Recorde de queimadas demonstra fracasso do
Brasil no combate ao fogo
O Globo
Clima não é único vilão responsável pela área
devastada. Faltou ação do governo quando era mais necessário
Um relatório do MapBiomas traduz em números a
sensação que os brasileiros experimentaram no ano passado, quando cidades
ficaram envoltas em fumaça. Em 2024, as queimadas destruíram 30,8 milhões de
hectares, quase 80% acima de 2023. Foi a maior devastação desde o início da
série histórica, em 2019 — área comparável à Itália. O fogo consumiu mais
floresta que o desmatamento.
Do total queimado, 73% era vegetação nativa, principalmente formações florestais. A Amazônia foi o bioma mais atingido, com 17,9 milhões de hectares perdidos, mais que a área incendiada em todo o país em 2023. No Cerrado, foram destruídos 9,7 milhões de hectares. O Pantanal perdeu 1,9 milhão, e a Mata Atlântica 1 milhão. No rol dos estados mais atingidos, o Pará, futura sede da Conferência do Clima da ONU (COP30), aparece no topo, com 7,3 milhões de hectares, seguido de Mato Grosso (6,8 milhões) e Tocantins (2,7 milhões). Os três estados respondem por 55% da área queimada.
O levantamento afirma que a devastação está
associada à seca e à influência do fenômeno climático El Niño. Sob essas
condições, a vegetação se torna mais suscetível às chamas. Mas o clima não é o
único vilão. “É preciso haver maior controle e transparência dos governos
estaduais e federal sobre o uso das terras e licenciamento para uso do fogo
pela agropecuária”, diz Ane Alencar, diretora de ciência do Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia e coordenadora do MapBiomas Fogo.
O fracasso do país no combate ao fogo fica
evidente nos dados do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), que monitora focos de incêndio por satélite. Em 2024, foram
registrados 278.299 focos, 46,5% mais que em 2023 e o maior número desde 2010.
Os meses mais críticos foram agosto e setembro, que somaram 55% do total. Ainda
que as condições climáticas sejam as principais responsáveis pelo alastramento
das chamas, a profusão de focos demonstra a inércia do governo Luiz Inácio Lula da
Silva diante do fogo.
Quando na oposição, os petistas criticaram
duramente a gestão Jair Bolsonaro pela leniência com as queimadas. Esperava-se
mais de um governo eleito empunhando bandeiras ambientalistas. Na maioria dos
casos o incêndio não é espontâneo, mas provocado. Apesar disso, as ações
costumam ser mais reativas que preventivas. No ano passado, o governo federal
só esboçou reação quando a fumaça encobriu Brasília. Apenas quando a vegetação
já estava queimando se correu para criar forças-tarefas, providenciar equipes de
brigadistas, aeronaves e outros meios de enfrentar as chamas. Os números do
Inpe mostram que os focos se concentraram em dois meses — fato que deveria ter
facilitado o trabalho das autoridades. Não foi o que se viu.
Não se deveria esperar o país ser assolado
pelas chamas e pela fumaça para tomar providências. As chuvas deste verão podem
ter deixado o problema em segundo plano. Mas as mudanças climáticas são
inclementes. Não se pode contar só com a água que cai do céu para enfrentar as
queimadas.
Crise no IBGE torna atual gestão
insustentável
O Globo
Saída de diretores e carta aberta de
funcionários expõem inépcia do presidente Marcio Pochmann
O Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE)
entrou em convulsão na semana passada com o pedido de demissão dos dois
diretores responsáveis pela área de pesquisas, a mais importante, alegando
falta de interlocução com a presidência. O principal motivo que desencadeou a
saída é a tentativa do presidente do IBGE, Marcio Pochmann, de criar uma
fundação de caráter público-privado usando a marca do instituto. A iniciativa
permitiria a produção de estatísticas e conhecimento de acordo com interesses
privados, pondo em xeque a credibilidade histórica do IBGE.
