Já em andamento, o congresso do PPS começa em uma hora em que parece consenso quase completo dizer-se que os partidos carecem ou já perderam suas identidades. Proveniente do campo pecebista, o PPS já teria esta questão da identidade resolvida há muito tempo, se entendermos que sua identidade, conhecida pela opinião publica, é justamente a sua vocação a ver as coisas pelo ângulo da política, lugar onde, como seu antecessor, ele também é livre para agir construtivamente, tornar-se capaz de reunir energias e mudar (tentar) mudar a situação.
Como tradição, esse olhar da política, herdado do Partidão, pode ser observado exemplarmente na trajetória de Armênio Guedes, o quadro que mais influenciou o PCB, como disse não faz muito Marco Antonio Coelho. De alguns anos para cá, Armênio Guedes vem sendo posto em evidência não apenas por ser um veterano pecebista, passados os seus 90 anos, mas pelas idéias que defendeu no seu tempo e até os primeiros anos 1980, sobremaneira por ter vivido como um trabalhador em defesa dessa crença na identidade política do PCB, em momentos complicados e difíceis.
Espera-se do congresso do PPS deste outro tempo, bem distante e diferente daquela época, que os ex-pecebistas e seus aliados que formam o PPS se debrucem sobre a circunstância – o período já não tão curto da Era Lula – buscando, desde o ponto de vista da política, interpretá-la para fins formulativos, pois não há outro caminho para vencer os dois perigos maiores deste momento: a adesão ao governo e o oposicionismo sem rumo. A esquerda histórica constituiu um modo de procurar ver na circunstância que vivia expressões, processos, tendências e cenários possíveis, visando um agir na conjuntura e no futuro próximo com metas avaliáveis segundo propósitos teoricamente referidos.
O que está acontecendo agora no país é certamente o que vai ocupar a atenção do congresso do PPS. Esta questão vem sendo posta ao congresso diariamente, pelo que se lê nos analistas da imprensa: quando eles dizem que todos os partidos estão sem identidade e sem rumo estão dizendo que eles não conseguem interpretar o novo de hoje no mundo e no país e a conquista inesperada do governo pelo PT e Lula.
Um parêntese. Em relação ao novo no mundo, chama a atenção – desde a campanha eleitoral de Obama -- uma espécie de fascínio pela novidade midiática sem associação com o conhecimento da circunstância nacional, nestas condições, esse fascínio vindo a esvaziar ainda mais a ideia do campo da política. Nesse tipo de compulsão há ainda a possibilidade de o protagonista subsumir-se ao novo, o que lhe tira iniciativa e reduz seu esforço para obter domínio sobre as coisas (sua compreensão); no limite, aparece a tendência de a política tornar-se a própria versão da novidade. É o caso das mídias que ganham eleições quando usadas em grande escala e com conteúdos variáveis dissociados de programas. Já ouvi de um analista autorizado dizer que as eleições doravante terão a forma que se conheceu na campanha de Dilma e Lula. Que é assim mesmo.
Que o novo governa o mundo e o país e que vivemos na Era Lula estamos diante de fatos. O desafio está em olhar para as novidades por um prisma que não leve a elas se subordinar. O PPS tem, justamente, o olhar pela política e dispõe de todo um campo intelectual que tem sua referência maior na interpretação de Brasil de Luiz Werneck Vianna, mais precisamente, nas suas reflexões sobre o período mais contemporâneo pós-Constituição de 1988. Por sinal, suas análises de conjuntura foram recentemente reunidas no livro A modernização sem o moderno, lançado por ocasião da homenagem que lhe prestou a Sociedade Brasileira de Sociologia dias atrás. O livro que está a merecer lançamento aqui no Rio de Janeiro em evento liderado pelo campo que vai da “matriz da revolução passiva” às áreas influenciadas pelo PPS.
O tema da compreensão da circunstância será o ponto mais esperado do congresso. A lembrar o sentido das discussões com que se chegou à Declaração de Março de 1958, homóloga à leitura daquela circunstância nova dinâmica e democratizante que vinha se afirmando desde 24 de agosto de 1954.
Raimundo Santos é professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Especial para o Portal do PPS e o Blog Democracia Política e novo Reformismo
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