Folha de S. Paulo
O governo ficou refém do Congresso numa farra
das emendas que não tem hora para acabar
A aprovação do Orçamento
da União é um alívio para a administração pública, uma necessidade
para o Executivo e uma obrigação do Legislativo. Não pode desta vez, no
entanto, se falar em vitória de nenhum dos dois Poderes. Derrota para ambos.
Não entro nas minudências —nada diminutas,
diga-se— do caráter ficcional da peça que prevê superávit e déficit fiscais
baseados em exclusão de gastos e superestimação de receitas.
Fico no contexto. E este, francamente, como se dizia antigamente é de fazer padre corar em procissão. Primeiro, o atraso de três meses. Não é inédito; desde o governo Collor, em todos à exceção do período Michel Temer, houve isso. Em 1994, a aprovação só aconteceu em outubro.
O problema (para dizer de forma amena) aqui
foi a motivação: uma chantagem do Parlamento que bloqueou o principal
instrumento de administração das coisas públicas até a liberação do pagamento
das emendas. Ficaram no patamar escorchante de R$ 50 bilhões e mais uns R$ 10
bilhões em verbas negociadas na última hora pela ministra Gleisi
Hoffmann.
Não bastassem as questões de conteúdo,
tivemos a forma. O relatório foi concluído às três horas da madrugada de
quinta-feira (20), votado na comissão mista às 14h e aprovado no plenário pouco
antes do final da tarde do mesmo dia.
Dizer que foi a toque de caixa não traduz com
precisão a realidade nem dá a dimensão da irresponsabilidade: o Orçamento
passou pelo Congresso sem que os congressistas tivessem sequer lido a peça,
muito menos analisá-la. A maioria votou para cumprir um acordo, sem saber do
que exatamente se tratava.
Isso porque o que interessava mesmo eram as
emendas que lhes garantiria a reeleição na forma de financiamento paralelo de
campanha. O resto era o resto.
Diante de um Orçamento sequestrado pela
ganância do Legislativo, o Executivo quedou-se rendido. Lula engoliu
o discurso indignado de campanha, quando prometia acabar com os abusos, para se
postar como expectador passivo de um festim diabólico que não tem hora para
acabar.
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