O instituto divulgou comunicado negando crise
e defendendo a criação da fundação. No texto, afirma que pode recorrer à
Justiça contra o que chama de “desinformação e mentira”. Nesta semana, uma
carta aberta assinada por 136 funcionários do IBGE vinculados a três das
maiores diretorias (Pesquisas Econômicas, Geociências e Tecnologia da
Informação), entre eles gerentes, coordenadores e dois ex-diretores, voltou a
criticar a fundação, reclamando que “o clima organizacional está deteriorado, e
as lideranças encontram sérias dificuldades para desempenhar suas funções”. A
carta, inédita na história do instituto, critica em termos duros o viés
“autoritário, político e midiático” atribuído à gestão Pochmann.
Principal fornecedor de estatísticas do país,
o IBGE é indispensável para a execução de quase todas as políticas públicas.
Dependem dele dados demográficos, geográficos e econômicos — do censo realizado
a cada década aos índices mensais de inflação. O risco de manipulação política
de indicadores econômicos — que assombrou o Brasil durante a ditadura militar
e, mais recentemente, a Argentina nos governos do casal Kirchner— foi levantado
assim que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva impôs à ministra do Planejamento, Simone Tebet,
a indicação de Pochmann para o cargo.
O nome de Pochmann, economista da Unicamp e
quadro histórico do PT, está indelevelmente associado à crise durante sua
gestão no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entre 2007 e 2012.
Mesmo durante a ditadura, o Ipea, sob o guarda-chuva do então ministro do
Planejamento, Reis Velloso, desenvolvera pesquisas e estudos independentemente
dos poderosos da ocasião. Com Pochmann, a autonomia histórica foi posta em
xeque. Ele congelou pesquisas fundamentais sobre a Previdência, promoveu
estudos com nítida inclinação ideológica e esvaziou áreas essenciais, levando
ao afastamento de alguns dos principais economistas do país vinculados havia
anos ao Ipea — caso de Régis Bonelli e Fabio Giambiagi.
No IBGE, não há até o momento nenhum sinal de
intervenção de Pochmann no resultado de pesquisas cuja metodologia está
consolidada há décadas. Ele próprio, ao assumir, enfatizou que esse era um
“receio injustificável”. “Aqui tem um rigor enorme. Todos os procedimentos são
identificados. Não existe essa possibilidade”, afirmou. Mas a criação de uma
fundação paralela com o mesmo nome do instituto despertou nos diretores que se
demitiram e nos funcionários que assinaram a carta um receio aparentemente mais
que justificável. Tebet e Lula devem prestar atenção ao que acontece no IBGE
antes que a atmosfera tóxica afete pesquisas essenciais. Não há como deixar de
constatar que a permanência de Pochmann no cargo se torna a cada dia mais
insustentável.
Milei tem vitórias no presente e desafios com o câmbio no futuro
Valor Econômico
Presidente argentino vive agora um dilema, de
olho nas eleições para o Congresso, ciente de que ocasiões anteriores de
supervalorização do peso foram seguidas por depreciações abruptas, fuga de
capitais e turbulências
O choque econômico executado por Javier Milei
em seu primeiro ano como presidente da Argentina está começando a surtir o
efeito desejado. A inflação anual, que fechou 2023 em 211,4%, recuou para
117,8% no ano passado, como resultado do drástico ajuste nas contas públicas
imposto pelo governo, que segue com amplo apoio popular, mesmo com o alto custo
social de suas polêmicas medidas. Apesar do prognóstico animador para um país
marcado por crises sucessivas e planos fracassados, a supervalorização do peso,
combinada com as turbulências externas, impõem desafios aos próximos passos da
estabilização.
Embora a inflação anual ainda permaneça em
três dígitos, único caso entre os países da América Latina em 2024, o Índice de
Preços ao Consumidor (IPC) encerrou dezembro em alta de 2,7%. Trata-se de uma
desaceleração mais do que significativa ante dezembro de 2023, quando o IPC foi
de 25,5% logo após a posse.
O resultado é expressivo, ainda que o país
esteja longe de “pulverizar a inflação”, como celebrou o ministro da Economia,
Luis Caputo, e decorre do programa implementado para domar a rápida escalada
dos preços que colocava o país à beira de uma hiperinflação. A estratégia
escolhida foi combinar um programa de austeridade sem precedentes em tempos de
paz e uma série de medidas para desregular a economia, com um regime pouco
ortodoxo de depreciação gradual do peso (“crawling peg”), implementado após uma
megadesvalorização da moeda.
