O senhor então discorda do que disse o ex-presidente Lula, que a opinião pública morreu?
FH: Eu discordo. Se tivesse morrido, não teria acontecido tudo o que acontece, inclusive agora.
E como o senhor vê o papel da opinião pública?
FH: O que é a opinião pública aqui? Antigamente era quem lia a imprensa. Basicamente era isso. Agora é quem vê a televisão e a internet. E isso faz pressão. Não morreu, não, é o contrário.
O senhor identifica um novo momento na sociedade, nesse aspecto?
FH: Ah, não tenho dúvida. E crescentemente vai ser assim, você vai ter uma influência cada vez maior da sociedade conectada, que se manifesta cada vez mais. É curioso porque essa conexão pode produzir "derrubamentos", derruba alguém, mas não constrói, porque não tem como fazer a coisa funcionar. É para rupturas. Veja o que aconteceu agora no mundo árabe. Dá o contágio, pega, e se movimenta. Agora, isso não dispensa a ação institucional. O problema hoje é que você tem uma sociedade que está se conectando crescentemente, e o lado institucional não sabe se relacionar com isso. Dá a impressão de que algumas instituições envelheceram, não percebem que têm que mudar e não sabem para que lado vão.
Por exemplo?
FH: Qualquer pesquisa de opinião põe o Congresso em último lugar. É sintoma de que a instituição não está sendo aceita pela sociedade tal como é. E a sociedade não toma conhecimento do Congresso. Sofre as consequências de algumas decisões, mas não se preocupa; no dia a dia, se preocupa com outras coisas. Pode ver: quais são os temas debatidos na internet e quais os debatidos no Congresso? São dois mundos. Acho que esse é o sintoma de um problema grave na sociedade atual. Como o Congresso é indispensável e os partidos também, é um problema. Porque não vai ter jeito sem partido e sem Congresso.
Não se pode dizer que é porque o Congresso brasileiro é muito ruim?
FH: Não, porque é um fenômeno que acontece no mundo inteiro.
Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente. Entrevista Especial. O Globo, 18/6/2011
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