quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Dívida dos Estados e correção de distorções na educação - Eduardo Belo

Valor Econômico

Especialistas entendem que “juros por educação” é positivo, mas medida requer mais ação dos governos regionais

A renegociação da dívida dos Estados com a União, iniciativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, foi aprovada no dia 17 de dezembro pelos senadores. Muitos governos regionais que herdaram ou cavaram seus buracos fiscais começam a se beneficiar das bondades do programa, chamado Propag, ao aderirem a ele. O prazo de adesão vai até o fim de 2025. São cerca de R$ 765 bilhões renegociados por 30 anos com juro de 4% ao ano mais a variação do IPCA.

Distorcida desde o início, devido ao tratamento generoso dado ao descaso de muitos governos regionais com suas contas, a medida pode ser a ferramenta que vai corrigir distorções do gasto público com educação no país. A lei traz a possibilidade de investimento em ensino por meio do mecanismo conhecido como “juros por educação”.

Estados e Distrito Federal poderão reverter parte dos juros de suas dívidas com a União em áreas como educação profissional e técnica de nível médio, universidades estaduais, infraestrutura para a universalização do ensino infantil e educação em tempo integral, além de ações voltadas para outras áreas.

O governo regional que investir em projetos de educação previstos na lei de renegociação reduz o juro em até 2 pontos percentuais, pagando IPCA + 2%. Ainda pode haver corte adicional de juro se cumpridos requisitos de investimento em infraestrutura e segurança pública, além de aportes a um fundo de equalização que favoreça todos os Estados, em especial aqueles que pagaram suas contas em dia e demonstraram bastante desconforto, no início das conversas, quando a proposta inicial de renegociação indicava favorecimento apenas aos Estados com problemas para pagar suas dívidas.

A menina dos olhos do ministro da Educação, Camilo Santana, é o ensino técnico profissionalizante, área em que o Brasil padece com meros 13% do total de matriculados no ensino médio - segundo o Anuário Brasileiro da Educação Básica 2024 -, pouco mais de um terço da média de 35% os países da OCDE, espécie de clube de boa governança pública e padrões econômicos e sociais no qual, pelo menos em tese, o Brasil deseja ingressar.

Não só o ministro vê necessidade de ampliar as oportunidades de formação técnica qualificada para os estudantes brasileiros. Estudiosos do tema também insistem nessa tecla, como deixou clara a série de reportagens que o Valor publicou sobre o tema no primeiro semestre de 2023.

Para Diogo Jamra, gerente de articulação do Itaú Educação e Trabalho, a sanção do Propag será fundamental para fortalecer investimentos em ensino profissionalizante.

A aprovação da proposta, diz, “representa um momento histórico e essencial para fortalecer a Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no Brasil”. Ele aguarda a sanção da nova lei, que considera “uma medida valiosa para transformar a vida das juventudes brasileiras, com direcionamento de bilhões de reais para a expansão com qualidade de formação profissional digna, resultando em desenvolvimento socioeconômico para todo o país”.

O impacto positivo na produtividade e no crescimento da economia brasileira e seu potencial para aumento da renda média dos novos profissionais é apontado como o principal fator para os defensores do EPT.

“Investir na EPT é uma importante estratégia para o crescimento do país”, comenta Jamra. Ele menciona estudo do Itaú Educação e Trabalho segundo o qual triplicar o número de matriculados no EPT teria impacto de 2,32% no PIB como efeito do aumento do nível de emprego e da produtividade.

Além disso, dados mostram que o ensino profissionalizante não compromete a qualidade do aprendizado. Ao contrário. O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2023, divulgado no meio deste ano, mostra que onde há mais matrículas de ensino médio integradas ao EPT houve desempenho ligeiramente melhor. O Ceará teve resultado 0,2 ponto percentual maior no ensino integrado que no ensino médio regular. Na mesma direção, a diferença foi de 0,1 ponto no Espírito Santo, Pernambuco e São Paulo. Os quatro Estados lideram o número de matriculados na modalidade.

Aparentemente, há interesse dos próprios estudantes nesse tipo de ensino. Quando das consultas públicas do MEC sobre a implementação do novo ensino médio, 80% dos jovens que participaram disseram ter interesse pelo ensino técnico concomitante ao ensino médio, segundo o Ministério da Educação.

Quando da aprovação do projeto, Camilo Santana falou da oportunidade que a medida tem de auxiliar na correção de alguns desvios dos gastos públicos na educação. O ministro mencionou que o Brasil investe a média dos países da OCDE no ensino superior, mas apenas um terço do valor per capita da média da organização na educação básica.

Resta saber qual será o grau de comprometimento dos governadores com a possibilidade de investir em educação nos termos da nova lei. Ou se vão preferir manter o atual padrão de responsabilidade fiscal, cujas consequências são deixar a conta para as próximas gerações e esperar por uma nova renegociação.

 

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