De um lado, o corte nos gastos federais
permitiu uma consolidação fiscal de quase 5% do Produto Interno Bruto (PIB) e
fortaleceu as contas públicas, que tiveram um superávit primário de 1,8% do
PIB, o primeiro desde 2010. O rígido pacote de austeridade desacelerou a
atividade econômica e causou uma forte recessão, com queda estimada de 2,8%,
segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Milei também implementou uma
política de emissões quase zero de moeda pelo Banco Central para o pagamento
das dívidas, limitando o crescimento da base monetária local e reduzindo uma
grande fonte de pressão inflacionária. Já a depreciação gradual do peso, de 2%
ao mês, foi efetiva em atacar outro grave problema: as múltiplas cotações do
dólar. Com o “crawling peg”, o governo conseguiu reduzir para menos de 20%,
nível historicamente baixo, a diferença entre a cotação oficial do dólar e a do
“dólar blue”, negociado no mercado paralelo e usado como parâmetro no cotidiano
dos argentinos.
As medidas, especialmente o “crawling peg”,
fizeram com que o peso se valorizasse mais do que qualquer outra moeda em
termos reais em 2024. Esta forte apreciação, somada aos controles cambiais
herdados, agora está trazendo problemas à economia e se tornando um motivo de
preocupação para a inflação. As exportações, por exemplo, podem ser
prejudicadas, já que os produtos argentinos se tornam menos competitivos no
mercado, e as importações, por sua vez, ficam mais baratas, com impacto sobre a
conta corrente. Em 2024 a Argentina teve um superávit recorde de US$ 18,9
bilhões. O país ficou muito caro, o que já provocou queda expressiva no fluxo
de turistas, outra fonte importante de entrada de moedas fortes para a
economia.
Milei vive agora um dilema, de olho nas
eleições para o Congresso em outubro deste ano, ciente de que ocasiões
anteriores de supervalorização do peso foram seguidas por depreciações
abruptas, fuga de capitais e turbulências. Para consolidar a queda celebrada do
IPC em 2024 e garantir a manutenção do apoio popular, o governo anunciou a
redução do ritmo de depreciação do peso para 1% ao mês, mas hesita em acabar
com outros controles cambiais por temer uma nova disparada da inflação, como
ocorreu quando o ex-presidente Mauricio Macri iniciou movimento similar,
culminando em um quase default da dívida e no resgate histórico de US$ 57
bilhões por parte do FMI.
Embora haja otimismo sobre as perspectivas de
crescimento do país neste ano, que pode chegar a 5%, e para inflação, que deve
cair para 26%, segundo estimativas privadas, a incerteza sobre as restrições
cambiais afasta investidores estrangeiros, pois a manutenção das regras implica
restrições à eventual saída do capital, e dificulta a reconstrução das frágeis
reservas internacionais do Banco Central, ainda longe do suficiente para
garantir a promessa de Milei de dolarizar a economia. A situação já foi pior, no
entanto. Um programa de incentivo à repatriação de recursos de argentinos no
exterior trouxe US$ 35 bilhões ao país o que, somado ao superávit comercial,
deu mais fôlego aos planos de Milei.
O cenário externo também traz dúvidas. Embora
Donald Trump seja um aliado de Milei e possa ajudá-lo nas renegociações do
acordo com o FMI - que aplaudiu os resultados da economia em 2024 -, suas
promessas de campanha tendem a embaralhar o comércio global e fortalecer o
dólar, o que colocaria mais pressão sobre a estratégia cambial da Casa Rosada.
As medidas também podem acelerar o enfraquecimento do real, o que teria um
impacto direto sobre as receitas de exportação da Argentina, que é importante
parceiro comercial do Brasil e concorrente em diversos setores, como o
agronegócio.
Lula explicita campanha sem gordura para
queimar
Folha de S. Paulo
Planalto mobiliza ministros por 2026, mas
iniciar gestão com alta nos gastos limita Orçamento para surpreender eleitores
Para o bem ou para o mal, políticos governam
mirando as próximas eleições —e beira a ingenuidade imaginar que possa ser
diferente. Nos casos virtuosos, promove-se o interesse público com os meios à
disposição; nos piores, busca-se popularidade imediata com medidas enganosas ou
insustentáveis.
