Há uma clara falta de sintonia entre os desafios da nossa realidade e a lógica do projeto de poder em curso no país.
Confunde-se crescimento com desenvolvimento e difunde-se a falsa percepção de que tudo está sendo feito para garantir ao povo brasileiro um novo horizonte.
Ideias como a do trem-bala deslocam-se para o centro das atenções, enquanto permanecem paralisadas as obras dos metrôs das capitais e as estradas federais caem, literalmente, aos pedaços.
O atraso das obras da Copa exigirá forte injeção de recursos públicos, que não existem sequer para programas que, apesar de terem um desempenho aquém do esperado, são lançados e relançados com pompa e circunstância, como o Minha Casa, Minha Vida.
Prevalece o periférico -e os interesses que se organizam em torno dele- e não o principal. O exemplo mais dramático é o do saneamento básico.
Metade da população do país não tem acesso a este serviço, e retrocedem os dados da última década: o número de residências sem água subiu de 8,9 milhões para 9,1 milhões, enquanto os domicílios sem rede de esgoto passaram de 25,6 milhões para 27,8 milhões.
A pirotecnia política em torno do PAC não altera a realidade do balanço do Instituto Trata Brasil -até o final de 2010, só 4% das principais obras de saneamento previstas estavam concluídas, e 60% continuavam paralisadas, atrasadas ou nem sequer iniciadas.
Para viabilizar investimentos da ordem de R$ 11 bilhões anuais, necessários para alcançar a universalização dos serviços na área de saneamento até 2024, conforme preconiza o próprio PAC, já não bastam as fórmulas conhecidas.
É preciso ter alternativas como a redução a zero das alíquotas de PIS/Pasep e Cofins cobradas das empresas de saneamento, já apresentada no Congresso pelo senador Francisco Dornelles. Tese, aliás, defendida na eleição de 2010 pelo nosso candidato, José Serra, e depois assumida publicamente pela então candidata Dilma Rousseff.
Esta seria uma forma de capitalizar as empresas e fomentar novos investimentos. De acordo com os dados do SNIS, gerenciado pelo Ministério das Cidades, essas empresas pagaram R$ 12,8 bilhões em PIS/Pasep e Cofins no período entre 2003 e 2008, valor superior aos R$ 12,2 bilhões investidos com recursos próprios.
Fazer o que precisa ser feito, neste caso, vai muito além dos princípios de boa governança.
É bastante conhecido o impacto altamente positivo do saneamento no combate a doenças e na melhoria das condições de vida da população.
Além disso, os recursos aplicados no setor representam economia muito significativa no sistema público de saúde. E o fundamental é que estaríamos cuidando do Brasil real. Isso é desenvolvimento.
Aécio Neves, senador (PSDB-MG)
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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