principal fator para os defensores do
EPT.
“Investir na EPT é uma importante estratégia
para o crescimento do país”, comenta Jamra. Ele menciona estudo do Itaú
Educação e Trabalho segundo o qual triplicar o número de matriculados no EPT
teria impacto de 2,32% no PIB como efeito do aumento do nível de emprego e da
produtividade.
Além disso, dados mostram que o ensino
profissionalizante não compromete a qualidade do aprendizado. Ao contrário. O
Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2023, divulgado no meio
deste ano, mostra que onde há mais matrículas de ensino médio integradas ao EPT
houve desempenho ligeiramente melhor. O Ceará teve resultado 0,2 ponto
percentual maior no ensino integrado que no ensino médio regular. Na mesma
direção, a diferença foi de 0,1 ponto no Espírito Santo, Pernambuco e São
Paulo. Os quatro Estados lideram o número de matriculados na modalidade.
Aparentemente, há interesse dos próprios
estudantes nesse tipo de ensino. Quando das consultas públicas do MEC sobre a
implementação do novo ensino médio, 80% dos jovens que participaram disseram
ter interesse pelo ensino técnico concomitante ao ensino médio, segundo o
Ministério da Educação.
Quando da aprovação do projeto, Camilo
Santana falou da oportunidade que a medida tem de auxiliar na correção de
alguns desvios dos gastos públicos na educação. O ministro mencionou que o
Brasil investe a média dos países da OCDE no ensino superior, mas apenas um
terço do valor per capita da média da organização na educação básica.
Resta saber qual será o grau de
comprometimento dos governadores com a possibilidade de investir em educação
nos termos da nova lei. Ou se vão preferir manter o atual padrão de
responsabilidade fiscal, cujas consequências são deixar a conta para as próximas
gerações e esperar por uma nova renegociação.
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