Não se pode acusar Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) de
dissimulação quanto ao tema. Ele já pontificou, anos atrás, que um homem
público faz campanha "da
hora em que acorda à hora em que dorme, 365 dias por ano". Agora,
empossou seu marqueteiro no primeiro escalão do governo e mobilizou
publicamente seus ministros com a declaração de que "2026 já
começou".
Não se sabe ao certo o que resultará desse
alvoroço de meio de mandato, mas os auxiliares do cacique petista já se
empenham em mostrar serviço. Rui Costa,
da Casa
Civil, disse nesta quarta (22) que o governo deve adotar um "conjunto
de intervenções" para baratear os alimentos. Tudo ainda a ser estudado,
porém.
Também se noticiou que Sidônio
Palmeira, o novo titular da pasta da Comunicação, percorrerá os ministérios em
busca de marcas capazes de impulsionar a propaganda oficial.
Fato é que Lula terá dificuldades
consideráveis em surpreender eleitores doravante por não ter seguido a receita
clássica do presidencialismo nacional —arrumar as contas e tomar as
providências impopulares necessárias no início do governo, de modo a contar com
bons resultados e folga orçamentária mais perto da disputa pela sucessão.
Foi o que ele próprio fez, com louvor, em seu
primeiro mandato. No segundo, embora também bem-sucedido, incorreu em
imprudências para eleger Dilma
Rousseff (PT), que arruinou o Orçamento e a economia.
Nesta terceira passagem pelo Planalto, Lula
escolheu começar pelo aumento
amplo e geral dos gastos, o que contribuiu para mais um biênio de
crescimento econômico acima das expectativas. Com isso, porém, não conseguiu
mais que índices modestos de popularidade. Em dezembro, segundo o Datafolha,
era aprovado por 35% dos brasileiros e reprovado por 34%.
Pior, a escalada da dívida pública
impulsionou a alta do dólar e
da inflação —que
não será contida por intervenções mirabolantes aventadas pelo titular da Casa
Civil, mas por juros escorchantes
do Banco
Central que limitarão o avanço do PIB.
O assanhamento eleitoral explicitado em
Brasília faz parecer menos provável um ajuste orçamentário capaz de
restabelecer a credibilidade das contas do governo. De todo modo,
estreitaram-se também as condições para mais medidas eleitoreiras perdulárias,
que nas atuais circunstâncias gerariam impactos imediatos no dólar e na
inflação.
Se o ministro marqueteiro não conseguir
encontrar grandes marcas publicitárias no que foi feito até agora a custos
elevadíssimos, será difícil viabilizar novas.
Ao avançar contra imigrantes, Trump afronta
Constituição
Folha de S. Paulo
Ordem que proíbe nacionalidade automática a
filhos de estrangeiros que entraram ilegalmente nos EUA satisfaz apoiadores
Da enxurrada
de controversas ordens executivas que Donald Trump baixou
em sua volta à Casa Branca, destaca-se o decreto
que restringe a concessão de cidadania aos indivíduos que nasçam no
país.
A medida contraria um dos mitos fundadores
dos EUA, o de nação aberta à imigração e forjada por pessoas que abandonaram
tudo para "fazer a América".
"Dai-me os vossos cansados, os vossos
pobres, as vossas massas encurraladas ansiosas por respirar liberdade",
dizem os versos de Emma Lazarus inscritos ao pé da Estátua da Liberdade, na
ilha Ellis, por onde chegavam os imigrantes europeus.
Na prática, Trump quer que filhos de
imigrantes ilegais nascidos nos EUA deixem de receber automaticamente a
cidadania, mas é improvável que consiga.
O "jus soli", que assegura
nacionalidade com base no local de nascimento e não na ascendência familiar,
está na 14ª emenda à Constituição,
que não pode ser revogada pelo presidente.
Dezenas de estados, cidades e organizações já
entraram com ações judiciais contra a medida. É provável que alguma saia
vitoriosa num tribunal federal. O caso pode chegar à Suprema Corte, que, em
tempos normais, referendaria o veto ao decreto.
Entretanto, como a polarização e o populismo
trumpista desestabilizam instituições, não se deve descartar a possibilidade de
a Suprema Corte —com maioria conservadora (três dos nove ministros foram
indicados pelo republicano)— ver-se tentada a reescrever a Carta.
Trump está menos interessado no resultado do
que no ruído que produz, com o qual mobiliza seus seguidores. Se sua tese for
derrotada, poderá dizer que tentou, mas foi traído por uma elite judicial
corrupta —discurso conspiratório que agrada a seus fiéis.
E quanto ao mito fundador? A resposta tem
algo de paradoxal. Sim, os EUA tornaram-se a nação mais poderosa do mundo com
as levas de imigrantes. Mas isso não apaga o fato de que, ao longo de sua
história, o país fechou as portas à entrada de certos grupos de estrangeiros,
geralmente com base em ideias racistas.
Vítimas célebres incluem chineses,
irlandeses, italianos (e outros europeus do sul), judeus e os chamados
hispânicos.
É interessante notar que, apesar da oposição
à imigração fomentada por Trump e a direita, é graças a ela que os EUA estão
numa situação demográfica e econômica muito mais confortável do que a de outros
países ricos. Se o atual presidente conseguir contê-la, poderá matar a
proverbial galinha dos ovos de ouro.
Governo quer baixar a inflação na marra
O Estado de S. Paulo
Ministro Rui Costa avisa que haverá
‘intervenções’ para baratear os alimentos, confirmando o velho cacoete petista
de acreditar que basta a vontade do Estado para definir preços
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, informou
que o governo fará “um conjunto de intervenções” para baratear os preços dos
alimentos ainda no primeiro bimestre. Ou seja, agora é oficial: o governo
entendeu que a inflação pode custar a reeleição do presidente Lula da Silva. Em
vez de atacar as causas do problema, sobretudo os gastos excessivos do governo,
os petistas preferem, como sempre, concentrar-se nos sintomas, forçando uma
queda artificial dos preços – como se estes fossem resultado da vontade arbitrária
de quem os estabelece, e não expressão das relações básicas de mercado. E a
história mostra que sempre que o governo se julgou capaz de intervir nessas
relações, o resultado foi desastroso: desabastecimento e mais inflação.
Mas os petistas são teimosos. Segundo Costa,
o governo fará reuniões com os ministros da Agricultura, do Desenvolvimento
Agrário e da Fazenda para tratar do assunto. Lula da Silva ainda deve conversar
com os produtores rurais, mas, de acordo com Costa, ele já tem em mãos uma
lista de sugestões elaborada por representantes de supermercados.
Tudo foi dito em uma entrevista ao
programa Bom Dia, Ministro, da própria Secretaria de Comunicação Social da
Presidência da República, ambiente que talvez tenha dado conforto para que
Costa dissesse o que realmente pensa. A declaração não foi tirada de contexto,
o ministro não foi induzido ao erro e não se trata de fake news.
Costa não adiantou quais medidas serão
anunciadas, mas isso pouco importa. O que interessa é a mensagem que o ministro
passou. Ainda há muitos brasileiros com idade suficiente para lembrar como era
o Brasil antes do Plano Real, que pôs fim à espiral inflacionária a partir de
1994. Naquelas décadas, experimentou-se de tudo, de estoques reguladores à
retenção de exportações, passando por congelamento de preços e fiscais
voluntários que davam voz de prisão a gerentes de supermercado. Mas os preços,
indóceis, teimavam em subir.
Só isso deveria bastar para desestimular
iniciativas como a anunciada pelo ministro Costa, mas o governo parece ter se
dado conta de que não tem mais tempo: a eleição, segundo o próprio Lula, está
logo aí, razão pela qual é preciso agir para conter os preços dos alimentos. E
foi o presidente quem disse, durante a primeira reunião do ano com seus
ministros, que a prioridade de seu governo será “comida barata na mesa do
trabalhador”.
O cacoete intervencionista do PT é conhecido.
Não faz nem um ano que o Executivo cogitou adquirir arroz importado para vender
o produto diretamente nos supermercados, a preços tabelados e subsidiados, em
embalagem própria com a logomarca do governo federal. Foi logo após as
enchentes no Rio Grande do Sul, e a iniciativa só foi abandonada por suspeitas
de fraude no leilão.
Também é bom lembrar que os combustíveis
estão defasados em relação aos preços internacionais. A gasolina não sobe desde
julho, e o diesel está com o mesmo preço desde dezembro de 2023. E, apesar da
disparada do dólar, a Petrobras, que tem mantido uma política de preços
“abrasileirados” desde o início do governo Lula, diz que ainda aguarda o
“momento adequado” para fazer eventuais reajustes.
O governo bem sabe que esse tipo de coisa
pega mal. Tanto que, ao longo do dia, a palavra “intervenções”, expressamente
mencionada por Rui Costa no programa, foi retirada do texto divulgado no site
da Casa Civil – como se omitir a palavra resolvesse o problema.
Os próximos passos são previsíveis. O
marqueteiro Sidônio Palmeira entrará em campo para resolver a “confusão” antes
que ela se torne mais uma crise, enquanto, nos bastidores, não faltará quem
diga que qualquer tipo de intervenção está fora de cogitação.
Os alimentos estão caros em razão da
influência de fatores climáticos e da valorização do dólar, mas a demanda
também contribui para manter os preços elevados. E é neste ponto que Rui Costa
expôs o pensamento que guia o governo nessa discussão: a recusa em aceitar a
lei da oferta e da procura e em reconhecer o quanto o Executivo colabora
diretamente para a carestia.
A truculência não escolhe ideologia
O Estado de S. Paulo
Letalidade policial em Estados governados por
diferentes partidos mostra que há muitos ‘Derrites’ no País, fruto de cultura
policial violenta e da convicção de que truculência rende voto
O número de mortes causadas por intervenções
policiais cresceu em pelo menos dez Estados em 2024, na comparação com o ano
anterior, segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública. São
Paulo, marcado pela sucessão de denúncias de abusos da Polícia Militar (PM) e
pela brutalidade como política de segurança que marca a gestão do secretário
Guilherme Derrite, é o Estado que lidera esse indesejável ranking, com aumento
de 48,61% no período. Um índice que pode ser ainda maior porque os dados de dezembro
não foram enviados pela Secretaria da Segurança Pública. Mas a liderança
paulista não é, infelizmente, a única constatação relevante dos números: há uma
inquestionável – e perturbadora – diversidade partidária e ideológica entre os
Estados com mais mortes causadas por policiais.
Minas Gerais, Ceará, Espírito Santo,
Maranhão, Distrito Federal, Pará, Alagoas, Tocantins e Piauí vêm abaixo de São
Paulo no patamar de crescimento em 2024. Há governos liderados pelo Partido
Novo (Romeu Zema), PT (Elmano de Freitas e Rafael Fonteles), PSB (Renato
Casagrande e Carlos Brandão), MDB (Ibaneis Rocha, Helder Barbalho e Paulo
Dantas) e Republicanos (Wanderlei Barbosa). Sem esquecer a Bahia do governador
petista Jerônimo Rodrigues, que, embora tenha reduzido em 8,5% o número de
casos de violência por parte de agentes do Estado, lidera o número absoluto de
ocorrências: foram 1.557 casos em 2024, ante 1.702 no ano anterior. Já não é de
hoje que a polícia da Bahia é das mais violentas do País. Em 2023, uma em cada
quatro mortes causadas pela polícia no Brasil ocorreu no Estado administrado há
20 anos pelo PT. Cinco de cada dez cidades brasileiras com a polícia mais
mortífera são baianas.
O mais grave, contudo, é que o modo como a
violência policial está presente em diferentes governos estaduais demonstra que
parece haver muitos “Derrites” espalhados pelo País na liderança das
Secretarias da Segurança Pública e no comando das corporações. Como se sabe, o
secretário paulista é um ex-PM que se orgulha de ter matado muitos suspeitos e
que considera “vergonhoso” um policial que não tenha pelo menos “três
ocorrências” de suspeitos mortos a tiro no currículo. Mas seu modelo não é o
único problema. Em muitos Estados, há a combinação entre uma cultura policial
que costuma tratar suspeitos como bandidos e como seres sub-humanos que não
merecem nem direitos nem respeito e a convicção de que a violência desenfreada
da PM rende votos e fama. Basta ver, por exemplo, que não só Derrite continua à
frente da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, a despeito da péssima
repercussão causada pelas imagens de truculência policial, como ainda transita
como possível candidato ao governo do Estado ou ao Senado.
Segurança pública costuma estar no topo das
preocupações dos brasileiros. Com o medo e a sensação de insegurança em alta e
políticas com inteligência em baixa, não raro lideranças políticas seguem um
atalho recorrente: operações espetaculosas e uso sem controle da truculência
contra suspeitos como uma forma de tornar visível a reação do Estado ao crime.
Sob essa inspiração o Brasil vem reduzindo modestamente o número de
assassinatos. Em 2024, foram registrados 38.075 homicídios, ante 40.768 do ano
anterior. Com redução leve nos homicídios e estabilidade negativa das mortes
causadas por intervenção policial, o que tem crescido mesmo é o avanço do crime
organizado na estrutura policial – nos transportes, na política e também na
polícia, como recentemente revelou uma investigação da Corregedoria da PM de
São Paulo, que levou à cadeia nada menos do que 15 homens da tropa e expôs a
perigosa infiltração do PCC na corporação.
A história ensina que uma polícia sem
controle é a semente das milícias, e que a violência policial sempre caminha
com a corrupção. É daí que floresce o crime organizado e se agrava a sensação
de insegurança. Afinal, pouca gente se sente segura sem polícia, mas igualmente
ninguém fica protegido diante do guarda da esquina que se considera poderoso o
suficiente para fazer o que lhe convém.
A esperteza que come o dono
O Estado de S. Paulo
Ao tentar driblar o Orçamento, governo deixa
o Auxílio Gás sem dinheiro
Vai faltar dinheiro neste ano para pagar o
Auxílio Gás, como noticiou este jornal. Um dos principais programas sociais do
governo está sendo vítima dos erros que a gestão lulopetista teima em repetir
para tentar mascarar despesas e fazê-las caber no Orçamento. É como diz um
conhecido ditado mineiro: quando a esperteza é muita, vira bicho e come o dono.
Em agosto do ano passado, o governo teve a
ideia de usar a Caixa para custear o Auxílio Gás com dinheiro do pré-sal – tudo
isso, claro, sem passar por qualquer previsão no Orçamento. A manobra seria
subsidiar diretamente revendedores de gás de botijão com recursos do Fundo
Social, formado pelo excedente do pré-sal que cabe à União. Com isso, a dotação
via Orçamento seria de apenas R$ 600 milhões em 2025, o que corresponde a menos
de 18% dos R$ 3,4 bilhões do auxílio no ano passado. Para este ano, a previsão
de custos gira em torno de R$ 3,5 bilhões.
Do subsídio custeado pelo pré-sal, repassado
pela Caixa, viria a maior parte dos recursos, um drible às obrigações fiscais
que, de tão óbvio, não passou despercebido. Foram tantas as críticas – que
comparavam a manobra à contabilidade criativa que contaminou o governo Dilma
Rousseff e lhe custou o segundo mandato – que o projeto foi para a geladeira.
Em seu lugar, o governo anunciou que apresentaria um substitutivo que não só
resolveria a contabilidade do programa, como iria quadruplicar os desembolsos até
o período de eleições presidenciais. A estimativa era passar para R$ 5 bilhões
em 2025 e para R$ 13,6 bilhões em 2026.
Em novembro, quando a equipe econômica
anunciou o malfadado pacote de corte de gastos, divulgou também a decisão de
mudar o projeto, o que até agora não passou de intenção. Para piorar, o
Orçamento de 2025 ainda não foi votado e, por causa da demora, o governo só tem
permissão legal para executar 1/12 do Orçamento apresentado. Não dá para
custear nem o primeiro repasse do programa, em fevereiro.
Não há mágica na concessão de benefícios
sociais. O dinheiro das políticas públicas vem dos tributos que o governo
arrecada e das captações que faz no mercado, com a emissão de títulos para
financiar investimentos. A vertente tributária bateu no limite, e a
desconfiança em relação à política fiscal encarece o custo das captações e
afasta investidores.
A previsão orçamentária não é um capricho.
Submeter programas como o Auxílio Gás ao debate orçamentário significa ter que
defender sua relevância, já que outras despesas disputam o dinheiro público,
que por definição é escasso. É desse debate que o governo pretendia escapar, ou
porque considera o programa tão essencial que dispensa o aval dos
representantes dos eleitores ou porque precisa manter o programa mesmo sem ter
dinheiro para isso.
A mudança tentada pelo governo, com o repasse
direto de subsídios do pré-sal aos revendedores de gás, foi mais uma manobra
para fugir dos limites do arcabouço que o próprio governo instituiu. E depois o
governo vai se queixar que sua falta de credibilidade é resultado de problema
de “comunicação”.
País melhora indicadores de maternidade
Correio Braziliense
O número de mortes de parturientes e de
partos de jovens diminuíram. Alcançar melhores resultados implicará fortes
ajustes na oferta dos serviços públicos de saúde
O número de mortes de parturientes vem
declinando no Brasil desde 2021, quando chegou a 3.024 vítimas principalmente
devido à pandemia de covid-19. Em 2023, 1.292 mulheres não resistiram ao parto,
sendo 734 atendidas na rede pública, 456 na rede privada e 82 em
estabelecimento não informado. As mulheres pretas e pardas foram as que mais
foram a óbito (847) em 2023; as brancas somaram 389; e as indígenas, 42.
Entre as asiáticas, houve uma morte.
Em 2022, a cada 100 mil nascidos vivos, 57,7
parturientes morriam. O número de óbitos entre mulheres negras chegava a 110,6,
quase duas vezes mais do que o total geral de vítimas brancas. Diante da
flagrante desproporção, o governo brasileiro estabeleceu como meta reduzir em
50% a mortalidade de mulheres negras até 2027. Entre os fatores que prejudicam
essas gestantes, estão o acesso limitado a cuidados médicos de qualidade, falha
no pré-natal, complicações na hora do parto e falta de atendimento humanizado.
A ideia é se antecipar a um dos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas
(ONU), com, inclusive, melhor desempenho. A meta estabelecida com a agência
internacional é de, até 2030, ter no máximo 30 mortes a cada 100 mil nascidos
vivos.
Alcançar esse resultado e outros em favor da
saúde das mulheres implicará fortes ajustes na oferta dos serviços públicos de
saúde. Entre eles, o pré-natal, a atenção às doenças que comprometem o parto,
como a hipertensão nas mulheres negras, e o atendimento humanizado
independentemente do fator étnico-racial. É essencial ainda melhorar a rede
pública em todos os municípios para que o Sistema Único de Saúde (SUS) seja
efetivamente universal, como propuseram seus criadores.
Em queda também estão os partos de
adolescentes. No primeiro semestre de 2024, em todo o país, 141 mil jovens
entre 10 e 19 anos deram à luz. Uma redução relevante se comparada a igual
período de 2023, quando nasceram 286 mil bebês de mães nessa faixa etária,
segundo os dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc), do
Ministério da Saúde.
Desde de 2015, vem ocorrendo um decréscimo no
parto entre adolescentes. Para os especialistas, isso tem ocorrido porque
jovens com mais acesso aos serviços de saúde e maior escolaridade têm percebido
que é essencial adiar a maternidade, a fim de avançar profissionalmente, entre
outros objetivos. As mães, principalmente as que são "solo",
também têm orientado suas filhas para que não repitam a condição de
vulnerabilidade.
Mas não foram só as mães que mudaram. As
escolas também têm sido um espaço para dialogar com jovens sobre as
inconveniências de uma gestação precoce. Ainda que na sociedade haja uma camada
retrógrada que condena a educação sexual dos jovens, falar sobre o tema com os
adolescentes tem feito a diferença.
Esclarecimento não pode ser confundido com
apologia do sexo. Assim como é descabido diferenciar o atendimento às
parturientes a partir da cor da pele e condição socioeconômica. Salvar vidas é
o maior objetivo dos que se propõem a ser um profissional da saúde.
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